Opinião

A mobilidade da comunicação

A essa altura do campeonato, faz pouca diferença entender a origem da informação

Juliana Barreto

Gerente de Comunicação, Marketing e Sustentabilidade da SuperVia 18 de abril de 2023 - 11h00

(Créditos: Shutterstock)

Há alguns dias, viralizou na internet o vídeo que mostrava um jovem, no interior de um trem, no Rio de Janeiro, cantando um ponto de Exu, enquanto um pastor fazia sua pregação evangélica. O que seria apenas mais uma cena do cotidiano de uma grande cidade, rapidamente ganhou corpo nas redes sociais. Poucas horas depois ocupava o noticiário local, chegando a alcançar veículos de outros estados.

Um episódio que ensina muito sobre a comunicação em operações de mobilidade urbana de alta complexidade. O dia a dia no transporte público está sempre na pauta da mídia local das grandes cidades. O deslocamento de pessoas a caminho ou na volta do trabalho desperta o interesse dos veículos de comunicação pela necessidade de oferecer a ouvintes, telespectadores ou leitores um serviço que faz a diferença na vida da maioria das pessoas.

Mais do que isso: como agregadores de milhares de pessoas, os meios de transporte também funcionam como espelho do que acontece em uma grande cidade. Do abandono de animais à pregação religiosa (esta, por sinal, proibida no Rio de Janeiro, por determinação judicial), os fatos se sucedem sete dias por semana, 365 dias por ano.

Parodiando uma frase que ficou famosa no filme “Se beber, não case”, cada vez menos o que acontece no transporte público fica no transporte público. O celular torna passageiros em potenciais produtores de conteúdo – e abre a oportunidade de a mídia tradicional ter acesso a informações na velocidade da internet.

No Brasil, um estudo de 2022 do Reuters Institute apontou que o YouTube, citado por 43% dos entrevistados, é a rede social mais usada para consumir notícias e informação, seguido do WhatsAPP, por 41%; do Facebook, por 40%; do Instagram, por 35%, do Twitter, por 13%. O Tiktok – onde o vídeo do rapaz apareceu pela primeira vez – foi citado por 12%. Não há estimativas sobre qual volume desse conteúdo é orgânico e espontâneo, ou seja, não foi produzido pela mídia tradicional.

A essa altura do campeonato, faz pouca diferença entender a origem da informação. Quando sai das plataformas e redes sociais e alcança um veículo de massa, como sites, jornais e emissoras de rádio e televisão, o conteúdo produzido por um passageiro se torna, imediatamente, uma notícia. E precisa ser tratado como tal.

Em geral, esse conteúdo tem um tom crítico e exige respostas rápidas, precisas e transparentes. Há outro porém nessa história. Por conta da necessidade de informar rapidamente ao seu público, é natural que a mídia local abrace notícias que chegam de fontes diversas – ainda mais quando estão na forma de fotos ou vídeos. Sem curadoria, o conteúdo vai ao ar do jeito que chegou. E as empresas que ficam no alvo das críticas devem apenas responder com uma nota?

A nota é imprescindível, mas não pode funcionar como única estratégia. Estreitar laços com a mídia local, permite estabelecer uma relação de parceria que funcione como um jogo de ganha-ganha. A palavra “parceria” pode assustar, mas já passou da hora de deixar de lado o entendimento da comunicação entre uma empresa – independente de sua natureza – e a imprensa como uma disputa em que um dos lados precisa prevalecer.

Um bom exemplo de como estreitar laços se dá quando jornalistas são convidados a conhecer a operação por dentro. Saber mais sobre a logística envolvida no sistema; ouvir os profissionais que enfrentam de condições climáticas a atos de vandalismo no exercício de suas funções; conhecer a tecnologia por trás das máquinas, amplia a visão do conjunto e fornece mais elementos para quem trabalha com informação. A mobilidade urbana ainda é um tema novo, que só agora começa a despertar a atenção da sociedade como um todo. Nada mais natural, que as empresas tracem um
panorama detalhada desse segmento tão desafiador. Cabe lembrar que transporte público coletivo permite que milhões de brasileiros, todos os dias, estudem, trabalhem, tenham atendimento médico, façam esportes ou curtam momentos de lazer.

E que ainda produzam um conteúdo valioso. Tanto para os usuários, quanto para a mídia ou as empresas. É só uma questão de botar todos no mesmo trilho.