Opinião: Quanto vale o show?

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Opinião: Quanto vale o show?

Um ensaio sobre talento e parafusos


7 de maio de 2015 - 10h30

Precisamos mesmo de uma agência de publicidade? Essa é uma questão que invariavelmente, cedo ou tarde, vai surgir no dia a dia dos anunciantes. E, claro, não se trata de uma cruzada contra a indústria da propaganda, mas uma decorrência natural de um contexto cada vez mais competitivo, onde a busca por eficiência tem forte correlação com redução de custos. E, pode perceber, em dilemas desse tipo quase sempre o rabo abana o cachorro. Nesse caso, a discussão se dá em torno de preço e não de valor. “Quanto custa o show?” em vez de “Quanto vale o show?”

Digo isso porque a precificação, quando baseada apenas em aspectos objetivos e racionais, deixa de lado o intangível, o talento em fazer algo que, se soubéssemos fazer bem, já teríamos feito há muito tempo. Em tese, o cliente contrata alguém para fazer um trabalho que ele não sabe fazer, senão ele mesmo faria. E esse é o ponto. E vale para os dois lados.

O desafio das agências é recuperar e fortalecer o valor percebido junto aos clientes. O dos clientes é, em contrapartida, dar o devido valor ao talento. É um exercício bilateral de exigir e se dar ao respeito. E se talento é a moeda, essa é a discussão. Se por um lado as agências se queixam de clientes que compram propaganda como se fosse parafuso, por outro, essa é a maior crítica do outro lado sobre o que se vende. Aqui, só vejo uma solução: investir em capital humano. De verdade, sem balela. Levando tão a sério, que se poderia publicar no balanço da empresa.

As agências, ao investirem menos em pessoas,­ correm o risco de ver seu maior ativo escorrer pelo vão dos dedos. Menos pessoas talentosas, obviamente, mais parafusos. Mais parafusos, mais clientes insatisfeitos.

Por outro lado, no marketing do anunciante o risco é o mesmo. Passamos por um momento de transição e de certa crise de identidade que se reflete em menos especialização, menos repertório e “juniorização”. Um contexto que, em muitos casos, impacta a respeitabilidade dessa função dentro das empresas e torna mais raro o surgimento de lideranças capazes de atuar com força na construção de um mercado mais sustentável.

É como qualquer outra profissão. Coloque a melhor calculadora nas mãos do pior CFO. Ou uma raquete de tênis desenvolvida pela Nasa nas minhas. Não vai dar em nada.

Nós, anunciantes, ao refletirmos sobre o valor das agências, não podemos nos eximir de ponderar a nossa capacidade de liderança e de aportar valor nessa cadeia. Se não a conta não fecha mesmo. Não pode ser um contra o outro. Para extrair o melhor dos melhores, temos de jogar mais frescobol e menos pingue-pongue.

No final das contas, todos deveríamos querer a mesma coisa. Fazer de um jeito divertido a melhor publicidade possível. Aquela que cumpre seus objetivos de negócio e ao mesmo tempo constrói marca por ser memorável.

E precisamos de pessoas talentosas para descobrirem onde mora hoje essa tal memorabilidade. Pessoas com a capacidade de enxergar coisas que estão debaixo do nosso nariz, dando sopa. E se apropriar delas de um jeito diferente, relevante, simples e sedutor.

Pessoas que gostem de frio na barriga e não de marmita morna. Que guardem dinheiro para investir no erro. Que corram risco. E, sobretudo, entendam que ele é uma questão de perspectiva, onde o risco de dar certo é infinitamente menos arriscado do que o de cair na vala comum do esquecimento.

Precisamos no marketing de pessoas com talento para liderar. Liderar gente boa e muitas vezes melhor do que a gente. Liderar e não só mandar. Gente menos de e-mail e mais de corpo e alma. Que brife menos e inspire mais. Que saiba a importância de servir ao time. Sim, o líder precisa antes de tudo servir.

O anunciante sabe perfeitamente o quanto paga, mas precisa refletir cada vez mais sobre o valor que gera. Não somente no bottom line, mas o valor que agrega no processo para se construir algo de fato memorável. Caso contrário, vão perguntar por aí: “Precisamos mesmo de uma área de marketing?” 

Eduardo Tracanella é superintendente de marketing institucional do Itaú-Unibanco

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A íntegra desta opinião está publicada na edição1658, de 4 de maio de 2015, exclusivamente para assinantes, disponível nas versões impressa e para tablets de Meio & Mensagem. Nos tablets, para acessar a edição, basta baixar o aplicativo nos sistemas iOS ou Android

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