Negritudes discute a diversidade negra na publicidade brasileira
Festival realizado pela Globo em São Paulo destacou narrativas negras do audiovisual com protagonismos de referências na mídia
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Rafaela de Oliveira
6 de setembro de 2024 - 16h13
A Globo realizou nesta última quinta-feira, 5, no Sesc Pompeia, em São Paulo, a terceira edição do Festival Negritudes. Gratuito, o evento, liderado por Ronald Pessanha, teve a direção de Clayton Nascimento, roteiro idealizado por Dimas Novais e patrocínio de Nívea.
Neste ano, o Festival já havia passado pelo Rio de Janeiro e Salvador, reunindo mais de 3 mil pessoas para debater e destacar a presença negra no audiovisual.
“Estamos muito felizes em encerrar essa programação de 2024 na cidade de São Paulo atraindo marcas, agências, profissionais do cinema, produtores independentes e a sociedade para pensarmos em como ter mais pessoas negras na frente e por trás das câmeras”, afirmou Ronald Pessanha, especialista em marca e valor social da Globo e líder do Negritudes.
“É lindo ver como os ingressos disponibilizados pela inscrição acabam em poucos dias, pois mostra como essa demanda é reprimida e como as pessoas querem saber mais sobre esse tema, ter mais representatividade e se verem mais nas telas”, acrescentou.
O evento foi estruturado em três diferentes palcos, oferecendo, 12 painéis de debates, performances teatrais, pocket shows, desfile de moda e batalhas de rimas e de Ballroom, exposição de arte, espaço infantil, Feira Preta e ativações de marcas.
O palco Negritudes foi comandado pelos jornalistas Thiago Oliveira e Karine Alves, trazendo discussões sobre as narrativas negras no audiovisual, com participação de personalidades potentes, como a escritora Conceição Evaristo, Liniker, Leci Brandão, Péricles, Karol Conká, os jornalistas Márcio Bonfim, Maju Coutinho, Dulcinéia Novaes, os apresentadores Rene Silva, Igão, Thelma Assis, as medalhistas olímpicas, Bia Souza e Lorrane Oliveira, entre outros nomes.
“Vemos uma mudança na Globo em relação à cor dos apresentadores, repórteres e direção, o que é extremamente importante pela necessidade de ter o nosso olhar e nossa diversidade em todos os ambientes, inclusive na publicidade”, comentou Thiago Oliveira.
O apresentador ressaltou, ainda, discussões a respeito da existência sobre a pouca representatividade em algumas novelas, mas principalmente na publicidade. “Somos a base do Brasil e os responsáveis pela maior parte do consumo, então precisamos ter alguém nos representando desde o processo de criação.”
No palco Ubuntu, as conversas com especialistas se basearam em questões de processo criativo no audiovisual e aumento de engajamento nas redes sociais, além de prêmios em festivais, pesquisa sobre o consumo da população negra, moda e estética.
Promovido pelo PPA, prêmio da Globo que celebra o talento do profissional brasileiro de publicidade, o debate propós uma discussão a respeito de diversidades negras na publicidade brasileira, abordando como as empresas, de todo o mundo, vem desacelerando os investimentos em pautas ligadas aos direitos humanos.
“Tem uma cilada grande quando trazemos à frente do business a sigla ESG, porque aglutinamos todos os números do ambiental, social e governança, sendo muito fácil esquecer a pauta racial, que não podemos esconder atrás de um termo bonito”, destacou Felipe Silva, cofundador da Gana.
“Comunicação com foco social não é uma comunicação de oportunidade”, mencionou Gabriela Rodrigues, head of culture & impact da Soko, sobre a agenda das marcas se tornarem representativas apenas meses como julho e novembro.
Raphaela Martins, program manager da Meta, trouxe a reflexão sobre o papel de profissionais não negros que se declaram aliados da luta antirracista. “Dentro do mercado corporativo tem um lugar cômodo de se colocar no papel de aliado, mas não necessariamente com a devida responsabilidade nesse processo de transformação”, comenta.
Já sobre os bastidores das agências publicitárias, Ricardo Silvestre, CEO e fundador da Black Influence, destaca como o ambiente pode ser adoecedor para pessoas negras. “Temos números que comprovam o aumento numérico de mais profissionais negros em agência, mas quanto isso tem sido saudável?”, questionou.
Por fim, o palco Afrofuturo foi dedicado às expressões artísticas, com o show Salgadinho Convida Péricles e Marvvila, um pocket show de Trasha&Tracie e a performance teatral da atriz Ana Flávia Cavalcanti com a peça Conforto.
No espaço Deck, a programação também teve batalha de rimas, a peça de teatro Ninguém me ensinou a morrer, apresentação de Ballroom e uma versão pocket da Feira Preta.
Além disso, o Festival organizou atividades para o público infantil no espaço Baobá, liderado pela organização Piraporiando, e uma oficina para 30 estudantes universitários selecionados da Educafro, realizada pela Academia de Jornalismo da Globo – projeto interno de capacitação e treinamento. Os alunos participaram de sessões de mentoria com Maju Coutinho, Flavia Oliveira, Mariana Aldano e Marcio Bonfim.
Com parceria desde a primeira edição, o Negritudes 2024 teve transmissão ao vivo pelo Canal Futura no Globoplay, aberta inclusive para não assinantes, além de um quadro especial no Fantástico que recebeu, ao longo das últimas semanas, nomes como Tony Tornado, Antonio Pitanga, Zezé Motta, Daiane dos Santos, Paulo Vieira e Magic Johnson.
Ainda durante o evento, houve o lançamento da campanha anual de Excelência Preta do canal Telecine, com o tema “Pretagonismo”. A expressão é resultado de um neologismo usado pelos escritores Rodrigo França e Jonathan Raymundo, que convidam o público para uma reflexão sobre séculos de negação do protagonismo das pessoas negras em suas próprias histórias e por trás das câmeras.
Narrado por França, o filme introduz os conceitos de protagonismo e pretagonismo e segue com recortes de cenas de filmes estrelados por pessoas negras que estão disponíveis no catálogo do Telecine. A peça institucional encerra com o conceito da campanha: “O cinema negro é mais do que se vê”.
“É um projeto que exemplifica para muitos que não tem ideia da existência de visagismo, de diretores negros de arte e de cena dentro dessa estrutura imensa”, aponta Rodrigo França. “E para servir também de inspiração, mostrando que não é fácil, mas é necessário termos os nossos no audiovisual que é tão embranquecido no Brasil.”
Também houve o lançamento da campanha institucional da Globo, relacionada ao tema de Negritudes, com o conceito “Nossa alegria é o futuro, e o futuro já está acontecendo”.
“O propósito da ação é mostrar como a alegria negra é ancestral, sendo a pauta do futuro no audiovisual e na nossa sociedade”, diz Ronald Pessanha. “Trazemos a campanha fora do mês de novembro para mostrar ao mercado que esse tema precisa ser abordado durante o ano todo.”
O Negritudes foi idealizado em 2018, com a união das áreas de valor social e de pesquisa da Globo, que formaram grupos de debates com funcionários negros da emissora envolvidos diretamente na produção de conteúdo. O intuito foi entender a possibilidade de trazer mais representatividade para as telas e as histórias, reforçando a conexão com o público brasileiro.
Com o crescimento orgânico desses grupos, em 2022 aconteceu a primeira edição do Negritudes para 280 convidados no gexperience, em São Paulo. A partir da compreensão da potência que o projeto tinha, se tornou multiplataforma e com um calendário para debater o tema.
A primeira edição aberta ao público foi em 2023, na Cinemateca, com ações online e imersões. “Com o sucesso de 2023, vimos a possibilidade de estender o festival para três cidades neste ano, no Rio de Janeiro, São Paulo e Salvador”, destaca Ronald Pessanha, líder do Negritudes. “São Paulo é a maior edição de todas, onde tem mais expectativa de público e de espaços para debates, ativações e manifestações culturais.”
O profissional conta da expectativa da emissora em expandir o evento nos próximos anos, marcando presença nas cidades onde já foram realizadas as edições e trazer novidades para o público.
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