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Opinião

Telefonemas inesperados

Gerenciamento de crises não é um assunto ensinado pelas escolas de marketing e a maioria dos profissionais acaba tendo que improvisar soluções sempre que algo acontece


26 de outubro de 2020 - 14h23

(Crédito: Reprodução)

O meu telefone tocou no meio da reunião. Não atendi. Ele ligou novamente. Ignorei mais uma vez. Na terceira tentativa, pedi desculpas e saí da sala. Do outro lado, o agente de um dos atletas mais famosos do mundo, que há anos era patrocinado pela minha empresa, me disse: nas próximas horas, será publicada uma notícia que você precisa saber. O famoso atleta voltava de uma festa, tinha bebido um pouco e foi parado pela polícia e depois levado para a delegacia por dirigir embriagado. A imprensa não ia demorar para começar a ligar para os patrocinadores perguntando que medidas eles tomariam.

Há poucas semanas, algo parecido aconteceu no Brasil. A diferença é que ninguém ligou para os patrocinadores para avisar que, nas próximas horas, seriam publicadas notícias que eles precisavam saber. Eles descobriram pelas mídias sociais que o Santos havia contratado Robinho, o jogador julgado e condenado a nove anos de prisão na Itália por violência sexual. A imprensa não demorou para começar a ligar para os patrocinadores, perguntando que medidas eles tomariam. As respostas variaram muito e demoraram dias.

A minha experiência profissional está repleta de telefonemas inesperados. Histórias como essas, que podem ser fatais para a reputação das marcas, acontecem com mais frequência do que você imagina. Ainda mais quando o trabalho é relacionado ao esporte ou entretenimento. São atletas e artistas com comportamentos questionáveis, crises políticas e econômicas em países sediando eventos globais etc. Isso tudo sem contar a atual pandemia.

A chave para lidar com essas situações é se preparar muito antes da ligação ou da postagem no Twitter.

Apesar de, à primeira vista, estes problemas parecerem imprevisíveis, a verdade é que a maioria deles podem ser antecipados, discutidos e ter planos de ação definidos antes que aconteçam. Para isso, basta um bom processo de gerenciamento de crises.

Infelizmente, o gerenciamento de crises não é um assunto ensinado pelas escolas de marketing e a maioria dos profissionais acaba tendo que improvisar soluções sempre que algo acontece. Dependendo da complexidade, o impacto na reputação e nas finanças pode ser devastador.

Conscientes dos riscos, grandes empresas criam estruturas e desenvolvem protocolos detalhados para lidar com a maioria dos problemas que possam impactar seus negócios. Este conjunto de ações é chamado de gerenciamento de incidentes e resolução de crises (IMCR, na sigla em inglês).

O primeiro passo é nomear um líder responsável pela função: um diretor de crises. Esse profissional interage com todas as áreas da empresa para identificar as de risco e preparar os planos de ação para as mais variadas situações.

Para cada tipo de risco, definem-se as pessoas que precisam ser informadas, quem informa quem e, principalmente, quem é o responsável pela tomada de decisão. Em muitos eventos esportivos, por exemplo, onde os membros do time estão fora do escritório, ainda é criado um centro de comando que se responsabiliza por distribuir as informações com mais agilidade para todos os envolvidos.

Outra prática comum são as simulações de crise. Assim como muitas empresas fazem treinamentos de evacuação de edifícios em incêndios simulados, empresas treinam o que fazer quando uma crise simulada estoura.

Nem toda crise pode ou precisa ser resolvida rapidamente, mas, dependendo da situação, o tempo de resposta pode fazer toda a diferença. Principalmente quando o assunto envolve a segurança e a integridade dos funcionários.

Infelizmente, isso não acontece com a mesma eficiência no Brasil. Por isso vemos tantas empresas se complicando em suas respostas ou simplesmente fingindo que nada está acontecendo. Sempre que você vir uma crise se desenrolar, observe quando e como as empresas envolvidas respondem. Isso dirá muito sobre o nível de preparação de cada uma.

Crises podem acontecer com maior ou menor frequência para sua empresa, mas lembrese que são inevitáveis. O melhor que você pode fazer é estar preparado para lidar com elas. Torcer para seu telefone não tocar, certamente, não é a melhor alternativa.

*Crédito da foto no topo: JBKdviweXI/ Unsplash 

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