12 de setembro de 2023 - 6h00
Não é um código. Não é um idioma exótico. Não é uma mensagem cifrada. É apenas um bilhete deixado pelo “Seu Tuinho”, eletricista que eu contratei para consertar uma fiação na minha casa. Serviço que não foi realizado, pois, como dizia o bilhete, ele e o ajudante “esqueceram de levar a máquina de furar”.
Fiquei sem luz na sala, mas uma outra acendeu na minha cabeça. Uma luz de alerta. Mas você vai dizer: o que me interessa as limitações ortográficas e gramaticais do Seu Tuinho para explicar o lapso da furadeira? O que isso tem a ver com a gente, povo deveras avançado e diferenciado da comunicação?
E eu vos respondo: tudo. Afinal, muitas vezes precisamos apresentar produtos e serviços para esse enorme grupo que não teve acesso ao ensino básico. Um público que precisa da sua sensibilidade para ser informado, emocionado e seduzido de forma adequada. Um contingente imenso de pessoas que, pasmem, não decifram as peças brilhantes do Anuário ou as trends bombadas. E aí? Você está preparado para abrir mão daquela sacada fantástica em razão de se fazer entender melhor?
É bom que esteja, porque a ideia que se encaixa perfeitamente no seu portfólio não se encaixa na vida do Seu Tuinho. E por que não? Porque foi pensada para você, não para ele.
É importante lembrar que, antes de agradar o DC, o CCO, o CMO, o ECD, o VP ou o BigBossPicaDasGaláxias, você tem que saber agradar o público-alvo (termo muito usado e pouco entendido). E muitas vezes o alvo será o Seu Tuinho, a mãe dele, o vizinho de porta, o amigo com quem ele toma uma gelada, o filho e por aí vai. E vai mesmo. Porque milhões de brasileiros são alijados do acesso à educação e à cultura, mas desprezamos solenemente essa realidade na hora de construir um planejamento criativo.
E isso acontece muitas vezes sob a alegação de que seria preconceito pensar diferente para esse target. Olha, nessas horas eu não sei avaliar se isso é preguiça, cegueira ou má fé. Afinal, a comunicação pressupõe alguém falando e alguém entendendo o que está sendo dito. Qualquer coisa fora desse padrão, certamente está apenas a serviço da egolatria criativa ou da ilusão de que a flecha é mais importante do que a mira. E ignorar isso é esquecer o cerne do nosso trabalho: saber comunicar – ser o adequador da linguagem que hora vai precisar atrair os Excelentíssimos donos do poder e do dinheiro, hora vai precisar cativar, sim, o Seu Tuinho.
Agora, por favor, se você vai me acusar de pregar o trabalho sem graça, sem bom gosto, sem appeal, economize o discurso. Antes de dizer que estou induzindo o trabalho nivelado “por baixo”, pense bem: por baixo do quê? E por que por baixo? Pessoal, estou falando de adequação. Apenas isso. Existem boas ideias para todos. Classes A, B, C, D ou E. Basta querer (e saber) ajustar a linguagem, o discurso, o tom, o foco. O trabalho não vai ser inferior por causa disso. Muito pelo contrário. Vai ser perfeito. Afinal, a criatividade tem muitas formas. E tenha certeza de que uma delas vai se encaixar direitinho na vida do Seu Tuinho.