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Opinião

A difícil arte de trabalhar com a ideia de outra pessoa

E por que nós somos os responsáveis por tantas marcas que não resistem ao tempo


6 de junho de 2022 - 15h00

Outro dia estava em uma conversa profunda sobre porque existem tantas marcas que perdem valor ao longo do caminho. Muito mais do que as que se tornam resistentes a tempestades que, quando ocorrem, as tornam mais fortes. O papo passou por relevância, posicionamento e afins, até chegar no que acredito ser um dos pontos centrais: nós, os profissionais por trás das marcas.

É natural no nosso processo de desenvolvimento, que a gente passe por diferentes marcas, diferentes áreas e tipos de empresas. Existe algo muito rico em sermos expostos constantemente a desafios e contextos diferentes. Aumenta nosso repertório e nossa capacidade de encontrar soluções para desafios. Mesmo você estando dentro de uma mesma empresa/ agência por muito tempo, não significa que você vai trabalhar com a mesma marca, com o mesmo desafio, esse tempo todo. Até aí, tudo certo.

Essa dinâmica cria uma necessidade de “deixarmos nossa marca” por onde passamos, para termos certeza de que mesmo em um curto espaço de tempo – digamos uns dois, três anos – a nossa passagem tenha deixado algo que gerou impacto. Isso também vira narrativa sobre as nossas habilidades quando em uma entrevista para um novo desafio. Deixa o seu LinkedIn mais interessante, e por aí vai. Até aí, tudo certo.

Porém, o tempo da marca é diferente do tempo do profissional que esta por trás dela. Nenhuma marca resistente ao tempo, arrisco eu dizer, foi feita em dois, três anos. E é daqui que vem a reflexão.

Talvez o que mais nos falte seja a capacidade de fazer uma ideia de outra pessoa, da qual a gente não participou da concepção, evoluir. Não estou falando de sessões de cocriação ou de colaboração entre áreas. Também não se aplica somente à parte de comunicação de uma marca.

Me refiro a quando uma pessoa assume uma marca e, ao invés de entender os porquês das decisões feitas até então e avaliar os resultados e aprendizados, muda a rota ancorada em uma perspectiva externa. Ou quando um novo time criativo entra em uma marca, e, ao invés de evoluir o trabalho feito, traz uma nova história, um novo caminho criativo que vai romper o trabalho feito até então. E pensem quantas vezes a nova gestão da marca trabalhou com o novo parceiro, rompendo o trabalho anterior.

Vejo muitos desses rompimentos de construções acontecerem em detrimento do que eu vou chamar aqui de vaidade. Uma vaidade que coloca a nossa trajetória profissional à frente da marca.

É legítimo querermos criar impacto no tempo que passamos em algum lugar, até porque muitas dessas decisões, para alguns, significa um impacto no bônus que chega no final do ano, uma promoção, um prêmio e por aí vai. Mas, necessário considerar que qualquer decisão que tomarmos hoje sobre uma marca, não vamos responder por ela em dez anos, quando um novo time fizer uma avaliação de performance dos últimos dez anos, e concluir que a marca precisa de uma nova rota. Já viram esse filme?

Evoluir uma marca não significa mudá-la com frequência. Um exemplo clássico, como a Nike, que tem a capacidade de evoluir mantendo-se centrada em sua base, tem como resultado um dos brand equity mais fortes da nossa indústria – se não o mais. É uma marca contemporânea em sua expressão, consistente em sua essência. Imagino quantas pessoas já não pensaram em mexer no “Just do it” ao longo das décadas que ele existe. Décadas.

Portanto, caros colegas, convido a essa reflexão. Será que estamos tomando as melhores decisões para construir marcas que resistem às tempestades do futuro? Continuemos questionando.

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