Tarana Burke, do me too: “D&I não é iniciativa”
Para fundadora do icônico movimento social, diversidade e inclusão devem ser vividas em toda faceta de uma companhia e ser prioridade de quem recolhe o lixo até o c-suite
Para fundadora do icônico movimento social, diversidade e inclusão devem ser vividas em toda faceta de uma companhia e ser prioridade de quem recolhe o lixo até o c-suite
Roseani Rocha
11 de março de 2023 - 0h04
Alguns movimentos sociais, por mais justos que sejam, acabam tendo um pico de repercussão e impacto momentâneo. Não foi o caso do me too, criado em 2006 pela ativista Tarana Burke, mas que ganhou repercussão global anos depois, em 2017, quando a atriz Alyssa Milano tuitou este pedido: “Se você já foi sexualmente assediada ou agredida, escreva ‘me too’ como resposta a este tuíte”. Em 24 horas, o post teve milhares de respostas, incluindo de outras celebridades, como Lady Gaga, Viola Davis, Javier Muñoz e Evan Rachel Wood.
Um dos destaques do primeiro dia do SXSW, Tarana, em conversa moderada por Aliah Berman, chief diversity officer da TBWA Worldwide, falou sobre o movimento como uma plataforma poderosa de transformação social, cinco anos após a hastagh #metoo ter viralizado. Para ela, o sucesso do movimento começa pela escolha do nome, que promove empatia por quem sofreu abusos e as letras minúsculas simbolizam uma maneira gentil de falar sobre esse tipo de trauma. Depois, o logo – rosa e branco, com o me too dentro de um círculo – foi a escolha de uma forma simples, mas que justamente por isso tivesse alcance universal. Ou seja, os primeiros passos foram aliar branding a um story telling poderoso, mas direto ao ponto.
Além disso, ela comentou as origens da falta de empatia de muita gente em relação a um problema tão grande.
“A falta de empatia é causada por patriarcado e sexismo, que regem este país profundamente”, disparou Tarana Burke, sobre os Estados Unidos. Como resultado desse fator estrutural, segundo ela, as pessoas que se identificam como mulheres têm mais facilidade que outras para ter empatia – ainda que os homens também sejam vítimas de abusos, algo que ela contou que o me too está trabalhando para esclarecer melhor em suas comunicações e não continuar um movimento associado apenas às mulheres, embora estas tenham sido maioria em responder ao chamado de expor publicamente os casos de abuso.
“Quando uma mulher expõe sua história, frequentemente, há pessoas que só escutam que ‘a vida de um homem foi arruinada’; outros, que ‘a vida de uma mulher foi salva’, e isso é o que a empatia que faz”, comentou a fundadora do me too.
Marcas e empresas
Para levar as mensagens confiáveis e de forma correta, Tarana Burke também tem agora uma produtora e exaltou o papel que a publicidade pode ter em divulgar histórias relativas ao movimento. Ainda mais quando, segundo ela, existe uma parte da mídia mainstream e trolls nas redes sociais atuando para colocar para baixo o me too, com sensacionalismos sobre um possível fim ou morte do movimento.
Além de exaltar a participação de empresas e marcas em fóruns como o SXSW para discutir os temas de que o me too trata, Tarana afirmou que embora viva com otimismo e esperança, a raiva, que muitas vezes acaba sendo expressa em movimentos sociais que tomam as ruas, como a do seu ou o Black Lives Matter, não são coisas excludentes. “Devíamos ter raiva de o Donald Trump ter sido eleito” e “Que mulher preta nos EUA vive sem esperança? Acordo todo dia e faço esse trabalho – isso é esperança e amo meu trabalho”, foram frases dela sobre o tema.
A CDO da TBWA relembrou o dado de que 61% das pessoas confiam mais nas empresas do que em governos, para exaltar que as marcas e organizações têm não apenas uma vantagem, mas responsabilidade social, no entanto, sofrem muitas vezes de “paralisia da perfeição”, e questionou a fundadora do me too sobre como ir adiante em ações envolvendo temas sociais.
“D&I não é uma iniciativa. Tem que ser vivido em toda faceta da companhia. D&I tem que ser prioridade de quem recolhe o lixo até o c-suite e o orçamento de uma empresa deveria refletir isso. Leve a sério”, recomendou Tarana.
E acrescentou um segundo ponto que falta às marcas e empresas muitas vezes: coragem. Para ela, é preciso ter coragem e “é ok cometer um erro”. Neste caso, diz, a questão é admitir, reagrupar e tente uma coisa nova para endereçar o problema, uma vez que todo mundo comete erros, mas quem encara seus erros acaba até ganhando mais credibilidade.
Acrescentou que uma marca se associar ao me too não é um ato político, mas humano. Uma questão de justiça social, sendo que a violência sexual está inextricavelmente ligada a isso, argumentou, emendando que se uma marca quer ser, por exemplo, antirracista não basta levar certos speakers para falar a respeito disso na empresa, mas investir na humanidade, inclusive das pessoas que trabalham ali.
O me too foi definido por Tarana Burke, no primeiro dia de SXSW, como um movimento de “cura e ação”, cujo sucesso se deve às pessoas ligadas a ele. Não apenas as celebridades, que certamente ajudaram a lançar holofotes à questão, mas também as pessoas que no dia a dia ajudam a conferir consistência e clareza sobre o que é o movimento e construir comunidade em torno dele.
Hoje, a tecnologia – que acaba envolvendo as plataformas de redes sociais por meio das quais alguns tentam atacar o movimento – serve como auxílio para que ele continue a crescer, a despeito do fato de o me too ser, como organização, uma estrutura pequena, comentou Tarana já numa sessão curta de perguntas e respostas no final do painel,
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