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Maior disposição das empresas anunciantes em internalizar tarefas da publicidade e serviços de marketing muda relação com as agências e reforça a importância de elas ocuparem os espaços de estratégia e criatividade


20 de fevereiro de 2024 - 14h00

Não é de hoje que a comunicação das marcas é afetada pelas respostas em tempo real do público. Desde que as redes sociais amplificaram as opiniões de seus usuários, a publicidade passou a lidar com críticas que antes não ressoavam tão rápido. Uma campanha só saía do ar se algum grupo organizado e com espaço na mídia encampasse o descontentamento ou quando pesquisas sugeriam mudanças de rota.

Na semana passada, poucos dias após estrear, um vídeo do Burger King protagonizado pelo ex-ator pornô Kid Bengala foi tirado do ar, depois de gerar críticas por suas piadas de apelo sexual. O anunciante explicou que, mesmo sendo reconhecido por “uma comunicação moderna, bem-humorada e provocativa”, preferiu interromper a veiculação “para não ampliar as discussões e polarização nas redes”.

Embora, neste caso, a criação da campanha tenha sido feita por uma agência externa, a Jotacom, a velocidade necessária para entrar nos diálogos das redes sociais — e retirar-se quando vence a tese de prudência — foi um dos motivadores de um dos principais movimentos que afeta o mercado publicitário. A disposição das empresas anunciantes em abrir frentes de trabalho in-house não é nova, mas foi inflada pelo embarque das marcas na produção diária de conteúdo para as redes sociais. Essa demanda por agilidade, aliada à maior cobrança por otimização de recursos, ampliou o escopo de trabalho das houses para atividades como performance, CRM, dados, commerce e canais direct-to-consumer.

O percentual de grandes anunciantes que possuem estruturas internas para cuidar de tarefas da publicidade e serviços de marketing subiu de 45,7% para 58,9%, do começo de 2023 para o início deste ano. Ou seja, em apenas um ano, a penetração das in-houses saltou 13,2%. Essa é uma das revelações mais importantes do Painel Marketing Trends, pesquisa de Meio & Mensagem feita em parceria com a Kantar Ibope Media, que nesta primeira rodada de 2024 contou com a participação de 78 CMOs e decisores de marketing. Os índices somam as respostas dos que só têm operações in-house com os que preferem o modelo híbrido, mantendo parte do trabalho com a equipe interna e parte com as agências externas. Os anunciantes que optam pela divisão de tarefas entre houses e agências aumentaram de 41,4% para 55,1%. Essa fatia que enxerga as duas possibilidades como complementares tem exercitado quais atribuições são melhor executadas pelas equipes internas, muitas vezes montadas com o auxílio — mesmo a contragosto — das parceiras externas de publicidade. Embora as demandas mudem caso a caso, na média, há uma concordância de que os pontos fortes das agências são a estratégia e a criatividade. A primazia de cuidar da mídia já não é tão inabalável como antes, especialmente depois da instalação no País das empresas especializadas em mídia, que tiram parte dos afazeres das agências de publicidade, e do avanço de formatos de compra digital, como performance e programática — atividades que alguns anunciantes optam por internalizar.

Entretanto, mesmo nos campos da estratégia e da criatividade as houses andam quebrando paradigmas. Reconhecimento maior para a criação publicitária global, o Cannes Lions concedeu três Grand Prix na edição do ano passado para a house da Apple, um deles na tradicional área de Film. Aplaudida por ser uma das marcas que mais investe em criatividade, a Apple é um dos anunciantes que atua sob modelo híbrido, com longa relação com a rede TBWA. Mas mesmo o trabalho com a parceira externa evoluiu para a criação de uma rede exclusiva para o seu atendimento, a TBWA\Media Arts Lab, que tem seis escritórios estruturados em diferentes regiões do mundo.

Curiosamente, enquanto perdem terreno para as houses, as agências de publicidade também recorrem ao discurso da agilidade e otimização de recursos para internalizar serviços de produção audiovisual, que tiram trabalho e dinheiro das produtoras independentes, em outro movimento que ganhou adesões nos últimos tempos e pode mudar as relações comerciais do mercado publicitário e a configuração de forças que o sustentou até aqui. Como ocorreu em outros segmentos, o parceiro também pode ser concorrente.

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