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Mentira convincente ou verdade desnuda

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Opinião

Mentira convincente ou verdade desnuda

Algumas das lições do debate entre Joe Biden e Donald Trump, nos Estados Unidos


4 de julho de 2024 - 6h00

O que você prefere: um mentiroso que convence ou um velho fracote?

Fiquei assustada ao ouvir essa frase em um almoço, na mesa ao lado, num restaurante badalado no Leblon. Estavam se referindo ao desempenho de Joe Biden e Donald Trump durante o primeiro debate presidencial, na noite anterior, na CNN. O debate ganhou o centro das conversas.

“Não me lembro de um momento mais doloroso na política da campanha presidencial americana na minha vida”, disse o jornalista Thomas Friedman. Ele foi certeiro em sua análise no The New York Times: “Joe Biden, um bom homem e um bom presidente, não tem nada que se candidatar à reeleição. E Donald Trump, um homem malicioso e um presidente mesquinho, não aprendeu nada e não esqueceu nada. É a mesma mangueira de fogo de mentiras que sempre foi, obcecado com as suas queixas – nada perto do que será necessário para a América liderar no século XXI.”

Debates públicos e discursos são meios fundamentais para um líder se posicionar, mostrando não apenas conhecimento geral e visão de mundo, mas também a capacidade de articular ideias, persuadir e influenciar opiniões e comportamentos.

A neurociência confirma que 80% da percepção do outro é formada pela maneira com que as pessoas se expressam, de forma verbal e pela linguagem corporal. E o cérebro não faz distinção entre verdadeiro e falso. Ele precisa de significação para os estímulos que recebe desse conjunto de simbologias expressas pelos comportamentos.

O impacto do debate presidencial na percepção do público demonstra que devemos começar a pensar a pós-verdade na era da informação. Sabemos que existe uma tendência de privilegiarmos narrativas que corroboram nossas convicções e valores.

Precisamos de uma vacina informacional para interromper o fluxo das fake news, como defende o brilhante neurocientista brasileiro Miguel Nicolelis, em meu livro Muito além do Media Training, o porta-voz na era da hiperconexão: “O cérebro é mais propenso ao que é falso. Precisamos que se transmita a verdade com o mesmo impacto que as fake news atuam”.

Curioso perceber que no atual momento que vivemos, em que verdade e mentira coabitam sem distinção, o foco das discussões de hoje seja a expressão de fraqueza de Joe Biden.

Ele estava abalado, gripado, gaguejou e pareceu até perder o raciocínio diversas vezes ao responder aos jornalistas, fazendo valer a percepção de fraqueza, falta de clareza e vigor, aumentando as dúvidas e a desconfiança em sua capacidade de mobilizar o apoio que pode ser decisivo nas urnas.

Donald Trump, ao contrário, mesmo com uma condenação nas costas e correndo o risco de ser preso a qualquer momento, estava cheio de energia e confiança. Valeu-se da mesma técnica dos debates de 2016 e 2020: a repetição de informações falsas, com tom irônico e a negação da acusação dos crimes que responde.

Em uma autocrítica, o democrata admitiu suas limitações com a idade, mas não deu mínimos sinais de desistência. Diante da fraca performance na CNN, o balcão de apostas de substitutos ao seu lugar na disputa presidencial ganhou força, e vários nomes surgiram nas horas subsequentes aos debate. A pressão só aumenta.

Pesa também na análise a comparação de Biden com o seu antecessor, Barack Obama, um líder que é a expressão nítida da comunicação potente e assertiva.

No filme O Discurso do Rei, George VI superou seus desafios de fala para inspirar uma nação, demonstrando que a forma como as mensagens são entregues pode ser tão impactante quanto o conteúdo.

O contexto ali era de guerra. Os tempos atuais também.

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