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Opinião

Relações tóxicas

Remuneração e práticas que impedem negócios sustentáveis levam agências ao extremo de tomar a iniciativa e romper relações com clientes, invertendo a lógica natural da indústria


27 de setembro de 2022 - 6h00

Crédito: 3rdtimeluckystudio/Shutterstock

Na ânsia de conquistar novos negócios, muitas agências são pouco seletivas no momento de firmar contratos com clientes que chegam aos seus portfólios. Historicamente, há casos de relações iniciadas já com perspectivas financeiras negativas ou com prenúncio de convivência desgastante, que são empurradas adiante por questões como um possível ganho de visibilidade para a agência, seja na conquista de prêmios ou mesmo na batalha das relações públicas para gerar exposição — diz o dito popular que quem não é visto não é lembrado.

Nesse contexto, não é incomum as agências alardearem conquistas exaltando a nova conta e inflando seus investimentos, mas diminuir consideravelmente as cifras e os elogios quando os desentendimentos levam ao fim do relacionamento — o que, por vezes, sequer é divulgado.

Entretanto, com a necessidade de otimização de recursos e a batalha para atrair e reter talentos, trabalhar com contas problemáticas ou pouco rentáveis tornou-se um peso ainda maior. Embora a maioria dos relacionamentos seja iniciado com o “sim” e encerrado com o “não” dos anunciantes, há casos de agências que decidem romper ou não renovar contratos. A reportagem da editora Isabella Lessa, nas páginas 14 e 15, debate as razões que levam a esse extremo.

Apesar de os atritos por questões de remuneração estarem no centro dessa decisão, também há casos motivados por incompatibilidade de valores, atritos éticos e mudanças no escopo de trabalho acordado entre as partes, incluindo demandas que extrapolam nos quesitos horários e prazos.

Os aspectos que podem levar ao esgotamento das pessoas e o comprometimento da produtividade saudável ficaram muito mais visíveis e incômodos com o trabalho híbrido e a necessidade de as agências lutarem em um contexto de escassez de talentos. Seja pelos cálculos que precisam resultar na sustentabilidade econômica das agências ou por pontos que afetam o equilíbrio mental de suas equipes, o diálogo constante para o alinhamento das expectativas e as avaliações de acertos e erros são apontados como caminhos para parcerias mais duradouras.

O estudo “O futuro das agências: visão perspectiva sobre ESG, aquisições, estratégia de crescimento e concorrência”, realizado em conjunto por Meio & Mensagem e a consultoria KPMG, investigou o tema ao ouvir 50 líderes de agências, de diversos portes, níveis de receitas e perfis de atuação. Na pesquisa, divulgada em maio, 98% dos respondentes disseram que declinariam o atendimento a um cliente por questões ambientais, sociais ou éticas que pudessem afetar negativamente a imagem ou os resultados da agência. Além disso, 46% afirmaram já terem feito isso.

Boa parte das relações com novos clientes começa com processos de concorrências, e o modelo aplicado neste início de parceria pode ser determinante para que se desenrole harmoniosamente ou não. Embora o problema dos excessos nos processos de seleção seja recorrente, nos últimos tempos entidades da indústria de comunicação tentam estabelecer padrões mais rígidos em prol de uma mudança de postura do mercado. A reportagem de Caio Fulgêncio, nas páginas 16 a 18, debate como o mercado tem tentado ir além da publicação de guias de melhores práticas e partido para cobranças mais incisivas por processos menos desgastantes, melhoras em prazos de pagamentos e adoção de escopos de trabalho e critérios de avaliação mais claros.

A esperança de agências e entidades que as representam é a de que o aumento na importância para o mundo corporativo e na vigilância da sociedade por posturas alinhadas às práticas de ESG tenha impacto também sobre as relações com clientes e chamem atenção para a necessidade de manterem parcerias que não afetem a governança e a saúde financeira e mental dos que trabalham pelas suas marcas.

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