Opinião

Como o ChatGPT me salvou de cair num golpe amoroso

Amar continua sendo um ato bonito, mas na era digital, amar também exige investigação

Iza França

Jornalista e Relações Públicas 6 de novembro de 2025 - 11h19

(Crédito: Shutterstock)

(Crédito: Shutterstock)

Depois de um relacionamento psicologicamente abusivo, destrutivo em diversas camadas, eu jurava que não me deixaria enganar novamente. Eu estou reconstruída, mais racional, mais forte. Ou pelo menos é isso que eu repeti para mim mesma na tentativa de não me fechar, mas de também estar mais alerta. 

Um dia, por curiosidade ou talvez por esperança, baixei um aplicativo de relacionamentos. E ali estava ele: bonito, educado, sensível, parecia conhecer os vazios exatos onde minhas carências moravam. As mensagens eram doces, as palavras certas, os horários perfeitos. Ele dizia tudo o que uma mulher exausta de dores gostaria de ouvir. 

Só que, no meio daquele encanto, algo em mim começou a soar como um alarme silencioso. 

Na verdade, a intuição sempre incomoda, mas a gente insiste em dar uma chance. 

Pequenas inconsistências, histórias vagas, um amor rápido demais. O chamado “love bombing” disfarçado de afeto pode ser o começo de um roteiro perverso. 

Foi aí que entrei em modo investigação. E, ironicamente, foi o ChatGPT, essa ferramenta que muitos ainda veem como fria, que me ajudou a enxergar com clareza. 

Pesquisei, li, entendi: eu estava prestes a cair em um romance scam, um golpe de amor digital. 

Esses golpistas atuam com precisão psicológica. Criam perfis falsos com fotos de pessoas reais (geralmente homens bonitos, uniformizados, estrangeiros). Usam linguagem afetiva, constroem confiança, se dizem apaixonados, e depois surgem os pedidos: ajuda financeira, envio de presentes, transferências emergenciais, promessas de reencontro.

Por sorte, identifiquei em tempo de qualquer uma dessas coisas. Apesar de que uma viagem súbita que ele disse estar prestes a fazer me faz pensar que ia começar aí. 

A descoberta foi dura, mas libertadora. Dá uma tristeza saber da frieza e da maldade, mas ela existe. Acredite e se cuide. Não é para você desacreditar de conexões reais (ainda que iniciem virtualmente), mas é para ficar alerta e se cuidar. 

Quero dividir aqui o passo a passo que pode salvar outras mulheres: 

Como investigar um perfil suspeito: 

  1. Desconfie da perfeição

Golpistas são rápidos em criar laços e declarar amor. Amor verdadeiro não nasce em três dias. 

  1. Peça uma chamada de vídeo

A desculpa constante — “câmera quebrada”, “não posso agora”, “estou em missão” — é um clássico do golpe. 

  1. Salve uma das fotos recebidas

Clique com o botão direito e selecione “Salvar imagem como”.  

  1. Acesse images.google.com ou tineye.com

Clique no ícone da câmera e faça o upload da imagem. 

  1. Observe os resultados

Se a mesma foto aparecer associada a nomes diferentes, países diferentes ou perfis militares, médicos ou engenheiros, desconfie. Confronte com outras redes, em especial LinkedIn, onde teoricamente é um ambiente mais comprometido com a identidade das personas. 

  1. Verifique o estilo de escrita

Golpistas muitas vezes traduzem mensagens por aplicativos. Frases truncadas, excesso de formalidade ou uso estranho de palavras são pistas.  

  1. Jamais envie dinheiro, dados pessoais ou documentos.

Nem mesmo “para liberar uma encomenda”, “resolver um imprevisto” ou “comprar uma passagem”. 

  1. Siga a sua intuição.

Se algo parece errado, é porque provavelmente está. 

No meu caso, a busca por imagem revelou que aquele rosto “tão especial” era de um homem real, mas usado por dezenas de perfis falsos em diferentes países. Era um golpe. E ele tinha inclusive outros depoimentos e denúncias atrelado à sua imagem.  

Atenção, não revide a descoberta. Despeça-se de forma tranquila, feche todas as portas e denuncie o perfil.  

Dessa vez, eu me salvei. 

E percebi algo importante: inteligência emocional e inteligência artificial podem caminhar juntas. 

Hoje, quando penso em quantas mulheres podem ser enganadas por falta de informação, sinto que contar essa história é mais que um relato, é um alerta. 

Amar continua sendo um ato bonito, mas na era digital, amar também exige investigação. 

E, às vezes, o que nos salva não é o romantismo. É a razão somada a um clique.