SXSW: não é sobre isso. Esquece o PLAY!
Não tem como você chegar de exAUSTIN (sim, você chega num grau de exaustão que só Austin proporciona) com um botão de PLAY para apertar
Não tem como você chegar de exAUSTIN (sim, você chega num grau de exaustão que só Austin proporciona) com um botão de PLAY para apertar
19 de março de 2024 - 15h57
Cada vez que me comentam sobre a vontade de colocar rápido os aprendizados do South by Southwest (SXSW) em prática, eu arregalo os olhos enquanto penso “não é sobre isso”. E olha que eu demorei alguns festivais para acalmar minha alma ansiosa e aprender a valorizar a decantação do novo. Não tem como (perdoem-me os seres elevados que me contrariam) você chegar de exAUSTIN (sim, você chega num grau de exaustão que só Austin proporciona) com um botão de PLAY para apertar. Não é sobre isso.
No grupo de 138 pessoas que levamos na expedição [EXP+PROS], da Agência PROS + Experience Club, estavam líderes de diversas áreas, com seus momentos de vida específicos, suas respectivas jornadas, buscas e vazios. O SX não preenche espaços, mas ele permite que você se afaste da rotina e das suas certezas e te coloca num lugar desconfortável, desafiador, de absorção e cheio de sinapses diferentes.
Não é sobre querer seguir à risca o plano de palestras feito antes de chegar ao Festival. Não é sobre reclamar das filas intermináveis ou se queixar da falta de comidas no Centro de Convenções. Não é sobre isso. É sobre se permitir desconectar para reconectar. Piegas? Um pouco, mas igualmente difícil e potente. Aliás, esse foi o tema das conversas entre a belga-americana especialista em relacionamentos modernos Esther Perrel, apresentadora do podcast “Where Should We Begin?” com o humorista Trevor Noah. Ele falou da importância dos momentos “off the record” e Perrel trouxe o conceito de “perda ambígua”, destacando a desconexão que surge quando a presença é ofuscada pelos celulares que atravessam nossas conversas cotidianas.
A aceleração das tecnologias, elevada à enésima potência pela Inteligência Artificial, tem desafiado a gente a tentar dar conta de tudo e de todos. O resultado? Uma epidemia de ansiedade e crise de solidão. Isso mesmo: “uma solidão crônica, disfarçada de hiper conectividade”, como disse a pesquisadora de vulnerabilidade Brené Brown, líder do podcast “Unloking Us”. E Esther Perrel completou. Pausa: sim, Esther Perrel e Brené Brown dividiram o mesmo palco nessa edição, para delírio das 600 pessoas que conseguiram as pulseirinhas de acesso à sala. Retomando, Perrel disse: “Os celulares nos colocam em contato com quem está longe e nos aproximam do que acontece no mundo, enquanto nos afastam de quem está do nosso lado”.
Bateu pesado em você? Em mim, sim! Na verdade, bateu pesado desde o SX do ano passado, quando Perrel trouxe esse conceito de Intimidade Artificial, na era da Inteligência Artificial. Para mim, o tempo passou e esse abismo só aumentou!
Como disse Simran Jeet Singh, autor de “The Light You Give”, que abriu o SX de 2023, “para sermos resilientes, temos que exercitar a compaixão com outros 3 C´s: curiosidade, coragem e conexão”. E esse último C é justamente o “desafio de ter uma conexão verdadeira com quem está ao seu redor, porque ajudar o outro é ajudar a si mesmo”. Esse tema da falta de conexão nas relações foi muito potente esse ano. Ouso soar repetitiva, mas trago aqui mais uma reflexão do mega podcaster de “On Purpose”, Jay Shetty: “Em cada relacionamento existem três relacionamentos: aquele entre duas pessoas envolvidas, aquele entre seu/sua parceiro/a e ele/a mesmo/a, e aquele entre você e você. Se você não está bem com você, não há como fazer o outro se sentir bem”.
Agora, o momento mais especial e de conexão, para mim, foi assistir à experiência de VR sobre o holocausto, revivendo a dor da sobrevivente Marion, no projeto chamado Letters from Darcy. Cerca de 20 minutos, o vídeo 360 com ambientes em 3D, viajei pelas memórias de Marion Deichmann, que aos 9 anos, viu sua mãe desaparecer pela porta de seu pequeno apartamento em Paris, pelas mãos de dois policiais que levaram judeus para a prisão de Darcy e, depois, para Auschwitz. Separada da família, foi apenas pela bondade e coragem de outros que Marion sobreviveu, dormindo “em poltronas, sofás e no chão”, como ela conta, já com a idade atual. Ao terminar a experiência, abro os óculos e a poça de água cai sobre o rosto. Ao abrir a cortina, dou de cara com Marion, usando a mesma roupa da experiência. Uma conversa se inicia e me emociono com a resiliência daquela menina que agora conta seus feitos e a enorme família que constituiu. Depois dessa lição e emoções misturadas, melhor ir ao quarto e ficar por uma hora em posição fetal, absorvendo, antes de encontrar meu grupo para um happy hour muito planejado.
SXSW. É sobre isso.
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