Criação publicitária busca equilíbrio entre IA e talento
Indicados ao Caboré 2025 refletem sobre o papel humano na era da inteligência artificial

Indicados na categoria Profissional de Criação analisam o mercado de publicidade (Crédito: Divulgação)
Equilibrar a pressão pela eficiência nos resultados imediatos com a constante busca por ousadia criativa, capaz de gerar valor, tem sido um dos maiores desafios da criação das agências, segundo Mauro Ramalho, chief creative officer (CCO) da Publicis Brasil, que é um dos três concorrentes estreantes na categoria de Profissional de Criação do Caboré 2025.
Os clientes, diz o executivo, estão mais exigentes do que nunca, mirando performance em canais fragmentados, mas sem renunciar ao brilho criativo. Essa relação se torna mais complexa ainda diante do que chama de “maior transformação tecnológica da história”, que requer capacidade de “surfar a onda” para alavancar os resultados.
Na visão de Rodrigo Jatene, CCO da Wieden+Kennedy, a inteligência artificial (IA), tema de inúmeros debates da indústria criativa nos últimos anos, se consolidou como evolução na maneira de trabalhar, ainda que as agências, até o momento, tenham conseguido explorar apenas a superfície do impacto a ser provocado.
“De tempos em tempos, a tecnologia nos oferece novas ferramentas que nos ajudam a fazer o que fazemos de formas que não pareciam possíveis antes, com mais fluidez, profundidade, sofisticação, rapidez e eficiência. Não vejo um futuro que não contemple IA ou seja lá qual for a evolução dela”, declara.
O CCO da Suno United Creators, Rynaldo Gondim, concorda com os colegas em relação ao grau de disrupção da IA no setor. Gondim pontua que, na realidade da Suno, as ferramentas foram inseridas em todos os processos — desde a elaboração dos briefings, passando por pesquisas e busca por insights para o planejamento e criação, até a construção de planos de mídia e a execução de peças criativas.
O entusiasmo diante dessa realidade divide o mesmo espaço com a preocupação. “A regulamentação global não está acontecendo na mesma velocidade do que o aprimoramento da ferramenta. A IA pode gerar desemprego em massa e desigualdade social ainda mais absurda”, alerta Gondim.
Retorno evidente
Mesmo assim, no que diz respeito à publicidade, a transformação é sem precedentes, acrescenta Ramalho. Otimizar resultados, criar experiências personalizadas e interativas, gerar insights a partir de dados em tempo real, acelerar testes de formatos e expandir a criatividade para territórios antes inimagináveis são, para o CCO, algumas das principais possibilidades.
“Acredito que a IA funcionará como um exoesqueleto criativo, ampliando capacidades, acelerando processos e abrindo novas fronteiras. Na rotina de uma agência, já não é mais um recurso extraordinário do futuro, mas sim tecnologia essencial, integrada à base do nosso cotidiano criativo”, afirma.
Além das transformações tecnológicas, existem desafios humanos em jogo. Jatene alerta para o êxodo de talentos para outras indústrias criativas, o que cria uma urgência: encontrar outras maneiras para atrair e reter as novas gerações de profissionais.
É fundamental, para o executivo, que as agências deixem de ser empresas de publicidade e se transformem em empresas de criatividade, com atuação mais plural. “Ser uma ‘creative company’ não só amplia nossa atuação, mas, e principalmente, atrai talentos que não estão mais dispostos a limitar sua potência criativa apenas nas fronteiras da propaganda. Sem talento, essa indústria não existe”, defende.
De certa forma, Gondim concorda com a posição de Jatene ao dizer que, a despeito de todas as mídias novas e do avanço tecnológico, o anseio pela melhor ideia continua sendo o cerne da publicidade. Com isso, resume que, apesar das mudanças, a criação não perdeu seus fundamentos. “Talvez, o grande desafio seja convencer os clientes de que o critério em relação à comunicação continua sendo o ‘bom ou ruim’ e não ‘novo ou velho”, reflete o CCO da Suno. “Algo que nunca muda é o poder da criatividade. Não importa o formato, plataforma ou tecnologia, ela continua sendo a força que move e transforma tudo”, concorda Ramalho.
Futuro da criação
Ao refletir sobre os rumos da criação, Jatene é a favor do pensamento de que a estrutura não muda, o que torna difícil de relacionar o trabalho criativo a tendências, que podem ser passageiras. Por isso, antes de seguir uma novidade, é mais importante entender o contexto, encontrar um insight poderoso, culturalmente ambicioso, que dê vida a uma ideia surpreendente, e executá-la de forma impecável. “Nada disso é tendência, mas funciona”, diz.
Ramalho entende que o futuro da criação se move em duas frentes: tecnológica e humana. De um lado, o “branded entertainment” transforma campanhas em conteúdo que as pessoas querem assistir. O “social first”, premissa de muitas operações, faz ideias nascerem nativas para TikTok e Instagram, por exemplo, e as experiências imersivas colocam o público dentro da história.
Do outro lado, inclui o CCO da Publicis Brasil, há o resgate à essência da publicidade: boas ideias que vendem. Emoções como alegria, pertencimento, empatia, desejo e nostalgia voltam a conectar marcas e pessoas, com o humor retomando protagonismo, porque todos querem rir e se divertir. “Além disso, os criadores se tornaram a própria cultura das marcas, trazendo legitimidade em um mundo incerto. No fim, o futuro da criação está nessa soma poderosa: a tecnologia expande possibilidades e o humano que dá sentido e transforma conexão em venda”, salienta.
Gondim, da Suno, tem duas apostas centrais. Uma, de ordem pragmática, diz respeito ao formato. O executivo coloca a lupa no fato de que quase a totalidade das peças em todas as mídias, na atualidade, não são mais estáticas, o que expande a importância do vídeo. O segundo palpite está mais no campo estratégico. “Nunca mais deixaremos de nos preocupar com performance e impacto, mas passaremos a nos preocupar novamente em construir marca. Por isso, os profissionais que souberem contar histórias terão uma grande vantagem em relação aos outros”, arremata.