17 de setembro de 2024 - 6h00
Lembro-me de um professor que costumava contar uma história para destacar a importância de prestar atenção na aula: “Imaginem que vocês estão em uma sala de comando para o lançamento de um foguete. Tudo corre bem até que, de repente, surge um sinal vermelho na tela. Neste momento, vocês percebem que ninguém na sala está olhando para o painel. Quem deveria estar atento ao painel? E, principalmente, quem saberia o que fazer em uma situação dessas?” A imagem gerava estresse na turma, mas também trazia uma certa tranquilidade: “Ah, sempre há alguém prestando atenção.”
No entanto, hoje em dia, talvez ninguém esteja prestando atenção.
Um estudo de Gloria Mark, que pesquisa o tema da atenção na Universidade da Califórnia, mostra uma redução significativa na nossa capacidade de atenção. O tempo médio de foco caiu de 2,5 minutos, em 2003, para apenas 47 segundos, em 2019. Essa diminuição está ligada ao uso intensivo de dispositivos digitais, que proporcionam pequenas doses de dopamina, levando a constantes mudanças de foco.
Estamos vivendo a chamada era dos cortes, quando conteúdos nas redes sociais e podcasts são criados com o objetivo de gerar trechos curtos que possam viralizar e obter mais visibilidade através de estratégias de clickbaits. Esse fenômeno ganhou força durante os debates eleitorais para a prefeitura de São Paulo, trazendo à tona como os cortes ganharam importância e cresceram na esteira dos podcasts e transmissões ao vivo, aproveitando as brechas nos sistemas de monetização das redes sociais para gerar ganhos fáceis para os usuários.
Não é novidade que a atenção das pessoas se tornou um recurso escasso e valioso. A economia da atenção, conceito que descreve a crescente competição por captar e manter a atenção do público, molda a maneira como consumimos e produzimos informações. No centro desse fenômeno está a “tiktokenização” da informação, ou seja, a fragmentação de conteúdos em pequenos trechos. Esse processo tem implicações profundas, não apenas para a comunicação, mas para a educação e o desenvolvimento do pensamento crítico.
As plataformas de mídia social incentivam essa tendência ao promover conteúdos consumíveis e compartilháveis. A ideia é capturar a atenção por alguns segundos, o suficiente para gerar um like, um compartilhamento ou uma visualização. No entanto, esse modelo cria um ciclo vicioso: quanto mais breves e superficiais são os conteúdos, mais as pessoas se acostumam a eles, e mais difícil se torna a transmissão de ideias complexas.
Isso traz uma série de problemas, especialmente quando cortes de podcasts se tornam a principal fonte de informação para muitas pessoas. A formação de opiniões baseadas em fragmentos pode levar a mal-entendidos, polarização e uma visão distorcida da realidade. O resultado é uma sociedade cada vez mais desinformada e menos crítica, incapaz de engajar-se em discussões aprofundadas ou de compreender a complexidade dos temas.
Trata-se de um dilema para os profissionais de comunicação. Por um lado, manter a atenção de uma audiência acostumada a conteúdos curtos e superficiais, o que exige criatividade e inovação. Por outro, há a necessidade de não sacrificar a profundidade em prol da brevidade, buscando trazer contexto e relevância. Para enfrentar esse desafio, é necessário um esforço consciente para educar e incentivar o aprofundamento e o pensamento crítico. É o caminho para preparar a sociedade para um futuro no qual a atenção, o conhecimento e o consumo de conteúdo possam coexistir de forma equilibrada.