O futuro está sensível, emotivo e empático
O que o Salão do Móvel de Milão nos ensinou na edição deste ano é que esse futuro não será apenas conectado, mas afetivamente responsivo
O que o Salão do Móvel de Milão nos ensinou na edição deste ano é que esse futuro não será apenas conectado, mas afetivamente responsivo
Para quem é apaixonado por design, o Salão do Móvel de Milão é o equivalente ao Santo Graal dos eventos dedicados ao tema. Em 2025, o evento não decepcionou – ao contrário, provocou. As instalações ofereciam um vislumbre inédito do futuro, no qual tecnologia e decoração se aproximam, cada vez mais, daquilo que nos torna humanos. O tema central, Thought for Humans, foi um convite à empatia, mostrando que a digitalização não deve ser um fim em si, mas um meio para algo mais sensível e intuitivo. Talvez a expressão que melhor sintetize esse movimento seja automação emocional: a capacidade de objetos e sistemas entenderem não apenas o que fazemos, mas como nos sentimos ao fazer.
Este ano, a feira trouxe exemplos poderosos dessa transição. Uma das instalações mais comentadas foi a do designer holandês Daan Roosegaarde, que criou um espaço imersivo no qual luzes e sons mudavam sutilmente conforme a respiração dos visitantes – uma coreografia entre corpo e ambiente. Outra provocação veio da italiana Cristina Celestino, que apresentou móveis com tecidos que reagem à temperatura corporal, criando uma experiência tátil sensorialmente empática. Já os japoneses da Nendo trouxeram peças que mudam de forma com estímulos sonoros. Tudo isso confirma que a estética do futuro não será apenas sobre ver, mas sobre sentir-se visto.
A automação emocional vai além da personalização baseada em rotina. Significa criar tecnologias capazes de interpretar nossos humores sutis do dia a dia. Expressões faciais, o tom da voz, a escolha de palavras ou até mesmo o silêncio — tudo isso pode dizer mais sobre nós do que um comando direto. A inteligência artificial (IA) está aprendendo a ouvir, mesmo quando não falamos. A indústria tem investido em soluções para tornar isso uma realidade cada vez mais presente. Hoje, nossas TVs, geladeiras, sistemas de som e diversos outros produtos não apenas se conectam entre si, mas já reconhecem padrões, ambientes e, em algum nível, poderão em breve captar estados emocionais para se adaptar a cada momento.
Em algumas Smart TVs modernas, por exemplo, a tecnologia da tela cria uma experiência visual capaz de harmonizar a iluminação e o clima do espaço, promovendo a sensação de relaxamento ou foco, dependendo do contexto. Nas geladeiras, sensores internos e sistemas de IA ajustam a refrigeração de acordo com o uso, mas também aprendem sobre as preferências dos moradores, sugerindo receitas ou adaptando notificações conforme o perfil dos usuários. Já em aparelhos de áudio, como soundbars, o som se molda ao conteúdo e ao espaço. Mesmo em meio a tantos avanços, o passo seguinte deve ser ainda mais empolgante – dispositivos que modulam sons, imagens e iluminação a partir do que estivermos sentindo, sem que nada precise ser dito.
Prestando atenção às instalações, um pensamento me acompanhou: estamos entrando na era em que o alto artesanato se alia à sensibilidade dos algoritmos. O futuro não será apenas conectado, mas afetivamente responsivo. Essa é a essência da automação emocional. Em vez de nos adaptarmos à tecnologia, ela passará a se adaptar a nós, não apenas quanto aos hábitos (o que já acontece, em alguma escala), mas no que expressamos de outras formas além da física e verbal. Será, sem dúvida, um divisor de águas no design de interiores e de experiências.
O futuro dos eletrodomésticos, bem como dos dispositivos dedicados a facilitar nosso trabalho e potencializar os momentos de lazer e entretenimento, passa por esse cruzamento entre o digital e o sensível. Nosso papel como indústria é ir além de oferecer produtos, propondo experiências que se moldem ao estilo de vida – e ao estado de espírito – de cada pessoa. Um sistema que reduz o brilho da TV automaticamente ao perceber sinais de cansaço no rosto dos usuários. Um refrigerador que entende que você teve um dia difícil e oferece uma opção mais reconfortante. Isso não é ficção científica — é design com escuta ativa. Liderar o futuro da tecnologia também significa aproximá-la da nossa humanidade, desenvolvendo produtos emocionalmente atentos.
O Salão de Milão 2025 nos lembrou que o design do futuro começa com escuta — e não apenas escuta de dados, mas de sensações. A tecnologia que realmente fará parte das nossas casas e vidas será aquela que nos devolve uma versão mais gentil de nós mesmos. Em tempos de excesso, o verdadeiro luxo será ser compreendido sem precisar explicar.
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