Assinar

As memórias de um mídia mutante

Buscar
Publicidade
Opinião

As memórias de um mídia mutante

Em 20 anos de transformação da profissão, um bom Mídia continua precisando construir forte relacionamento com o mercado e ser um grande negociador, como já faziam as primeiras gerações. Mas também precisa de visão analítica para pesquisas, ser criativo nas propostas e desenvolver pensamentos estratégicos consistentes


21 de junho de 2017 - 9h00

Um estranho no ninho

São pouco mais de duas décadas desde que entrei no mercado publicitário. Na época, um caso raro de estudante de publicidade que escolheu ser mídia. Tive a sorte de identificar um interesse natural sobre o assunto.

Quando era adolescente adorava ler o jornal. Começava pelo caderno de variedades, uma espécie de bastidores do mundo da TV e das artes. E acompanhava religiosamente as top 5 audiências da semana. Depois lia o caderno de esportes, e passava um tempão analisando as tabelas dos campeonatos. Anos mais tarde, ao participar do processo de seleção de estagiários em uma grande agencia, fui o único que se apaixonou pelo patinho feio da publicidade.

Reiniciando o sistema

Quando consegui um estágio meu primeiro trabalho foi arrumar todas as estantes onde ficavam os relatórios do Ibope, Marplan, IVC, Nielsen e outros que nem lembro mais. Muito papel, muita espiral, muita gaveta e muito espirro. No meio daquela papelada toda sempre sofria com minha rinite. Fui salvo pela tecnologia, pela informatização dos dados que já existiam. Fui salvo pelos softwares. O Excell era uma ferramenta recém-chegada, e ficou mais poderoso quando sistemas de pesquisa e faturamento foram implementados.

Enquanto me deliciava com as novidades, a rapidez em conseguir cruzar números e produzir novas teorias, testemunhei a chegada de uma nova geração formada por estudantes de publicidade interessados em pesquisa. Foi a primeira grande mudança no perfil dos profissionais. E as apresentações de mídia ficaram mais coloridas, com pizzas, colunas, barras… Um carnaval de gráficos.

Cereja do bolo

Os festivais de publicidade começaram a premiar cases de mídia. Isso foi muito bom, mas trouxe uma nova exigência para a área. Em diferentes agencias, participei de reuniões onde a Mídia era cobrada para ser mais criativa, menos burocrática e trazer mais inovações. Muitos voltavam para suas mesas tentando ter ideias, inventar novos formatos.

Mas quase nunca saía algo bom. Era comum a reclamação: “A Criação nunca gosta das ideias da Mídia.” As vezes faltava reconhecer que as ideias talvez não fossem tão boas mesmo. A real é que exigiam criatividade de quem nunca foi treinado para isso. Depois de um tempo entendi que ser criativo em mídia também era conseguir encontrar caminhos para viabilizar ideias que pareciam impossíveis.

Independente de onde viessem. Acesso ao planejamento da verba e influência com tantas empresas de conteúdo certamente dão condições para transformar muitas ideias em realidade. Poder de viabilização passou a ser uma característica de Mídias modernos.

Verdadeiros Consultores

Mal nos acostumamos com a pressão para ser criativos, e começamos a ser convocados para responder uma das mais importantes e difíceis questões: Qual vai ser o ROI da campanha? Ou seja, agora tínhamos que fazer a previsão do futuro. Campanhas com foco em performance passaram a fazer parte de nossas vidas, e o desenvolvimento de novas capacidades para trabalhar com plataformas digitais, diversidade nos canais de conversão e modelos de atribuição exigiram um conhecimento mais profundo do consumidor e do negócio do cliente.

E é nesse ponto que estamos agora. Strategy is the King ! Não adianta mais enrolar. Mostrar os mesmos gráficos e discursos para atingir objetivos diferentes não cola mais. Tem que se engajar com o raciocínio que levou ao insight, tem que entender a solução criativa, o seu tom, seu território. E aí sim, desenhar, de forma artesanal e inédita, um caminho para endereçar os desafios da campanha em questão.

Nunca me senti tão relevante dentro de uma agencia. Ao longo dessas duas décadas exigiram de nós diversas novas capacidades. Atividades que não substituíram umas as outras, elas simplesmente se acumularam. Um bom Mídia continua precisando construir forte relacionamento com o mercado e ser um grande negociador, como já faziam as primeiras gerações. Mas também precisa de visão analítica para pesquisas, ser criativo nas propostas e desenvolver pensamentos estratégicos consistentes.

Praticamente um ser mutante. Um X Men. Ou na versão brasileira, um Homem do X.

 

Publicidade

Compartilhe

Veja também

  • Quando menos é muito mais

    As agências independentes provam que escala não é sinônimo de relevância

  • Quando a publicidade vai parar de usar o regionalismo como cota?

    Não é só colocar um chimarrão na mão e um chapéu de couro na cabeça para fazer regionalismo