Opinião

Publicidade e as legislações que regem o mercado brasileiro

Conheça as leis que regulam e organizam o ecossistema de publicidade no País

Paulo Gomes

Consultor jurídico do Espaço de Articulação Coletiva do Ecossistema Publicitário - Abap e titular do escritório Paulo Gomes de Oliveira Filho Advogados Associados 25 de julho de 2025 - 18h06

A indústria da publicidade no Brasil envolve todo um ecossistema de comunicação, que é muito dinâmico e vem se transformando com o tempo. Este ecossistema influencia e é influenciado por diversos aspectos da sociedade, e um dos fatores que define sua atuação é a legislação brasileira.

Para além de uma simples relação de regulação, a interação entre nosso setor e o Estado é fundamental para garantir a ética nas práticas de comunicação e publicidade, a proteção dos consumidores e a promoção de um ambiente de negócios justo e mais seguro. Nesse sentido, ao longo da nossa história tivemos a criação de várias leis e normas que foram essenciais para isso.

O início desta jornada relacionada à legislação e à autorregulação da publicidade brasileira ocorreu em 1957, com a aprovação do Código de Ética dos Profissionais de Propaganda. E desde este marco, vem se desenvolvendo um complexo, mas bem estruturado sistema combinado de leis, códigos de conduta e melhores práticas que asseguram a propaganda realizada no país. Revisitar esta história é fundamental para compreendermos o caminho percorrido até os desafios atuais, além de termos as experiências e processos vividos como base para diversos dos debates que são feitos hoje.

 

A criação do Código de Ética dos Profissionais de Propaganda

Na década de 1950, a profissionalização do mercado publicitário brasileiro ganhou força, influenciada por agências internacionais que trouxeram modelos de publicidade mais avançados. Nesse cenário, surgiu a necessidade de criar uma estrutura de autorregulamentação que pudesse garantir que as práticas publicitárias estivessem alinhadas com princípios éticos e que respeitassem o público.

O Código de Ética dos Profissionais de Propaganda cumpriu e cumpre este papel, e é um documento orientador do comportamento ético-profissional a ser seguido por quem atua com publicidade em agências, veículos e anunciantes. Ao longo do tempo, foram propostas atualizações para acompanhar mudanças tecnológicas e culturais, como o surgimento da internet e das mídias sociais, que trouxeram novos desafios éticos para o mercado.

Em 2014, o Código passou por uma revisão, que foi lançada pela Associação dos Profissionais de Propaganda (APP), após um profundo trabalho de discussão junto a diversas entidades do setor.

 

A Constituição Federal: legislação e normas para a publicidade brasileira

A Constituição Federal traz uma série de dispositivos que são relevantes para o exercício da atividade publicitária. Dentre eles se destacam os pontos relacionados às liberdades de comunicação, manifestação de pensamento, expressão e informação, assim como o direito do consumidor e o capítulo acerca da comunicação social.

No que diz respeito à liberdade de comunicação, a Constituição Federal estabelece um conjunto de direitos (art. 5, IV, V, IX, XII, XIV combinado com os artigos 220 a 224) que possibilitam a coordenação entre criação, expressão e difusão do pensamento e da criação.

Neste conjunto, estão incluídos a liberdade de manifestação de pensamento (art. 5º, IV), a liberdade de expressão (art. 5º, IX) e a liberdade de informação. Desses dispositivos, decorre, por exemplo, a existência da proibição à censura. No entanto, a liberdade de expressão comercial também pode ser entendida como consequência da livre-iniciativa e da livre concorrência (artigos 1º e 170, caput e IV da Constituição), já que a publicidade representa também uma dimensão econômica das atividades das empresas no mercado.

 

O Direito do Consumidor

O direito do consumidor foi incluído pela Constituição no rol dos direitos fundamentais, por meio do art. 5º, XXXII. Ademais, o art. 170, V, eleva a defesa dos consumidores à condição de princípio da ordem econômica. Diante disso, abre-se espaço para que a legislação infraconstitucional assegure a proteção ao consumidor. Esse papel é desempenhado principalmente pelo Código de Defesa do Consumidor.

No campo da publicidade, vale lembrar que, além das áreas de atuação do Fórum da Autorregulação do Mercado Publicitário (Cenp), há a exigência de que a publicidade siga diretrizes específicas, evitando práticas enganosas ou abusivas, consideradas ilícitas pelo Código de Defesa do Consumidor. Enquanto o Cenp complementa a legislação nas relações ético-comerciais, o Conar, por meio do Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária (CBAP), reforça as normas constitucionais sobre o conteúdo e a forma da publicidade, alinhando-se também ao Código de Defesa do Consumidor.

 

Capítulo “Da comunicação social” (Artigos 220 a 224)

Ao tratar da ordem constitucional da atividade publicitária cultural, a Constituição Federal traz dispositivos relevantes no capítulo “Da comunicação social” (artigos 220 a 224). Esses artigos formam a base da regulamentação da comunicação social no Brasil, equilibrando a liberdade de expressão com a necessidade de proteção dos direitos sociais e culturais.

De maneira geral, o capítulo reconhece o papel fundamental da mídia na democracia e busca garantir que ela atue de maneira ética, promovendo a pluralidade, a diversidade cultural, a informação de qualidade e a responsabilidade perante a sociedade. Esses dispositivos também oferecem uma base para legislações específicas que regulamentam a mídia e a publicidade no país, como o CBAP e o Código de Defesa do Consumidor (CDC).

 

Lei Federal nº 4.680/1965: a Lei da Publicidade

Essa é uma das legislações mais importantes para o mercado publicitário brasileiro. Promulgada em 18 de junho de 1965, essa lei regulamenta o exercício da profissão publicitária e estabelece normas para a veiculação de propaganda no Brasil. Seu objetivo é organizar e regular o mercado de publicidade, garantindo práticas éticas e justas entre anunciantes, agências de publicidade e veículos de comunicação.

Entre os principais pontos que a legislação abrange, estão as definições que tratam do que caracteriza a profissão de publicitário e de agenciador de propaganda, estabelecendo os requisitos para o exercício dessas atividades. Ela diferencia as funções de agências, anunciantes e veículos, estabelecendo um entendimento claro de cada papel no processo publicitário. Este é um pilar fundamental para o funcionamento do nosso mercado, e que impactou diretamente na criação do nosso modelo único de agência, reconhecido e respeitado no mundo todo.

Um dos pontos centrais da lei é a determinação de que apenas agências de propaganda registradas podem intermediar anúncios publicitários. Essa exclusividade visa profissionalizar o mercado e garantir que apenas empresas qualificadas atuem como intermediárias entre anunciantes e veículos de comunicação.

Um outro ponto de destaque da legislação é o estabelecimento das bases para o pagamento de comissões às agências de publicidade. As agências têm direito a uma comissão paga pelos veículos de comunicação (em geral, de 20% sobre o valor da mídia). Esse sistema de remuneração foi instituído para garantir que as agências possam se sustentar de forma justa e evitar práticas predatórias.

Embora o foco principal da lei seja a organização do mercado e não a proteção direta ao consumidor, ela foi uma base ética importante para o desenvolvimento posterior do CDC, que trouxe proteções mais específicas contra publicidade abusiva e enganosa.

O efeito também foi parecido em relação à autorregulamentação publicitária, pois apesar de a Lei nº 4.680/1965 não criar diretamente um órgão de fiscalização, ela abriu espaço para o que, anos depois, em 1980, levou à criação do Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária (Conar). A instituição surgiu como uma resposta às necessidades do setor de se autorregular, aplicando normas éticas complementares às leis existentes.

 

Lei N° 12.232, de 29 de abril de 2010

A Lei Nº 12.232/10 estabelece normas gerais aplicáveis para a contratação de serviços de publicidade pelos órgãos e entidades da administração pública no Brasil. Antes de sua criação, havia certa lacuna legal, o que gerava insegurança jurídica e permitia brechas para práticas questionáveis.

A lei visa dar transparência, eficiência e justiça às contratações de publicidade realizadas por órgãos públicos, incluindo todas as esferas (federal, estadual e municipal) e poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). Ela busca garantir que esses processos de contratação sejam feitos com critérios técnicos e transparentes, coibindo práticas irregulares e favorecimentos.

Nesse sentido, ela é fundamental para o mercado de publicidade no setor público, pois estabelece um processo justo, competitivo e transparente para a contratação de campanhas publicitárias pagas com recursos públicos.

A disciplina prevista para os procedimentos licitatórios indica que deverão ser necessariamente de tipo “melhor técnica” ou “técnica e preço”, não podendo ser de tipo “menor preço”. Isso significa que as agências de publicidade são avaliadas não só pelo custo, mas também pela qualidade de suas propostas.

Além disso, a lei exige que os editais especifiquem critérios para a proposta de preço que sejam adequados às formas de remuneração comuns no mercado publicitário (art. 6º, V). A legislação também define como os serviços devem ser prestados pelas agências de publicidade, os controles que devem ser realizados e os tipos de subcontratações que são permitidos, garantindo que todos os processos sejam transparentes e sigam as normas do setor.

De maneira geral, a lei fortalece a relação entre o setor público e as agências, ao mesmo tempo em que valoriza a profissionalização do mercado com normas claras que melhoram a previsibilidade dos contratos e o planejamento das ações de comunicação.

 

Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD)

A Constituição já garantia a inviolabilidade da privacidade, que se aplica ao uso de dados pessoais em campanhas publicitárias, promovendo um equilíbrio entre o uso comercial e a proteção dos dados dos cidadãos. No entanto, a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD), Lei n. 13.709, sancionada em 2018, trata mais profundamente da questão.

O desenvolvimento da legislação foi através de muito debate, tendo como base as regras da  General Data Protection Regulation (GDPR), normas de proteção de dados válidas na União Europeia. Após sua aprovação, em 2018, o governo estabeleceu um prazo para que as empresas pudessem adequar seus processos de tratamento de informações. Por isso, a vigência teve início apenas em 2020.

A LGPD trouxe mudanças relevantes para o mercado publicitário no Brasil, com impacto direto em como as empresas capturam, armazenam, processam e utilizam dados pessoais em campanhas de marketing e publicidade digital. Alguns dos objetivos principais são: padronizar o gerenciamento de dados pessoais; estabelecer normas para o tratamento de dados; ampliar a segurança da gestão de dados nas empresas e garantir o direito à proteção e à privacidade de informações pessoais.

Embora isso tenha trazido desafios para estratégias das campanhas, também incentivou o mercado a inovar e a valorizar ainda mais o relacionamento com o consumidor. Além de aumentar a transparência e fortalecer a confiança do público, a LGPD também abriu espaço para práticas publicitárias mais éticas e responsáveis no Br

Concluindo, as legislações são fundamentais para garantir práticas éticas, transparência e respeito aos direitos do consumidor. Essas normas asseguram que o relacionamento entre marcas e público se dê de maneira responsável e equilibrada. Leis como a LGPD, o Código de Defesa do Consumidor e o Código de Autorregulamentação Publicitária do Conar, entre outras, desempenham um papel essencial para preservar a confiança na publicidade e incentivar uma comunicação que respeite a privacidade, a veracidade e o bem-estar dos consumidores.

O compromisso com a conformidade legal não apenas protege o consumidor, mas também valoriza o trabalho das empresas e profissionais do nosso ecossistema, fortalecendo uma indústria relevante para a economia brasileira e respaldando um modelo de agência único e admirado no mundo todo.