2020: olhando pelo para-brisa

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Opinião

2020: olhando pelo para-brisa

A instabilidade que dominou os últimos anos vai se amplificar, aumentando o risco de rupturas com a nossa maneira linear de projetar o futuro


26 de fevereiro de 2019 - 15h20

 

(crédito: SolidColours/Istock)

Adentramos o último ano da década (passou rápido, não foi?). Obviamente seria muita pretensão querer fazer projeções para a próxima, mas esta será certamente uma demanda ou pelo menos tema de debate em nossas empresas ao longo de 2019. E antes de entrar no detalhe, vale a pena se perguntar com qual “cabeça” você pensa o papel da tecnologia na estratégia do seu negócio.

Tenho participado de discussões em empresas e pesquisado com diretores e gerentes de marketing que são alunos do mestrado da GV como o avanço tecnológico está transformando alguns pilares da maneira clássica de pensar competição. Mesmo sem querer, boa parte das organizações permanece presa à concepção de que o foco da estratégia deve ser vencer a concorrência e que a melhor forma de atingir este objetivo é por meio da análise das forças do mercado. Você conhece bem o tipo: ele usa uma matriz SWOT para resolver tudo e coloca alguns clichês do tipo “dados são o novo petróleo” para dar um ar moderninho ao seu argumento.

Esta é uma abordagem cada vez menos sustentável diante da combinação das forças tecnológicas, políticas e demográficas que vão afetar o mundo e o Brasil nos próximos dez anos. A instabilidade que dominou os últimos anos vai se amplificar, aumentando o risco de rupturas com a nossa maneira linear de projetar o futuro (não tenho espaço para entrar em detalhes aqui, mas a construção de boa parte de nossas “previsões” se baseia em regressões mais ou menos sofisticadas do momento presente em relação ao passado). Em primeiro lugar, o avanço tecnológico e a pressão sobre os sistemas legislativos tornam as fontes de vantagem competitiva cada vez mais efêmeras. Qualquer inovação em processos ou produtos é rapidamente copiada ou adaptada, ao mesmo tempo em que as novas formas de mobilização da opinião pública aumentam a volatilidade das barreiras legais e reputacionais que protegem seus lucros.

Neste cenário, não adianta pensar a tecnologia somente como aumento da eficiência operacional, como têm feito muitos anunciantes quando discutem sua estratégia de comunicação (caso típico: o anúncio de que a P&G apresentou seus melhores resultados trimestrais em muitos anos, apesar de expressivos cortes no marketing. O desafio é colocar a tecnologia como algo que possibilita criar laços com o consumidor com uma amplitude, frequência e profundidade que elevam os custos (emocionais ou cognitivos) da mudança da marca.

Não por acaso, o MIT tem sido fonte de algumas abordagens interessantes sobre esta mudança na forma de pensar estratégia . Se levamos este tipo de “moldura” para o marketing e a comunicação, fica claro que a aplicação das técnicas de big data e inteligência artificial não pode ser um fim em si, mas uma maneira de construir relacionamentos de forma mais profunda e veloz que os concorrentes — não por acaso, exatamente o que a Amazon faz.

Esta é uma condição necessária, mas não suficiente, para lidar com a imprevisibilidade crescente na próxima década.

Do ponto de vista do responsável pela marca, o diferencial vai ser como construir, ao redor desse núcleo de “relacionamento ciborgue”, uma cadeia de fornecedores e distribuidores capaz de acompanhar a velocidade das mudanças nas expectativas e gostos dos consumidores. E esse é exatamente o diferencial estratégico da próxima década: uma maneira diferente de fazer as coisas na integração entre produção, comunicação e entrega. Toda vez que uma empresa consegue ocupar este espaço, ela se torna o centro de uma “rede de valor”, um conjunto de relacionamentos e contratos extremamente difícil de ser substituído. Ou, visto de outra forma, ela se torna mais “resiliente” (para usar um termo da moda) aos choques de mercado.

Os avanços esperados pela combinação entre abundância de sensores e técnicas de inteligência artificial vão permitir a construção destas redes de valor de uma forma muito mais veloz do que vimos nesta década que vai acabando (Uber, AirBnB, a própria Amazon). Este é claramente um papel para o marketing, mas que se não for ocupado por ele vai ser conduzido por profissionais de tecnologia ou operações. Tentar encontrar o lugar da sua marca, ou como sua empresa pode contribuir para as marcas dos seus clientes se aproximarem do centro destas cadeias será a chave para a sobrevivência profissional e empresarial na próxima década.

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