Opinião

Ética, privacidade e responsabilidade no uso de inteligência artificial na publicidade digital

A ética no uso da IA, portanto, não é apenas uma exigência legal ou um diferencial reputacional – ela se configura como uma vantagem competitiva real

André Dylewski

Diretor de desenvolvimento de negócios Latam na RTB House 25 de julho de 2025 - 6h00

É inegável que o avanço acelerado da Inteligência Artificial (IA) está transformando profundamente o setor de publicidade digital. Tecnologias de IA avançadas com aplicações generativa e preditiva têm possibilitado níveis inéditos de personalização, automação e eficiência nas campanhas de mídia, gerando impactos econômicos expressivos. De acordo com o relatório “AI Trends”, produzido pela RTB House, o uso de IA baseada em Deep Learning pode aumentar em até 50% a eficiência de campanhas de retargeting e em até 41% a recomendação de produtos em comparação com métodos tradicionais.

Entretanto, o crescimento tecnológico atual também acentua desafios éticos, jurídicos e sociais que também precisam ser endereçados com o mesmo nível de urgência. A coleta e o uso ainda mais intensivo de dados pessoais e/ou proprietários para alimentar algoritmos poderosos criam um cenário complexo, no qual os anunciantes precisam equilibrar inovação com responsabilidade ética e jurídica, em uma cadeia que geralmente envolve diversos provedores, cada qual com sua própria política.

Privacidade, transparência e vieses algorítmicos

Seja focada em personalização, geração de conteúdo ou predição de comportamentos, a IA geralmente depende de grandes quantidades de dados, e muitas vezes de informações sensíveis para sua operação. Nesse sentido, debates em torno de privacidade, transparência e vieses algorítmicos concentram hoje boa parte das preocupações éticas relacionadas ao uso da IA na publicidade digital.

Privacidade e consentimento tornaram-se temas centrais. Uma pesquisa da Cisco (2024) aponta que, apesar de 63% dos consumidores enxergarem benefícios no uso da IA, 53% se preocupam com o tratamento de seus dados pessoais. Em um cenário de rápida evolução tecnológica, torna-se crucial não apenas acompanhar as novidades técnicas e regulamentares do mercado, como também compreender a fundo o funcionamento dos algoritmos e plataformas utilizados no marketing mix do anunciante. Quais dados são avaliados e compartilhados em cada processo; quais políticas garantem a segurança dessas informações; e existem alternativas mais seguras para o mesmo fim?

Transparência e esclarecimento também são exigências cada vez mais básicas. Os usuários estão mais criteriosos ao fornecer dados pessoais, portanto não basta apenas garantir a segurança desses dados, é fundamental também comunicar com clareza quais tipos de dados estão sendo coletados, para quais fins eles serão usados e como eles serão armazenados e protegidos.

Por fim, vieses algorítmicos são também apontados como um dos maiores dilemas atuais. Algoritmos treinados com dados históricos podem reproduzir – e até amplificar – preconceitos e desigualdades, causando não apenas prejuízos de performance a partir de julgamentos errôneos, mas também potenciais danos à imagem das marcas, gerando até mesmo impactos sociais e jurídicos consideráveis em casos mais graves. Ferramentas com alto grau de acurácia em análise contextual e interpretação semântica, juntamente com filtros adicionais de Brand Safety, são alguns dos potenciais caminhos para mitigar eventuais riscos.

Marcos regulatórios e a contribuição humana surgem como elementos chaves no debate

O contexto regulatório global vem se tornando mais rigoroso em relação ao uso de dados e ao desenvolvimento responsável de IA. No Brasil, a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) já estabeleceu parâmetros claros para o tratamento de dados pessoais. Além disso, o Marco Regulatório da Inteligência Artificial, aprovado pelo Senado e atualmente em análise na Câmara dos Deputados, busca regulamentar o uso da IA em diversos setores, com foco na segurança, ética e transparência.

Outra iniciativa relevante é a resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), que define diretrizes específicas para o uso de IA no Judiciário, incluindo a necessidade de supervisão humana, auditorias regulares e categorização dos sistemas de IA de acordo com seu nível de risco. Essas normas reforçam a importância de uma governança sólida que também serve de modelo para o setor privado.

Para garantir que o uso da IA traga benefícios sem comprometer direitos e reputações, principalmente no segmento de marketing e publicidade, empresas e anunciantes devem seguir boas práticas, investindo em conselhos e comitês voltados para a discussão sobre o uso das novas tecnologias, bem como no treinamento e aperfeiçoamento dos seus profissionais.

A ética no uso da IA, portanto, não é apenas uma exigência legal ou um diferencial reputacional – ela se configura como uma vantagem competitiva real. Empresas que adotam uma postura responsável frente à tecnologia ganham não apenas confiança, mas também relevância em um mercado cada vez mais exigente. Afinal, o verdadeiro poder da IA reside não apenas nos algoritmos, mas na sabedoria humana ao utilizá-los.