Maestro de uma orquestra invisível: a arte de ser perfumista
Ao transformar o invisível em fragrâncias, ele une ciência, memória e poesia para despertar sentidos
No Brasil, a perfumaria ocupa um lugar que vai muito além da estética: é parte da nossa cultura, da forma como nos apresentamos ao mundo e de como nos relacionamos com nós mesmos.
Para muitos, o perfume é mais do que uma assinatura olfativa, é uma extensão da identidade, um elo invisível que conecta memórias, emoções e experiências.
A rica tradição da perfumaria se revela na arte de uma figura muitas vezes desconhecida: o perfumista. Esse profissional, um verdadeiro mestre da sinestesia olfativa, traduz as sutilezas do mundo – a frescura da chuva, o calor da madeira, a delicadeza de uma flor – em complexas composições.
A criação de uma fragrância exige a seleção precisa de ingredientes, a harmonização de notas e um profundo conhecimento da química dos aromas, culminando em uma obra-prima olfativa.
O perfumista conduz uma orquestra invisível no ar, onde cada ingrediente é uma nota musical, interagindo em ritmo e tom para construir uma narrativa olfativa única, para que, ao final, o consumidor sinta não apenas um perfume, mas uma história contada pelo olfato.
O meu ofício é justamente esse: traduzir o invisível em emoção.
Ao longo da minha trajetória de mais de 28 anos, testemunhei o privilégio de participar da vida das pessoas de forma íntima e silenciosa.
Uma fragrância pode evocar a lembrança de um abraço, de um primeiro encontro, de um instante que nunca mais será esquecido. Ele acompanha conquistas, despedidas, recomeços. Está presente quando queremos coragem, afeto, leveza. É um companheiro invisível que traduz aquilo que nem sempre conseguimos dizer em palavras.
Tive a honra de participar da criação de fragrâncias que hoje são ícones e que fazem parte da vida dos brasileiros e explorei caminhos inéditos, como o desenvolvimento da primeira fragrância do mundo com inteligência artificial ou da primeira fragrância não comercializada, que se tornou um chamado pela sustentabilidade e pesquisas em neurociência que revelam como o olfato impacta emoções e bem-estar.
Cada inovação nos lembra que a perfumaria é, simultaneamente, arte e ciência, tradição e futuro.
Hoje, quando penso no futuro da perfumaria, vejo um território em que tecnologia e criatividade caminham juntas. Do resgate de técnicas artesanais milenares, como o enfleurage, ao desenvolvimento de ingredientes sustentáveis e exclusivos em nossos laboratórios, seguimos explorando novas formas de traduzir o que sentimos em fragrâncias únicas.
A profissão, embora rara, se torna ainda mais necessária: em um mundo acelerado, o perfume nos convida a pausar, respirar e sentir.
Neste mês, em que comemoramos o Dia do Perfumista, celebro os contadores de histórias através do olfato. E se há algo que aprendi nesses anos é que, enquanto houver memórias a serem guardadas e emoções a serem despertadas, sempre haverá espaço para a arte do perfumista.