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Criatividade descentralizada

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Opinião

Criatividade descentralizada

Com processos de construção de ideias menos isolados e mais horizontais, áreas de criação abrem as portas para a busca interna de mais diversidade, diálogo multidisciplinar e dinâmicas de trabalho mais flexíveis


16 de maio de 2022 - 12h40

A publicidade foi alimentada durante anos pelo culto a personagens criativos, cujas ideias e posturas moldaram gerações, impulsionaram negócios e atraíram talentos e reputação para a atividade. De David Ogilvy a Washington Olivetto, os publicitários que conseguiram se tornar celebridades respeitadas no Brasil e no mundo ainda são referência. Entretanto, com as agências com seus nomes aglutinadas em grandes redes globais, guiadas pela lógica do capital aberto, e as profundas transformações vivenciadas pelo mercado publicitário nas últimas décadas, impulsionadas sobretudo pela disrupção digital, diminuiu a devoção e o direcionamento dos aplausos ao líder. Instalaram-se práticas mais colaborativas na mesma medida em que a pulverização dos formatos e canais de mídia tirou o protagonismo exclusivo do filme e do anúncio. As campanhas multiplataformas chegam a ser criadas por grupos de mais de uma dezena de pessoas.

Paralelamente à menor personificação, as áreas de criação tiveram de abrir suas portas para a busca interna de mais diversidade, diálogo multidisciplinar e dinâmicas de trabalho mais flexíveis, capazes de fazer frente à disputa por talentos com empresas de outros mercados, especialmente startups e companhias de tecnologia que precisam injetar inovação criativa em suas ferramentas — em um momento desfavorável, de contextos econômicos desafiadores, que mudaram a remuneração e diminuíram os altos salários nas agências.

Na fase atual de processos de construção de ideias menos isolados e mais horizontais, e gurus criativos sem pedestal, mais colaborativos e humanizados, David Droga é o mais cultuado. Em entrevista concedida este mês à editora Isabella Lessa, publicada nas páginas 6 e 7, ele expressa sua crença no poder da comunidade (“Se você quer ir rápido, vá sozinho, se quer ir longe, vá junto”), exalta a criatividade centrada na humanidade e, sem meias palavras, analisa a transformação do mercado de agências com frases como: “Não quero proteger um iceberg que está afundando” e “Estamos encarando o futuro em vez de tentar limpar o passado”.

Ao descrever o que ocorreu com a Droga5 desde a compra pela Accenture, em 2019, David Droga faz ironia com a “dominação reversa”, de ter virado CEO e chairman criativo da companhia que o comprou, e agora se chama Accenture Song. Ora se assumindo como de “cultura mais old school”, ora se caracterizando como “pessoa criativa fingindo ser homem de negócios”, ele faz sua ode ao poder criativo, diz que a atividade está hoje na sala do board, e não somente na do CMO. Assim, não poderia haver porta-voz melhor para a semana em que Meio & Mensagem lança oficialmente a versão 2022 de seu projeto Criatividade.

Além da entrevista com David Droga, a reportagem das páginas 12 e 13 aborda como os profissionais de criação estão conseguindo desopilar a mente e manter o fluxo de ideias nesta era da falta de foco e de dificuldade de concentração diante de tantos estímulos visuais, conturbada pelo contexto pós-pandêmico. A matéria marca a abertura oficial do projeto Criatividade 2022, que inclui, durante todo o ano, a cobertura dos principais festivais internacionais de publicidade, como Cannes Lions, Clio Awards, One Show, ADC Awards, D&AD, New York Festivals e London International Awards. Além de conteúdos em vídeo e para redes sociais a serem publicados nos próximos meses, o projeto também engloba uma série em Podcast com três episódios, que estreiam simultaneamente nas plataformas de streaming neste mês. Outras iniciativas são a eleição das 10 Melhores Campanhas e das 10 Marcas Mais Criativas de 2022, a serem realizadas em dezembro, e a publicação, em janeiro de 2023, do Ranking M&M, com as agências, anunciantes, campanhas e produtoras mais premiadas na temporada de festivais deste ano. Um amplo conteúdo que pretende analisar a criatividade sob diversos ângulos e ressaltar que o risco que a indústria não pode correr é o da descentralização gerar desvalorização da atividade, que sustenta toda a cadeia produtiva do setor — o que não muda, mesmo com a enorme transformação pela qual passa o negócio publicitário.

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