De Rihanna a Manoel Soares: lições para o mercado
Subvalorização de talentos racializados ainda é prática em curso e mostra que muitas marcas ainda entendem presença dessas pessoas no marketing como mero preenchimento de cota
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Um post recente do apresentador Manoel Soares, denuncia o que empresários de pessoas negras – e as próprias – lidam diariamente no mercado publicitário: a subvalorização desses talentos e, consequentemente, cachês infinitamente menores quando comparado aos seus pares brancos. Mas, como sabido, isso não é exclusivo desse espaço.
Segundo dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD Contínua), divulgada em agosto de 2022 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatísticas (IBGE), a hora de trabalho de uma pessoa negra valeu 40,2% menos que a de um branco, no País, entre abril e junho do último ano.
Recentemente, negociando uma campanha de beleza para um talento racializado, um grande player do segmento chegou a uma contraproposta seis vezes menor ao que foi acordado para outros nomes na mesma ação – as demais mulheres, todas brancas. Justificam com números de rede social, presença midiática, popularidade. Mas há outros fatores nessa subvalorização de determinados corpos na publicidade, especialmente no Brasil – tal prática se agrava quando adicionamos marcadores LGBTQIA+ à racialidade.
A mesma empresa, há dois anos, orçou a modelo e estilista Lea T para um projeto. Com mais de dez anos de carreira, importantes campanhas de moda e beleza – várias globais -, contrato com uma maison francesa e musa de um dos estilistas mais celebrados da última década, o italiano Riccardo Tisci, Lea soava mais do que credenciada para estrelar o comercial.
Não chegamos a um consenso com a companhia por conta de valores, alegaram falta de verba. Semanas antes, o mesmo player acabara de lançar um anúncio com a modelo brasileira tida como a número 1 do mundo; uma mulher branca e cisgênera e que provavelmente havia recebido um valor 10 a 15 vezes maior do que o montante pretendido – e não aprovado – para Lea T, uma mulher negra e transgênera*.
Na era da commoditização da diversidade, a praxe do mercado segue sendo “preencher a cota”, sem considerar as subjetividades e o legado profissional desses talentos, racializados e/ou pertencentes a grupos LGBTQIA+. A discussão deve avançar. Se antes buscávamos inclusão e representatividade, a prática atual precisa considerar a equidade de remuneração para esses corpos, olhando de perto para a individualidade de suas carreiras e trajetória pessoal – a exemplo do que já fazem com pessoas brancas. “Bitch, better have my money”, cantaria Rihanna.
No primeiro trimestre de 2023, fechamos o primeiro contrato de sete dígitos para um talento da one2one. A campanha, para uma empresa americana, será veiculada globalmente. Talentos pertencentes a esses grupos são, muitas vezes, mais valorizados no exterior do que no Brasil; e tendem a ter seu legado artístico mais reconhecido fora – e, consequentemente, mais bem remunerado – do que aqui. Ingrid Silva, por exemplo, só pôde chegar ao posto de Primeira Bailarina de uma grande companhia de ballet clássico nos Estados Unidos.
Como bem apontou Manoel Soares, “a próxima fronteira da questão racial nesse país é a publicidade (…) o arauto de formação estética desse país”. Escutemos Manoel! A publicidade também é veículo, transmite mensagens e constrói narrativas. Que nosso mercado assuma um lugar de escuta ativa neste processo e que possamos ser agentes desta transformação.
(*) Nota: gramaticalmente, o correto seria mulher transgênero, no masculino. Porém, a exemplo da pedagoga Maria Clara Araújo dos Passos, autora de “Pedagogias das Travestilidades”, optei pelo uso no feminino por motivos políticos.
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