O Brand Pulse Report do YouTube: transparência e legalidade
A era do Marketing de Performance exige um compromisso inabalável com a transparência e a legalidade
Com a evolução da IA e a maior quantidade de dados disponíveis, acompanhamos o surgimento de ferramentas que trazem a promessa da verdadeira revolução no cenário do marketing digital.
Exemplo marcante foi o lançamento do Brand Pulse Report do YouTube em outubro, que traz a promessa de medir o verdadeiro impacto de marca com o fornecimento de insights vitais para otimização do ROI e o refinamento do funil de vendas. No entanto, a análise da ferramenta nos leva ao seguinte questionamento legal:
Quando utilizamos relatórios que medem a percepção e o comportamento humano, estamos consumindo dados de mercado ou conduzindo uma pesquisa com seres humanos sujeita à análise do Sistema Nacional de Ética em Pesquisa com Seres Humanos?
Para responder essa questão, é imperioso apontar que o Brand Pulse Report baseia-se em pesquisas realizadas com grupos de usuários objetivando medir mudanças na percepção da marca, basicamente avaliando a eficácia de um procedimento de comunicação.
Segundo o Canaltech, “a solução usa inteligência artificial multimodal para medir o alcance e o impacto de vídeos tanto orgânicos quanto patrocinados”. Ainda que não aparente exigir a submissão a um Comitê de Ética de Pesquisa (CEP), a ferramenta poderia enquadrar-se legalmente na Lei nº 14.874/2024, que define de forma ampla em seu art. 2º “pesquisa com seres humanos” como a pesquisa que, individual ou coletivamente, tem como participante o ser humano, em sua totalidade ou em parte, e o envolve de forma direta ou indireta, incluído o manejo de seus dados, informações ou material biológico.
Ou seja, dependendo de como a marca utiliza esse relatório e se ela cruza tais informações com outras bases de dados, pode ser enquadrada, ainda que com probabilidade remota. Mesmo que o uso passivo do relatório apresente baixo risco, maior atenção deve ser dada ao seu uso ativo: quando a agência ou o cliente cruza as informações com dados próprios, ou quando o estudo é suficientemente complexo para ser considerado pesquisa experimental.
Ainda que o uso do Brand Pulse não exija o aval de um CEP, certamente precisa de um respaldo sólido na LGPD. Não basta ter a métrica, é preciso justificar legalmente seu uso.
Primeiramente, o tratamento dos dados do usuário para finalidade específica de medir brand lift deve estar previsto e justificado, prezando pela transparência. Ademais é necessário auditar processos internos para que evite-se o cruzamento de bases de dados, uma vez que há risco de reidentificação do titular. Por fim, deve-se ler os contratos e os termos de uso de tais ferramentas, atentando-se a pontos como definição de responsabilidades e papéis.
A era do Marketing de Performance exige um compromisso inabalável com a transparência e a legalidade. O Brand Pulse Report e ferramentas similares oferecem um ROI de conhecimento inestimável, mas sua utilização deve ser acompanhada de uma suporte legal robusto, de maneira a blindar a reputação da marca. Entender a sinergia entre a conformidade legal e o valor da marca representa estar preparado para a próxima fase do Marketing Digital.
Patricia Peck, PhD. Advogada especialista em Direito Digital com 25 anos de atuação, CEO e sócia fundadora do Peck Advogados. Membro titular do Comitê Nacional de Cibersegurança (CNCiber), membro titular do Comitê Nacional de Proteção de Dados do CNJ. Head de Políticas Públicas do Instituto Norberto Bobbio. Presidente do Instituto Peck de Cidadania Digital. Autora de 55 livros sobre o tema.