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Opinião

Merchandising à vista de todos

A Europa tem um conjunto de regras detalhado sobre product placement, o que ainda é ausente no Brasil


2 de março de 2017 - 10h29

As técnicas de colocação de produtos (product placement) nos programas televisivos foram entendidas pela legislação da Comunidade Europeia como modalidades de publicidade abusiva (diretivas 2007/65 e 2010/13/EU). A abusividade ocorre, de acordo com essas diretivas, em razão da indução ao público em erro sobre a natureza da peça publicitária em programas de televisão que mencionem produtos ou serviços, direta ou indiretamente, mediante pagamento ao veículo.

Embora as referidas normas admitam algumas exceções, a informação aos consumidores sobre o caráter publicitário da divulgação mercadológica deve ser facilmente reconhecível mediante inserção do nome, símbolo ou logotipo do anunciante. O aviso sobre a colocação de produtos pode ser veiculada no começo, durante ou ao final dos programas. Admite-se também posicionar um logotipo neutro na imagem durante o sugestionamento do produto ou serviço ao público para alertar os telespectadores a respeito da ação comercial.

 

Crédito: JGroup/iStock

Crédito: JGroup/iStock

Em caráter excepcional, os países da Comunidade Europeia podem considerar legítimas as colocações de produtos em filmes, séries, programas desportivos ou de variedades. Jamais, porém, admitem-se tais formas de publicidade em programas infantis, produtos associados ao tabaco, medicamentos ou procedimentos médicos controlados ou de forma a comprometer a liberdade jornalística.

Aqui no Brasil, o código de ética do Conar também prevê a necessidade de clareza quanto à identificação da publicidade (artigos 9, 10, 28). Tal regramento estabelece que o mechandising deve ser realizado apenas entre as 21h30 às 6h, proibindo-o, de forma mais enfática, ao público infantil.

Na legislação brasileira, o merchandising não possui regramento específico a não ser pelo Código de Defesa do Consumidor. Vale recordar que os redatores desse Código optaram por uma legislação de proteção ao consumidor mais baseada em princípios (reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor, da identificação da publicidade, da proibição da publicidade enganosa e da publicidade abusiva, entre outros) do que outra que fosse mais detalhada e específica para determinados mercados. Dessa forma, fugiria do escopo que presidiu a redação da lei adentrar em pormenores acerca de colocação de produtos em programas de TV ou o momento em que a identificação deve ser realizada, se antes, durante ou após o final do programa.

O princípio da identificação da publicidade na legislação consumerista assim dispõe: “A publicidade deve ser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal” (art. 36 do CDC). Existem ainda os deveres de informação (artigos 4º e 6º), bem como a proibição de os fornecedores prevalecerem-se “da fraqueza ou ignorância do consumidor, tendo em vista sua idade, saúde, conhecimento ou condição social, para impingir-lhe seus produtos ou serviços” (art. 39, IV).

Com efeito, podem surgir dúvidas, na leitura dos citados artigos, se quaisquer formas de merchandising, em especial as colocações de produtos, estariam vedadas pela lei brasileira. Bastaria às novelas e programas de auditório exibir nos caracteres finais dos episódios, o nome dos anunciantes em seguida dos nomes dos componentes das equipes técnicas e de cenografia?

O dever de identificar a publicidade tem natureza objetiva. Independe da capacidade de percepção dos telespectadores notar se produto de determinada marca apareceu na trama mediante pagamento ou não

Uma primeira resposta seria não. O dever de identificar a publicidade tem natureza objetiva. Independe da capacidade de percepção dos telespectadores notar se produto de determinada marca apareceu na trama mediante pagamento ou não. Aliás, a chamada propaganda “gratuita” não deixaria de ser publicidade. Mencionar ao final do programa que certa colocação de produto ocorreu equivale a não identificá-la, pois muitos telespectadores já estariam assistindo a outra emissora.

Outro olhar entende que a identificação das marcas que realizam merchandising nas novelas poderia ser feita nos caracteres derradeiros dos programas para atender a lei. Também seria possível argumentar que os telespectadores teriam inteligência suficiente para identificar o que seriam testemunhais e publicidade nos programas de TV daquilo que seria o enredo normal dos episódios.

Seja como for, pensamos que o mercado da publicidade brasileiro poderia se adiantar e adotar voluntariamente, em sua autorregulamentação e controle de boas práticas, medidas para tornar mais ostensivas as inserções durante programas televisivos e seguir os padrões europeus. Quem sabe utilizar marcas d’agua na tela durante a colocação de produtos seria um começo. Representaria uma forma de robustecer a credibilidade dos produtos e serviços anunciados. Assim, padrões de vanguarda de respeito aos consumidores poderia ser uma marca das empresas de publicidade brasileiras, além das sabidas qualidades de produção e de eficiência.

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