Opinião

O CPM pode matar a inteligência no marketing de influência?

Quando uma marca avalia um influenciador como inventário de mídia, ela ignora o verdadeiro ativo em jogo

Thiago Bispo

Vice-presidente de negócios da BR Media 10 de setembro de 2025 - 6h00

Recentemente, estive em um evento do mercado publicitário trocando e ouvindo CMOs de marcas importantes e CEOs de agências relevantes.

Em um dado momento a conversa enveredou para o fato de que o nosso mercado é obcecado por métricas e eficiência. E entramos na minha atual indústria – como muitas marcas têm aplicado ao marketing de influência a mesma régua usada na compra de mídia tradicional: o CPM (custo por mil impressões).

A lógica parece tentadora — afinal, se conseguimos comprar alcance com precisão cirúrgica no digital, por que não fazer o mesmo com creators?

Aí, aqui entro com a minha reflexão – para mim, essa abordagem, que pode parecer eficiente no papel, é na prática reducionista e contraproducente.

Quando uma marca avalia um criador de conteúdo como se fosse apenas mais um inventário de mídia, ela está ignorando o verdadeiro ativo em jogo: a confiança da audiência, a construção cultural, o acesso a comunidades que esse creator pode trazer pra marca.

Mas vou elaborar mais – CPM é uma métrica útil no mundo da mídia paga. Ele ajuda a estimar quanto se está pagando para alcançar mil pessoas com determinado conteúdo. Mas quando levado para o universo dos influenciadores, esse número perde contexto, profundidade e relevância.

Um vídeo de um creator com 200 mil views pode gerar mais impacto, lembrança e consideração do que uma campanha com 2 milhões de impressões num conteúdo sem alma. A diferença? Storytelling, legitimidade e conexão — ativos intangíveis que não cabem numa planilha de compra programática.

A lógica pura e simplista do CPM empurra o mercado para relações transacionais, curtas e rasas. Ela incentiva marcas a escolherem influenciadores com o menor custo por mil, o que frequentemente significa um possível empobrecimento e pouca ou quase nenhuma atenção a curadoria dessa escolha.

Isso destrói o que existe de mais valioso no marketing de influência: a capacidade de gerar identificação genuína e conversas relevantes em microcomunidades.

Fora que, isso crescendo, gera no mercado mais um processo de uniformização do processo criativo. Criadores começam a produzir conteúdos apenas para “bater meta”, em vez de contar histórias que importam. O resultado é uma publicidade previsível, entediante e, pior, ineficaz.

Dito tudo isso, vamos ao que foi o ponto central nesse evento que eu estava – “Ah , mas hoje em dia é o CFO que manda nas Cias. E os Diretores de marketing precisam justificar os investimentos com números concretos, precisam mostrar ROI, etc etc…”

Isso aqui dá pano pra outros textos, mas vou me apegar apenas ao ponto deste que é o da mensuração das estratégias de influenciadores.

Sim, é verdade. Mas tente falar a língua do seu CFO, sem perder a alma do Creator. Explico – tente trazer os números que comprovem, mas sem precisar matar a criatividade ou a essência.

Como? Construindo modelos que misturam eficiência de mídia com ativos de marca. Assim, o diretor de marketing deixa de ser um defensor “emocional” dos creators e passa a ser um gestor de valor estratégico. Especialmente quando disputam orçamento com mídia paga, trade ou CRM.

É possível construir modelos numéricos sólidos para creators, sem cair na armadilha do CPM cego.

Nos Estados Unidos e no Reino Unido, marcas como Estée Lauder e Unilever vêm adotando modelos híbridos. Usam CPM apenas quando estão impulsionando conteúdos de influenciadores com mídia paga.

Mas quando se trata de colaborações orgânicas, o foco é outro: engajamento real, brand lift e alinhamento cultural.

Na China, onde a lógica de performance é levada ao extremo, o CPM praticamente desaparece. No lugar, o que importa é quanto o influencer gera em vendas diretas.

Em vez de se apoiar apenas no CPM, crie um mix de referências — custo por engajamento; Earned Media Value (Valor estimado da mídia espontânea gerada); Projete ROI com base em funis paralelos — crie um funil específico para o marketing de influência, separado do de mídia; Atribua valor à camada de Brand Lift; Crie um dashboard de Creator Equity, etc…

O futuro do marketing de influência não está em pagar por impressões, mas em co-construir relevância. As marcas mais inovadoras estão tratando os criadores como sócios criativos, desenvolvendo com eles narrativas de longo prazo, cocriando produtos, campanhas e até canais proprietários de distribuição.

Se você trata um influenciador como inventário, ele vai te entregar performance. Mas se você o trata como parceiro estratégico, ele pode te entregar cultura, inovação e construção de marca.

No final do dia, o marketing de influência bem feito não se compra por mil impressões — ele se conquista com mil conexões reais.