Desconforto como convite
No trabalho e na vida, o desafio já não é saber — é continuar aprendendo

(Crédito: Shutterstock)
No início, era a força física. Quem levantava mais peso, colhia mais. E isso bastava. Depois veio a era das máquinas, e quem dominava as engrenagens virou o dono do tempo. Agora, estamos em um momento curioso: as máquinas trabalham por nós, e ainda assim estamos bem… angustiados.
Por quê? Bem, praticamente todos os dias temos algo novo da tecnologia para aprender e incorporar. Rapidamente.
Vivemos uma transformação tecnológica sem precedentes. Se será uma revolução, só o tempo dirá. O que sabemos é que o valor de uma pessoa no mercado não depende mais da força ou da repetição, mas do que ela consegue aprender — e reaprender.
Curiosidade, para mim, é a palavra-chave. Como motor, a fome de aprender. Porque, neste ritmo de mudança, o mindset de aprendizado contínuo deixou de ser diferencial e virou questão de sobrevivência.
Antes, as grandes transformações levavam séculos. Agora, mal terminamos de nos adaptar e há algo novo. Eu, na casa dos 50 anos e com 30 de carreira, sinto isso na pele. Surgem termos, ferramentas, siglas, e percebo que ainda não domino algumas. No começo, dá um certo desespero. Depois, respiro. Porque percebo que esse desconforto é um convite.
Descobri que há um poder em admitir o que não sei. É libertador. Quase todo mundo sente o mesmo, só que poucos assumem.
A tecnologia está no centro disso tudo. Criar textos, vídeos, apresentações, fazer pesquisas por voz e gerar imagens do zero já é parte da rotina de muitos de nós. Uso ferramentas como o Galaxy AI e Circule para pesquisar o tempo todo, assim como pergunto bastante ao Gemini. Elas ajudam a começar e são facílimas de usar. Não substituem a ideia, mas aceleram o passo. Nos briefings com agências, então, são uma mão na roda. Mesmo com bons textos, cada um imagina uma coisa. Com um esboço ou uma imagem inicial, a conversa ganha clareza. E é divertido. Porque, de repente, estamos cocriando com a máquina.
Agora, estou me aventurando nos agentes pessoais. Confesso, ainda bem no início. Mas é fascinante imaginar o que vem por aí. Em poucos anos, teremos assistentes digitais renovando passaporte, pagando contas, planejando viagens. Aquilo que parecia ficção científica virou rascunho do cotidiano.
No ambiente de trabalho, temos alguns agentes em ação, seja para operacionalizar mídia, trazendo velocidade, reduzindo erros ou aumentando eficiência de forma geral, porque os aprendizados do passado são incorporados e facilmente reaplicados pelos agentes.
Agora dispomos também de um agente capaz de analisar de forma muito mais ampla o trabalho de influenciadores, combinando análises qualitativas e quantitativas, algo que antes exigiria equipes inteiras com foco no operacional. Mas isso não eliminou funções; ao contrário, abriu novas frentes, porque esses aprendizados agora serão usados para treinar nossos influenciadores, exigindo mais braços e mentes humanas para colocar tudo em prática.
O que mais me chama atenção é um movimento duplo: nunca se discutiu tanto o valor de competências comportamentais como empatia, comunicação e criatividade, e, ao mesmo tempo, vemos uma retomada clara da importância das habilidades técnicas. Relatórios internacionais recentes indicam que uma parte significativa do que consideramos competências essenciais no trabalho hoje deve passar por mudanças até 2030, com os empregadores projetando transformações em cerca de quatro em cada dez habilidades necessárias no dia a dia profissional.
Esses levantamentos também apontam para o avanço acelerado do letramento digital, que desponta como uma das capacidades com maior crescimento previsto nos próximos anos, integrando o grupo das competências consideradas cruciais até o fim da década. E isso tem uma razão simples. Compreender tecnologia, hoje, é compreender como ela molda decisões, comportamentos e expectativas. Da mesma forma, entender pessoas exige reconhecer o impacto dos sistemas digitais na forma como interagimos, trabalhamos e aprendemos. Por isso, o técnico e o humano deixaram de ser caminhos paralelos. Um depende do outro.
Além disso, embora exista preocupação com o impacto da inteligência artificial, os mesmos estudos mostram que grande parte das habilidades humanas segue com baixa probabilidade de ser automatizada. A tecnologia não chega para substituir, mas para provocar, ampliar fronteiras e exigir novas formas de atuação.
Gosto de pensar que estamos aprendendo a conviver com ela. A sair do lugar do “usuário” e ocupar o papel de parceiro. Já é quase um consenso: independentemente do setor, todas as empresas caminham para se tornarem empresas de tecnologia. Fintech, edtech, agrotech — tudo virou tech. E nós? Precisamos virar aprendizes permanentes. Não acho que isso dependa só de cursos ou certificados. Aprender, hoje, é um estado de espírito. É o inconformismo de quem se recusa a parar. É olhar para o desconhecido e dizer: “ok, me ensina.”
A palestra da Michelle Schneider, autora do livro O profissional do futuro: Como se preparar para o mercado de trabalho na era da IA, que assisti recentemente, me fez pensar muito sobre isso. Sobre como todos estamos tateando o novo, tentando equilibrar o ritmo e a ansiedade. Essa conversa me inspirou a escrever este texto e reforçou uma ideia simples: não se apavore, navegue.
O tempo encurtou. A revolução não espera e dá medo. Mas o desconforto não precisa ser inimigo, pode ser bússola.