Opinião

Velhas? Não estamos velhas para nada

Ao ignorar profissionais maduras, o mercado deixa de acessar repertórios profundos e habilidades de décadas

Flávia Campos

CSO da Magenta 29 de julho de 2025 - 10h49

 

Como especialistas em comunicação, precisamos urgentemente fazer o rebranding da palavra “envelhecer”. Porque o melhor que pode acontecer com a gente é exatamente isso: envelhecer. A outra opção não nos interessa. Num mundo que celebra a longevidade como uma das maiores conquistas da atualidade, o etarismo revela um contrassenso cultural, institucional e de mercado.

Como é que o mesmo mundo que começa a exaltar a economia prateada segue decidindo, sem hesitar, que mulheres com mais de 45 anos não servem mais? Vivemos um paradoxo: enquanto a expectativa de vida cresce e a medicina amplia o tempo de vida ativa, muitas organizações ainda operam com critérios que desconsideram esse novo ciclo de potência profissional.

Segundo pesquisa da Amarelo com o Coletivo 45+, 64% das mulheres brasileiras com 50 anos ou mais relatam dificuldade de contratação. Ainda segundo o levantamento, 77% delas são responsáveis total ou parcialmente pela renda familiar. No mercado de comunicação, apenas 5% dos profissionais nas agências de publicidade têm mais de 50 anos, e 70% dos criativos nunca receberam um briefing voltado a esse público.

Nos Estados Unidos, um relatório do Center for Workforce Inclusion estima que o impacto econômico do etarismo chegue a US$ 850 bilhões por ano. O número ajuda a dimensionar que estamos deixando de aproveitar não só em performance, mas em inteligência de mercado.

Aos 45 ou 50, muitas mulheres começam a desaparecer do radar das oportunidades.

Do casting, do feed, do convite, da conversa. Não há um anúncio oficial, mas o silêncio comunica.

Essa invisibilidade é construída. É consequência de decisões que associam juventude a inovação — e maturidade a obsolescência.

Enquanto o mercado formal resiste, as mulheres maduras se movimentam. De acordo com a pesquisa da Maturi com a Noz Inteligência, realizada com mais de 2 mil mulheres entre 43 e 82 anos, 70% estão em transição de carreira. 55% desejam atuar como freelancers, consultoras ou autônomas, e 38% querem empreender. Não estão se retirando do mercado. Estão reposicionando sua atuação. E com resultados consistentes.

Segundo a Entrepreneur Magazine, Joanna Strober fundou a Midi Health aos 56 anos e captou US$ 100 milhões em investimento. Julie Bornstein criou a Daydream aos 54, com aporte de US$ 50 milhões. Sara Schiller e Karen Robinovitz, com 52 e 54 anos, construíram um negócio multimilionário a partir da reinvenção pessoal. Esses casos não são exceções. São indicadores de um novo ciclo. E as empresas que se abrem a esse ciclo colhem os benefícios.

Estudos da McKinsey e do BCG mostram que empresas com diversidade de gênero na liderança são 25% mais lucrativas, e aquelas com diversidade etária geram 19% mais receita com inovação.

Ao ignorar profissionais maduras, o mercado deixa de acessar repertórios profundos, redes sólidas e capacidades desenvolvidas ao longo de décadas. É como investir em programas de liderança quando se poderia integrar quem já liderou na prática. Etarismo, nesse contexto, não é só um viés, é um erro estratégico.

É importante também reconhecer que o etarismo não afeta todas da mesma forma. Mulheres negras, periféricas ou fora dos grandes centros enfrentam múltiplas barreiras. Qualquer resposta consistente a essa pauta precisa considerar essas interseccionalidades.

Estamos no centro da mudança. Não como exceção, mas como referência.

A chamada revolução prateada já aparece nos dados, nas tendências, nas primeiras políticas públicas e corporativas. Agora, ela precisa sair dos relatórios e entrar nas estruturas.

Virar cultura, decisão, prioridade — e não apenas tema de evento. E isso só vai acontecer se a gente seguir aqui: visível, presente, atuante.

Envelhecer é continuar.

Com mais clareza, mais autonomia, mais propósito.

É exatamente isso que estamos fazendo, sem a menor intenção de parar.