Assinar

Já pensou que pode dar errado?

Buscar
Publicidade
Opinião

Já pensou que pode dar errado?

Todo mundo associa esse olhar a algo pessimista, porém ele pode ser fundamental na busca da mobilização, visão panorâmica e construção de projetos com mais chance de dar certo


1 de junho de 2023 - 16h08

(Crédito: Reprodução)

Antes de começar um aviso: se você é irritantemente positivo, talvez esse artigo não seja para você. Ou seja. #Paz

“Vai dar certo, já deu certo. Seja otimista. Acredite em você. O que é seu está guardado.”
Você deve ter lido algo assim nas últimas horas no seu feed ou grupos.

Quanto mais complexo fica o mundo, mais a palavra da salvação passa a ser consumida.
Não à toa, muitas empresas e instituições (péssimas) conquistam fãs e clientes nas horas de maior desespero, quando precisam acolhimento e abraço amigo.

Até o algoritmo já sabe disso. Inteligência não engaja, autoajuda sim (feed virou lugar de fofoca, treta e psicologia barata… porém isso é papo para outro
artigo).

Esse não é apenas mais um artigo pra dar pau na positividade tóxica, mas sim mostrar concretamente por que precisamos urgentemente ter um contraponto para nos ajudar a chegar nos objetivos desejados.

Você sabia que a maioria dos acidentes de carro acontecem no começo e, principalmente, no fim da viagem? As estatísticas estão aí para mostrar e os especialistas para explicar. Até pode-se atribuir isso ao cansaço dos motoristas, mas o ponto fundamental que gera acidentes é o relaxamento que sentimos quando já estamos perto do destino, de casa, do objetivo estar próximo. O alívio de estar chegando torna você desatento e mais exposto a cometer erros.

Não precisa ir tão longe. Você já deve ter visto em alguma reunião aí na empresa o que acontece quando em momento de empolgação coletiva alguém levanta a mão e diz: “eu gosto também, mas essa parte da ideia temos que cuidar para não dar m* hein”. A pessoa toma uma vaia e é cancelada por estar “secando” e sendo do contra. Lembrou de alguém? Quem nunca?

Outro dia Galvão Bueno contou que o Boni (da Globo) tinha uma frase que ajudou muito no seu desenvolvimento: “pode-se fazer melhor”. Ele já estava voando, começando a virar a lenda que anos depois o Brasil conheceria e mesmo assim ouvia conselhos que o colocavam de volta ao chão, não se empolgando demais e tentando lapidar seu trabalho.

Inclusive ele contou que até hoje usa a frase na sua vinícola para criar uma cultura de fazer bem feito. (Aliás, muito bom o novo documentário sobre ele na Globoplay, ficadica). Falando em Galvão, lembrei do Senna falando: “Cada piloto tem o seu limite. O meu é um pouco acima do dos outros”.

Enfim, pensar “ainda falta algo” e que pode dar errado aumenta a chance de sucesso e eu posso provar. Não foram poucas vezes que vi isso acontecer ao vivo nos processos de inovação, criação e mudança nas empresas. Mesmo quando tudo parecia resolvido, alguma provocação ou ceticismo conseguia levar o projeto para um patamar ainda mais mágico.

Vantagens de não ser tão positivo assim:

Antever problemas ajuda no ciclo de vida da ideia

A gente projetar problemas nos cenários, antecipa algumas questões que podem ser lapidadas antes mesmo de jogarmos um projeto no mundo. Por mais que sempre teremos coisas pra ajustar, encarar um pouco esse lado cético durante concepção do projeto já ajuda a desenvolver ideias mais fortes para sobreviver. Não é pessimismo, é realismo.

Achar que é imbatível é o passo 1 para virar comum

Confiança é tipo uma massa artesanal italiana: tem o ponto. Excesso de confiança pode ser tão traiçoeiro quanto auto boicote das suas capacidades. Desconfiar na medida certa ajuda a não subestimar os desafios e mostra respeito com a vida real e suas adversidades.

Estar preparado pra lidar com tropeços

Uma das consequências da onda positiva é que os conteúdos mentem para as pessoas. Ninguém é feliz o tempo todo. Não, as coisas não vão dar super certo sempre. E sim, temos que ser felizes no trabalho mas… ainda é trabalho. É bem mais legal comer churrasco, ir pra praia ou tirar férias. Projetar um pouco do mundo real e suas durezas, ajuda a criar cascas pra saber lidar quando acontecer algo ruim na jornada. E eu garanto: vai acontecer.

Um contraponto é elemento de mobilização, não de desânimo

Pensar numa visão menos otimista-ingênua não deve nos desanimar. Na verdade, é o que pode nos manter atentos, em busca de melhorias e olhando por todos os ângulos. Não é sobre achar que vai dar errado, mas sim que “pode dar errado”. Bem diferente.
Se for uma festa na piscina, não é pensar que vai chover no dia mas sim “e se chover? qual plano b?”.

Não tenho nada contra pensar positivo, ter “fé” ou confiar na energia da coisa.

Mas pra isso já existem conteúdos demais. Se quiser, segue lendo aqueles @ e ~seja feliz, querido ursinho panda. Minha ideia aqui é subverter um pouco essa onda, tentando somar algum receio que, tecnicamente, pode te manter atento e fazendo o que tem que ser feito até o fim. Se tem algo que o mundo precisa hoje é ir “até o fim”. Começa, continua, termina. E faz bem feito.

Acredite, pensar que pode dar errado ajuda a dar certo. É cuidar pra chegar lá. Positividade demais faz você subestimar as coisas e não saber lidar com as (naturais) pedras do caminho. Like a rolling stone.

Publicidade

Compartilhe

Veja também

  • Quando menos é muito mais

    As agências independentes provam que escala não é sinônimo de relevância

  • Quando a publicidade vai parar de usar o regionalismo como cota?

    Não é só colocar um chimarrão na mão e um chapéu de couro na cabeça para fazer regionalismo