Problema privado ou (também) do setor privado?
Por que as empresas devem contribuir para o enfrentamento às violências contra mulheres
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Embora bem-intencionada, a pergunta pode parecer idealista e pouco prática para o cotidiano das empresas. Esta é uma questão social importante, mas por que uma organização privada deve prover respostas a um problema cuja origem lhe é alheia, e que acontece, muitas vezes, no espaço do lar e das famílias? Proponho quatro respostas que mostram a importância da iniciativa privada se unir à causa em esforços e buscas por respostas qualificadas e eficazes.
O primeiro argumento, e talvez o mais ético deles, é de um imperativo civilizatório que toda a sociedade se engaje em respostas a esta realidade brutal e pervasiva que tem o potencial de atingir, diretamente, mais de metade da população.
No ano passado, números divulgados pela Organização Mundial de Saúde – OMS, estimaram que uma em cada três mulheres é submetida, ao longo de suas vidas, a violências domésticas ou sexuais. os abusos contra as mulheres também se traduzem dentro do mundo do trabalho. O assédio sexual é um dos grandes entraves para o ingresso e o desenvolvimento delas na esfera produtiva.
O segundo argumento envolve orientações globais que sinalizam que o mundo está responsabilizando cada vez mais o setor privado pela promoção de direitos. Em 2011, a ONU implementou os Princípios Orientadores sobre Empresas e Direitos Humanos, segundo o qual, para a promoção de uma vida minimamente digna, não basta que o Estado seja o principal garantidor dos direitos fundamentais.
Meu terceiro argumento diz respeito a custos, lucro e produtividade. Abordar as violências contra mulheres não é apenas um imperativo social e moral, mas uma oportunidade econômica, uma vez que elas deixam de contribuir com o crescimento econômico e a redução da pobreza, se tiverem medo de sair de casa e serem submetidas a assédios ou sofrerem a violência doméstica.
Dados da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (FIEMG) projetam que o fim da violência contra as mulheres garantiria, em 10 anos, um incremento de R$ 214,4 bilhões ao PIB brasileiro – valor que equivale, por exemplo, a uma década do programa Bolsa-Família. Segundo pesquisa realizada pela Universidade Federal do Ceará, de 2018, as vítimas de violência doméstica faltam em média dezoito dias de trabalho por ano, o que gera uma perda anual de aproximadamente R$ 1 bilhão ao país.
Não agir em relação às brutalidades contra mulheres que acontecem no ambiente de trabalho, como o assédio sexual, pode representar uma série de riscos, incluindo litígios, perda de produtividade e danos à reputação.
É o que mostra a pesquisa “Me Too: Does Workplace Sexual Harassment Hurt Firm Value?”, realizada nos Estados Unidos, em 2022, e que mostrou que as instituições com taxas mais altas de assédio tiveram desempenho inferior ao do mercado de ações, queda nos retornos sobre os ativos e sobre os patrimônios, bem como tiveram um aumento médio de 7% em custos com mão de obra.
O quarto argumento, por sua vez, é irrefutável: porque é lei. Em setembro deste ano foi promulgada a Lei nº 14.457/2022 (Programa Emprega Mais Mulheres), que modificou a CLT visando à inserção e à manutenção feminina no mercado de trabalho formal.
As normas previstas nela transformam em regras a prevenção e as respostas ao assédio sexual e outras formas de violências contra as brasileiras no âmbito do trabalho. A nova lei pressupõe a inclusão de regras de conduta a respeito do assédio sexual com ampla divulgação do seu conteúdo; a fixação de procedimentos para recebimento e acompanhamento de denúncias; e realização, no mínimo a cada doze meses, de ações de capacitação, de orientação e de sensibilização.
As companhias que não implementarem os critérios impostos pela norma poderão sofrer multas e/ou outros tipos de sanções efetuadas pelo Ministério do Trabalho. Além disso, aquelas que vierem a responder por casos de assédio na justiça e não tiverem em dia com as medidas podem vir a responder por danos morais individuais e coletivos.
Enfrentar, prevenir e mitigar os efeitos da violência contra as mulheres é um objetivo social comum cuja solução também perpassa a iniciativa privada. Empresas podem e devem apoiar suas colaboradoras dentro e fora de seus espaços, fazendo da segurança e do bem-estar delas uma prioridade comercial que permeia todas as áreas e práticas da organização.
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