O que está por vir?
Compra da IPG pela Omnicom é mais um efeito da transformação da indústria e gera dúvidas sobre como a adesão a tecnologias impactará o futuro do setor
“Ao darmos os próximos passos juntos, acredito firmemente que o melhor ainda está por vir.” A frase otimista — como exige a liturgia do momento — é parte da carta enviada, na semana passada, por John Wren, chairman e CEO da Omnicom, a todos os colaboradores da holding, agigantada após a conclusão da compra da Interpublic.
Maior aquisição da história do mercado de agências de publicidade e empresas de serviços de marketing, a transação sofreu, em 12 meses, desde que foi anunciada, em dezembro de 2024, os efeitos das transformações que guiam a indústria atualmente. Em um ano, o cálculo do valor aproximado do negócio baixou de US$ 13,3 bilhões para US$ 8,9 bilhões, de acordo com o Ad Age Datacenter, que levou em conta o valor das ações das duas companhias: as da Omnicom caíram cerca de 31% no período, e as da Interpublic, 13%.
As holdings concorrentes também vivenciam épocas de quedas: nesse período, os ativos do Publicis Groupe desvalorizaram cerca de 21%, e os da WPP despencaram 65%. O imperativo do mercado de ações determina diversas mudanças pelas quais passam esses grupos globais, como a recente troca de comando na WPP. Por esse motivo, uma das maiores expectativas em relação à nova Omnicom é a de como será seu desempenho na Bolsa de Valores de Nova York a partir desta semana.
Entretanto, a incorporação da Interpublic ao Omnicom gera inúmeras outras dúvidas, como qual será a nova estrutura organizacional da holding e suas principais lideranças, como se desenrolará globalmente o processo de enxugamento de marcas, como serão solucionadas as questões de conflitos de clientes e como a otimização de processos e o corte de pessoal atingirão cada mercado e empresa.
A primeira marca a desaparecer é a própria Interpublic, que sai de cena após 65 anos de história. No mês passado, Meio & Mensagem adiantou que um dos efeitos será o fim da rede DDB no mundo. O plano da Omnicom é o de concentrar seus principais esforços criativos em três grandes bandeiras globais: TBWA, McCann e BBDO. O CEO global Alex Lubar já deixou a DDB rumo à consultoria Fundamentalco, e não foi substituído.
No Brasil, há expectativas sobre a quem se reportarão as agências integrantes da rede DDB. Em situações bastante distintas, a Africa Creative é uma das mais sólidas e admiradas agências do País, com forte liderança e portfólio de clientes locais. Já no caso da DM9, que viveu um dos anos mais difíceis de sua história, como consequência das fraudes no Cannes Lions, há a possibilidade de fusão com a Lew’Lara\TBWA.
Globalmente, além do desaparecimento de algumas marcas, são esperados cortes de pessoal, visto que a Omnicom pretende economizar US$ 750 milhões com “sinergia de custos”. “Com equipes de liderança unificadas por área de atuação nos níveis global, regional e nacional, eliminaremos funções, cargos e operações administrativas redundantes”, adiantou Wren, em fevereiro.
O Omnicom surgiu em 1986 da união de três grandes redes globais de publicidade: DDB, BBDO e Needham. Uma reportagem da época, do jornal The New York Times, revelou bastidores das assembleias de acionistas que viabilizaram o nascimento da holding. O jornal conta que, quebrando o tom mecânico e burocrático da situação, a acionista Paula Green, que havia sido redatora da DDB, injetou um pouco de emoção no evento.
Em seu discurso, ela homenageou Ned Doyle, Maxwell Dane e William Bernbach, que fundaram a DDB em 1949, dizendo que colocaram a indústria “no caminho certo” e geraram “amor, honra e respeito” entre os que trabalharam com eles. Cultuando o papel que a agência desempenhou, ao estabelecer um novo padrão de criatividade, ela concluiu: “Gostaria de ver a tradição continuar, mesmo que o nome mude”.
Como a história mostra, a reverência e o reconhecimento aos que abriram caminho e construíram as bases da indústria não é suficiente para contrapor-se à lógica financeira de companhias guiadas pelos seus desempenhos em bolsas de valores e muito menos ao avanço inexorável da tecnologia — em especial, aos efeitos ainda imprevisíveis, mas tidos como drásticos, da inteligência artificial nesta atividade.