De quem era aquele nome na porta?
Nos últimos anos, o vazio deixado pelas grandes redes abriu espaço para as independentes, que chegaram com nomes que já anunciam sua crença
Já reparou quantas marcas vêm desaparecendo nos últimos tempos? A ideia de perenidade parece ter saído de moda, como dançar música lenta.
Mas talvez a pergunta certa não seja por que tantas se vão, e, sim, o que faz um nome continuar na porta.
Criatividade sempre foi um exercício de persuasão. E, historicamente, cada agência encontrou a sua forma particular de conquistar sucesso. Essa forma tem nome: cultura criativa.
Porque é isso que mantém uma agência relevante. Uma personalidade coletiva, capaz de atrair ou afastar, inspirar ou incomodar. Cultura é o que faz uma empresa ser velcro e teflon ao mesmo tempo.
Na teoria, cultura é um conjunto de valores, crenças, rituais, modos de fazer e decidir. Na prática, é o que seus pais te ensinaram e que você carrega nos sobrenomes.
Por isso, cultura precisa ter nome e sobrenome. Bill era Bernbach. David era Ogilvy. Leo, o Burnett. Roberto, Petit e Zaragoza: a DPZ. Washington, o Brasil. Esses nomes não decoravam a porta. Sustentavam a casa.
Acredito que, quando se perde o porquê, não há mais motivo para estar.
Nos últimos anos, o vazio deixado pelas grandes redes abriu espaço para as independentes. E elas chegaram com nomes que já anunciam sua crença logo no crachá: Mischief. Gut. Unbelievers. Uncommon. Tech&Soul. Dark Kitchen.
São nomes que saem da porta e viram cultura.
O tempo mostra que o mercado é implacável com quem esquece o que o move.
Quando a crença se dissolve, o brilho apaga. Agência sem cultura é corpo sem alma. Vive por aparelhos. Respira por pitch.
No espiritismo, acredita-se que uma alma, mesmo depois de desencarnar, continua vagando até encontrar evolução. Há agências assim também: vivas no CNPJ, mas sem presença espiritual.
Outro dia ouvi um amigo cliente, desses que falam pouco e acertam em cheio: “Muita agência morta ainda anda por aí, e muita agência viva não percebeu que já morreu faz tempo”.
Cultura é o que ancora uma empresa no tempo. Sem crença, sem ritual, sem identidade, ela se torna apenas um espaço vazio pronto para ser ocupado por qualquer discurso que pague o aluguel.
Porque a criatividade de uma agência é o espelho daquilo em que ela acredita.
Existem muitos caminhos para chegar a uma boa ideia, mas cada um precisa escolher o seu mapa. Todos podem até alcançar o mesmo destino, mas só quem traça a própria rota chega de verdade.
Com o tempo, fui montando minha própria definição de cultura. Talvez distante do ideal, mas verdadeira. É minha. É do Márcio (Santoro, sócio de Gordilho na Africa Creative). É real.
Pergunte a uma das nossas mais antigas funcionárias, a Kedi, o que é a Africa.
Ela vai saber responder. Agora pergunte à sua Kedi o que é a sua. Se a resposta demorar, talvez seja hora de recomeçar.