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Opinião

O quanto a diversidade é importante para todEs?

A tecnologia é uma ferramenta inclusiva importante porque não seleciona o usuário, não o classifica, só o serve


3 de fevereiro de 2020 - 13h49

(Crédito: SV Sunny/ iStock)

Sou Samanta Lopes, negra, mulher, periférica da Zona Leste de São Paulo, tenho 46 anos e sou mãe de dois meninos, ambos não negros. Já vou explicar isso. Sabiam que ser incluso envolve ter o CEP certo, o diploma certo e, muitas vezes, a roupa, o cabelo e a cor de pele que as outras pessoas consideram “adequados”?

“Ih! Começou o #mimimi!!!”. Posso até ver algumas expressões de estranheza e raiva. Sei que, atualmente, há muita gente erguendo a voz, fazendo-se presente para resgatar a história que foi apagada, principalmente por conta do histórico de sequestro massivo e contínuo de negros há séculos, por anos de escravidão, por conta do racismo estrutural entre outras ações todas voltadas a ferir e excluir negros. E sei que tudo isso aconteceu antes do século 21. Aqui, imagino o pensamento daquela pessoa não negra: “…Eu até tenho conhecidos negros, para que tudo isso? Essas discussões só afastam as pessoas, somos todos iguais!”. Opa! Vamos parar nessa frase.

Eu me percebi negra muito cedo! Sim, o saber-se negro é um despertar de consciência. Reconhecer a leitura de mundo que é feita sobre você, dizendo em qual lugar os outros te enxergam e te percebem, estar ciente que sua cor é um fator limitante, pode despertar resignação, negação ou resistência e afirmação. Foi o que aconteceu comigo — mesmo sendo negra, mulher, periférica, estudante de escola pública, sempre busquei superar as expectativas, sempre lutei para ter um excelente desempenho em tudo que fiz. Reconhecer minha ancestralidade negra sempre me ancorou, porém, não limitou meus sonhos, mesmo que os outros dissessem não, eu sempre busquei ir além ou buscar outro lugar para ser e estar.

O reconhecer-se negro hoje tem feito as estatísticas do IBGE mudarem, afinal, muitas pessoas que se denominam negros ou pardos, antes se autodeclaravam brancas. Sim, negavam ser negras. Sabe o colorismo? O mundo geralmente nos trata como negros ou não negros. Isso não nos dá os mesmos privilégios dos brancos, apenas nos permite estar onde negros não estariam. Não quer dizer que temos condições equânimes. E sempre que as pessoas são preteridas nas oportunidades por conta da tonalidade de sua pele, o racismo se fortalece. Porém, está posto: quanto mais retinta ou mais escura é a pele, maior será a dificuldade dessa pessoa em adentrar os lugares, estudar, ser promovida, enfim, ter oportunidades de melhoria em sua vida. Vivi isso em todos os nãos que recebi: nos olhares, nas exclusões, uma vez que o segmento de tecnologia é fundamentalmente masculino, branco e machista.

E, nesse cenário que era contrário a tudo que sou, fiz uma de minhas jornadas de carreira mais significativa, chegando à coordenadora de um grupo de engenheiros, responsável pelo suporte e SLA, na área de gestão de contratos em uma empresa que atendia América Latina com soluções proprietárias para call center. Em 2014, a operação em que atuava foi finalizada em nível global e precisei fazer escolhas.

No mundo cheio de “se” e “mas”, escolhi que era hora de fazer do meu jeito, buscar autonomia, abrir espaço e uma das metas é trazer mais mulheres, pessoas negras e outras pessoas de grupos considerados minorias para lugares onde não são vistos, onde, infelizmente, não se veem e nem se sonham. Esses grupos minorizados são silenciados e invisibilizados. Aprendi que, nesse processo, a tecnologia é uma ferramenta inclusiva importante porque não seleciona o usuário, não o classifica, só o serve. O ambiente das comunidades de tecnologia é amplo e os grupos se organizam para acolher as diversidades, protegendo-se mutuamente e fortalecendo-se a cada evento ou grupo de ensino-aprendizagem, resistindo as ações dos haters de plantão.

Nesse propósito de incluir e acolher, encontrei sintonia com um dos pilares MDI (Programa Mestre Diversidade Inclusiva): uma rede de apoio porque, ao criar diálogos saudáveis e conscientes entre os plurais, colaboramos nas ações de mudança socioemocional dos grupos, fomentamos uma rede que se enxerga e aceita ou ao menos busca romper com o status quo, atua com dados, colabora na escuta, usa a tecnologia como ferramenta e ambiente de troca, conecta projetos.

Outro pilar que o MDI fortalece é da pluralidade, buscando na abundância dos diversos, construir espaços seguros de diálogo, ideação, construção de inovação e ações colaborativas, o que gera impacto para além do espaço ocupado por essas pessoas: gera ações de mudança e abraça a sociedade como um todo, promove transformações estruturais profundas e significativas com protagonismo dos grupos de agentes da mudança.

O MDI é um desafio e um grande presente porque permite que o grupo que realmente quer fazer diferente, possa construir coletivamente soluções de impacto real, respeitando o “lugar de fala” de seus protagonistas, sem deixar ninguém para trás. Como coordenadora, estou no processo direto de construção do conteúdo, a curadoria dos materiais, captação de parceiros e dinâmicas formativas. Os momentos de conhecer as histórias, conectar diálogos e criar ações de solução coletivas são fundamentais para fortalecer a presença plural que temos no País, representada nas empresas e nos demais âmbitos sociais, porque chegar à equidade é isso: promover oportunidades desde o início da vida de cada um para o ganho de todes.

*Crédito da foto no topo: Gearstd/iStock

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