Para Deh Bastos, diversidade, inclusão e equidade são as pautas de sua vida
Diretora de criação analisa os desafios de sua jornada como mulher preta C-level no mercado publicitário
Para Deh Bastos, diversidade, inclusão e equidade são as pautas de sua vida
BuscarDiretora de criação analisa os desafios de sua jornada como mulher preta C-level no mercado publicitário
Marina Vergueiro
21 de agosto de 2023 - 9h15
Após dois anos como como diretora de criação na Publicis, Deh Bastos assume neste mês como sócia e diretora executiva de criação da agência Map Brasil, onde irá liderar a área de publicidade com impacto social. “Nos últimos quatro anos da minha carreira, tenho buscado incansavelmente entender como, verdadeiramente, as marcas podem se conectar com as pessoas e tenho certeza de que o impacto social é uma ferramenta importante. A publicidade precisa ir aonde a intenção das pessoas está e isso gera impacto”, afirma. Quando adolescente, Deh sempre sonhou em estudar Comunicação. “Como uma menina preta, periférica, isso sempre esteve muito distante de mim”, conta. Mas o Prouni foi o grande divisor de águas, possibilitando que ela estudasse Publicidade na Universidade Estácio, no Rio de Janeiro.
Deh iniciou sua carreira como operadora de telemarketing, área em que se desenvolveu e foi alcançando novas posições, até se firmar como gerente, quando decidiu direcionar todos os seus esforços como comunicadora. Começava ali a caminhada pela publicidade através do audiovisual, onde atuou inicialmente como assistente de produção e foi escalando degraus até chegar a produtora executiva. “Brinco que a minha escola de criação foi a produção. Não crio nada que não possa ser produzido”, diz. A escrita sempre foi sua grande paixão e, ao tornar-se mãe, lançou o projeto Criando Crianças Pretas, através do qual pode iniciar sua trajetória como redatora antirracista. “Não tive letramento racial, me dei conta do que era ser uma pessoa negra no Brasil tardiamente. Quando fiquei grávida do meu filho, não queria que ele tivesse esse mesmo tipo de não pertencimento. Então, decidi que, desde o momento em que ele estivesse na minha barriga, eu ia falar com ele sobre referências”, conta. O projeto rendeu uma personagem negra na Turma da Mônica inspirada nela, que tatuou no braço.
Após atuar como diretora criativa freelancer atendendo marcas como Coca-Cola, Petrobrás, Ambev, Unilever e Nestlé, chegou à Publicis em 2021 para assumir a cadeira de diretora de criação e conteúdo. Na agência Deh fez também um trabalho para apoiar e incentivar profissionais negros. “A diversidade, a inclusão e a equidade não são a minha pauta, são a minha vida”. Em 2022, foi convidada para ser membro do Conselho de Desenvolvimento Econômico Sustentável da Presidência da República. “É um lugar onde a gente levanta questões da sociedade civil, do mercado e do universo corporativo para poder conectar isso com o planejamento de ações que possam ser feitas pelo governo federal”, afirma. Selecionada como jurada da etapa de shortlists do Cannes Lions 2023, atuando na área de Film Craft, Deh Bastos acredita que sua indicação foi resultado de um movimento intencional e corajoso de pessoas pretas do mercado brasileiro que captou a atenção da diretoria do festival. “Era algo tão distante da minha realidade, tão inacessível que nunca entrou nem no meu radar. Na faculdade, lembro de perguntar para um professor o que é Cannes e ele disse que isso não era para o meu bico”, recorda-se.
Meio & Mensagem – Como você promove a diversidade e a inclusão no seu ambiente de trabalho?
Deh Bastos – Tem uma diferença muito grande entre representação e representatividade. Representação é toda a imagem que representa algo ou um grupo, então, encontrar uma boneca preta numa prateleira é representação de crianças pretas. Isso é muito importante para a construção da identidade. Representatividade, entendo como o poder de fazer mudanças. Uma pessoa com consciência, intencionalidade, letramento, uma pessoa gorda, LGBT, qualquer um que tenha hoje consciência dessas opressões e que tenha poder de fazer mudança transforma os lugares. Como diretora, tive várias oportunidades de contratar diversas pessoas negras. Então, o que faço é usar a minha cara preta e o poder que me cabe enquanto diretora para ter atitudes intencionais.
M&M – Como você define seu estilo de liderança?
Deh – Quanto menos necessária eu for, melhor. Alguns dos meus liderados têm dificuldade de entender isso no começo da nossa relação, porque o mercado é atravessado de muito ego. Tem muito líder com necessidade de dar uma última palavra, mesmo que a última palavra não seja necessária. Há muitos anos, pratico a não necessariedade. Então, tento dar apoio para o meu time, cuido deles para que eles possam cuidar do trabalho. Acho que tem perguntas essenciais que posso fazer como sênior que faça com que eles tenham mudanças na forma de pensar e de operar. Mas é isso. Quanto menos necessária eu for, melhor líder me considero.
M&M – Como foi a sua imersão na aldeia do povo Puyanawa, no Acre, em iniciativa dos Creators Academy Brasil?
Deh – Tive uma reconciliação com a publicidade, com a qual tenho um relacionamento tóxico consciente. Sei que ela me faz mal, mas eu a amo. E vivendo sete dias em uma aldeia, entendi a completa desnecessariedade do que a gente faz. Entendi que se a gente não usar este dinheiro e alcance para as mensagens que precisam, nada disso faz sentido. Descobri que o que sempre gostei na publicidade é o alcance. É a forma como a gente chega na casa das pessoas como nenhuma outra coisa chega. E as lições de liderança que aprendi com o cacique Joel Puyanawa não aprenderia em nenhuma escola de negócios do mundo. As coisas que ele me disse sobre como lidera o povo, toca as pessoas no coração, as engaja, de como respeita o tempo de cada um e tem retidão e fé em todas as decisões.
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