Você leria uma obra de um autor-máquina?

Buscar
Publicidade

Opinião

Você leria uma obra de um autor-máquina?

A revolução robótica está nos levando a novas fronteiras em relação a autoria e direitos de criação

Preencha o formulário abaixo para enviar uma mensagem:


25 de outubro de 2023 - 6h00

Mesmo que não perdure por muito tempo, já que a mudança é uma constante nos nossos dias, o ChatGPT foi o sistema responsável por popularizar o uso da Inteligência Artificial Generativa em 2023. Com foco no usuário final, e uma gigantesca base de dados que funciona no esquema de perguntas e respostas, muitos de nós usamos a ferramenta pela curiosidade e interesse em testar o poder de elaboração da máquina. E fomos surpreendidos com a capacidade de geração de textos coerentes.

Desde então, outros modelos foram lançados e passamos a debater com mais ênfase a necessidade de regulamentação da IA. Durante minha participação durante a Bienal do Livro do Rio de Janeiro, as discussões que mais geraram debates foram em relação ao uso de IA para a produção de novas obras. Você compraria um livro escrito por um robô? Quais as diferenças entre o banco de dados de uma máquina e o repertório intelectual de um humano? É necessário informar na capa que a produção foi feita com auxílio de IA Generativa?

A revolução robótica está nos levando a novas fronteiras em relação a autoria e direitos de criação. Faz parte dos avanços tecnológicos num setor que deve reinventar para se manter aquecido e de acordo com as novas demandas sociais. São muitas as modificações nos processos de produção, distribuição e consumo editorial. Um dos desdobramentos legais mais recorrentes com a adoção de recursos que facilitam e democratizam o acesso a dados digitais é sobre a proteção autoral.

Será que a IA realmente é capaz de criar algo novo a ponto de ser considerada uma obra original? Ou tudo que a IA cria está inspirado em algo já criado e que aprendeu na sua base de dados, sendo no máximo uma obra derivada? O cruzamento dinâmico de informações, que dificulta os próprios desenvolvedores das IAs apontarem de onde vêm os dados que alimentam o sistema, acaba por se valer de propriedade intelectual dos indivíduos que as desenvolveram sem respeitar os direitos de obras protegidas.

Por outro lado, muito se discute sobre a possibilidade de se reconhecer tais direitos à obra que é resultado direto da IA. Acredito que a IA não tem ainda capacidade inventiva ou semelhante à imaginação. Apesar de poder ter alucinação. Por certo está sujeita a seguir as regras de citação de fontes e referências, de propriedade intelectual e de fair use que são mais que bicentenárias. Estão em tratados internacionais desde a Convenção de Berna.

Pela lei brasileira, as produções das IAs generativas não têm direito à proteção intelectual. A máquina não cria nada, usa apenas informações que já existem e foram elaboradas e inseridas em algum lugar por alguém. A proteção é garantida somente para pessoas físicas, no sentido literal. No entanto, é possível proteger uma obra criada com auxílio de IA. O que torna a criação passível de proteção é o fator inventivo, algo que só a condição humana pode criar e não a tecnologia.

No início de setembro, a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) publicou a primeira Orientação Global sobre IA Gerativa na Educação e Pesquisa. A agência especializada da ONU alertou para a conscientização do setor educacional perante o desafio de incorporar, eticamente, as ferramentas de Inteligência Artificial Generativa no âmbito educacional, com a credibilidade jurídica dos órgãos governamentais.

É um alerta mundial diante da meteórica ascensão do ChatGPT, que contabilizava 100 milhões de usuários ativos mensais em janeiro de 2023, e até o momento regulamentação implantada somente na China. A Unesco advertiu que o público adequado para uso das ferramentas de IA em ambientes educativos deve ser acima dos 13 anos e solicitou o preparo dos docentes a respeito deste novo componente na sala de aula. Declarou que esse direcionamento “auxiliará os legisladores e educadores a compreender melhor as possibilidades da IA alinhada aos interesses estudantis”.

A tendência é que as leis evoluam conforme o avanço da tecnologia. O que presenciamos é que a IA generativa provoca cada vez mais a necessidade de atualização da legislação de direitos autorais, visando criar camadas de proteção, principalmente no cenário atual em que a checagem de informação é limitada, em um terreno já complexo de se regulamentar como a Internet. É necessário construir uma equação que acomode o avanço tecnológico dentro da proposta da legislação para não comprometer o modelo de proteção, com viés moral e patrimonial construído.

Autoria: Patricia Peck, CEO e sócia fundadora do Peck Advogados, Conselheira Titular do Conselho Nacional de Proteção de Dados (CNPD) e Professora de Direito Digital da ESPM.

Publicidade

Compartilhe

Veja também

  • Como as redes sociais podem contribuir na conversão do e-commerce?

    Como as redes sociais podem contribuir na conversão do e-commerce?

    Levantamento da Nuvemshop aponta maior interferência das redes sociais na venda direta de produtos online no primeiro semestre

  • Pipeline Capital lança concurso para startups de GenAI Commerce

    Pipeline Capital lança concurso para startups de GenAI Commerce

    Iniciativa visa reconhecer IA como elemento acelerador do crescimento das empresas na área de varejo e e-commerce no Brasil