A importância dos recortes no futuro feminino
Trilha de Diversidade e Inclusão do WTW Summit abordou a diversidade geracional, inclusão de pessoas LGBTQIA+, a escassez das mulheres na criação e a importância da interseccionalidade
A importância dos recortes no futuro feminino
BuscarTrilha de Diversidade e Inclusão do WTW Summit abordou a diversidade geracional, inclusão de pessoas LGBTQIA+, a escassez das mulheres na criação e a importância da interseccionalidade
Carolina Huertas
14 de abril de 2022 - 7h10
Diversidade e Inclusão foi um dos três temas que guiaram os painéis do Woment to Watch Summit, realizado nessa quarta-feira, 13, no Hotel Unique, em São Paulo. A trilha trouxe o olhar do mercado sobre a diversidade geracional, inclusão de pessoas LGBTQIA+, a escassez das mulheres na criação e a importância da interseccionalidade. O primeiro painel “Diferentes gerações, as mesmas dores”, abordou as particularidades da mulher no mercado através dos anos.
A questão foi debatida a partir da área do planejamento estratégico pelas profissionais Rita Almeida, diretora de planejamento da AlmapBBDO, Thaís Frazão, chief strategy officer da Ogilvy, Gabriela Rodrigues, head de cultura e impacto na Soko. Vista como uma das primeiras atividades da publicidade a ter a presença feminina, o debate começou com a indagação de porque o planejamento se diferenciou das demais áreas nessa questão. Gabriela questiona o porque dessa ocupação não ocorrer nos outros espaços, ao invés de focar no porquê de estarem ali.
“Por que permitiram esse espaço? Será que acharam que era um espaço menos importante? Será que quiseram proteger os espaços que julgavam ser mais importante, como a criação? Acho que me interessa mais o porquê não as outras áreas, por que em teoria todos os espaços deveriam ser uma possibilidade de ocupação?”, indaga.
Para Rita, a questão está conectada ao fato do planejamento ser ligado a entender pessoas e segundo ela, a mulher tem uma sensibilidade mais ajustada para entender o outro. Já Thais comenta que quando entrou na agência em 1998 já tinha uma líder feminina, e para ela, essa presença também está ligada a isso: o fato de uma mulher puxar a outra. “Isso se perpetuou por muito tempo. Se estou aqui hoje, é respingo de uma atitude lá atrás de alguém que colocou uma bandeirinha nesse espaço. Agora a pergunta é: o que vamos fazer para que outras mulheres ocuparem novos espaços? Como vamos puxar mais mulheres, e mais diversas?”, reflete.
As profissionais presentes no painel representam diferentes gerações de publicitárias, mas apontaram que os desafios não são muito distintos. Rita revela que a dificuldade para ser ouvida sempre esteve presente e, apesar de hoje já existir uma conversa sobre a questão, é uma situação que ainda precisa ser enfrentada, além da falta de mulheres em cargos de liderança. Thais afirma a necessidade de construir autoridade e autoconfiança para se provar capaz esteve constantemente presente. Já para Gabriela, os obstáculos enfrentados esbarram em outras esferas antes da dificuldade de ser mulher no meio corporativo.
A executiva conta que sua a primeira dificuldade foi em relação ao bairro em que morava, na Zona Leste de São Paulo, o qual ela tinha receio de mencionar com medo dos contratantes acharem que ela chegaria atrasada ou que era muito distante. Para além disso, circular nos ambientes podendo falar abertamente sobre suas vivências como mulher lésbica também foi uma questão. “As coisas foram somando. O fato de eu ser mulher foi na verdade a última que percebi nessa história. Estou falando isso porque estamos em um evento que fala sobre mulheres e é muito legal termos esse espaço, é muito rico, mas é um desafio para nós é: E agora? Como é que trazemos novos olhares? Como expandimos as narrativas para que de fato todas as mulheres olhem e vejam um tipo de mulher que querem ser? Precisamos ver várias referências”, pontua.
Dentro dessa visão de recorte, Rita abordou também a questão etária dentro da publicidade. Ainda que gênero, raça e sexualidade ainda tenham muito a caminhar, a executiva acredita que a longevidade ainda precisa ser notada. “A primeira coisa que vamos ter que mexer é com o preconceito, tornar esse um assunto. Estamos muito longe dela. Eu busco ser uma presença que mostra que isso é possível, porque eu tenho 61 anos, porém, olho para o lado e não tem ninguém”, diz a diretora.
Ela pontua que apesar das pessoas acharem que ao falar desse tema estão discutindo algo triste e parado, ele é o que se tem de mais inovador no momento. No mercado, por muito tempo essa foi uma questão inexistente, pelo fato de que a expectativa de vida da população era mais baixa. Agora, no entanto, o cenário é outro.
O segundo painel da trilha contou com Beta Boechat, fundadora da Fala.agency; Raquel Virgínia, CEO da agência de gestão de cultura Nhaí, e Fefito, diretor de redação do BuzzFeed como moderador, para discutir a criação de jornadas mais inclusivas e a desconstrução de preconceitos.
Fefito alertou sobre a importância do lugar de escuta dos homens ao pontuar sua presença como mediador. Logo depois, Beta compartilhou sua trajetória e alertou sobre a necessidade de criarem espaços inclusivos para garantir não só a presença de pessoas, mas o desenvolvimento da melhor versão delas.
“Nós falamos com as empresas não apenas por a diversidade ser algo bonitinho, mas uma coisa que faz com que as pessoas que estão dentro das empresas possam ser quem elas são. Quanto as empresas que eu trabalhei perderam por eu não ter sido a pessoa que eu sou hoje? É isso que precisamos pensar: as empresas precisam ter pessoas e espaços que possam fazer com que todos envolvidos possam dar o seu melhor. E isso é só possível se nos sentirmos seguros e aceitos”, diz a fundadora.
Beta chama atenção para o fato de que incluir pessoas diversas também passa pelo ponto de a empresa estar estruturada para os conflitos que irão surgir no caminho, pois, inevitavelmente é uma estrutura que está sendo modificada e que vai encontrar resistências em algum momento. Raquel também fala sobre a questão e afirma que esta não deve ser uma maratona para quem contrata mais pessoas diversas, mas sim um processo de construção estrutural que deve ser feita com atenção e cuidado.
“Quando falamos de inclusão de pessoas trans, você não precisa necessariamente contratar pessoas trans correndo. Eu fico com um pouco de medo dessa corrida. É na verdade sobre como vamos construir projetos consolidados para que pessoas trans possam serem tanto fornecedoras, como trabalhar na sua empresa. Isso precisa ser feito de maneira estratégica, precisa ser desenhado, precisa de uma arquitetura de ideias, ter um arco de começo e fim. Precisa ser estudado e isso tudo leva um tempo para ser algo consolidado”, comenta a CEO da Nhaí.
Nesse caminho de se estruturar para a mudança, Raquel ressalta o papel da inclusão como oportunidade de crescimento de negócio. Ela afirma que o trabalho da Nhaí não vem de um lugar de caridade, mas de como a diversidade pode fazer os produtos serem mais lucrativos e competitivos. A profissional afirma que apesar das iniciativas terem papel social, elas precisam deixar de serem vistas como um investimento no terceiro setor. “Eu não vou em nenhuma empresa como consultoria para fazer nenhum estímulo de responsabilidade social. A Nhaí vai na sua empresa para que a gente possa construir um produto mais completo, robusto e competitivo”, destacou a empreendedora.
Beta também alerta para o fato de que a diversidade é essencial para a criação de um produto inovador e para uma longevidade do mercado. “Precisamos entender que se todo mundo está pensando de uma forma, alguém vai construir uma outra tecnologia que vai te engolir em pouco tempo”, afirmou.
Para o final da trilha, o painel ‘Mulheres e criação: longe do equilíbrio’ contou com Carol Patrocinio, diretora de criação de Marisa na Africa; Aline Botelho, creative and art manager da Havaianas, e Deh Bastos, diretora de criação da Publicis. As profissionais relembraram que a falta das mulheres na criação, além de ser um problema para a área, não reflete a composição real do Brasil.
“Não faz sentido o número de mulheres no Brasil versus o número de mulheres criativas. As pesquisas dizem que somos mais de 50% no Brasil. Como pode nesse mercado ter tão poucas mulheres na criação? A mesma situação para as pessoas pretas: onde estão essas pessoas? E faço a mesma pergunta sobre regionalidade. Sou de Salvador, estou 14 anos nesse mercado e só vejo paulistanos”, afirma Aline.
Carol comentou que, para a mudança desse cenário, para que sejam incluídas mulheres diversas, é preciso estar atento às necessidades que esse passo pode exigir, como precisar oferecer um curso de inglês junto à vaga ou flexibilizar o horário de trabalho para se adequar às particularidades, como já aconteceu ao encontrar uma candidata que morava em um local em que havia toque de recolher. “Ou eu mudava o horário de trabalho dela ou ela não ia conseguir um trabalho. Por que quem ia mudar? Precisamos olhar pro outro e entender o que ele necessita para poder florescer”, conta.
E diante a urgência dessa transformação de mercado, Deh afirma que o modelo que se faz publicidade hoje no Brasil não se sustentará a longo prazo e que a trajetória da mulher preta que é ativista neste cenário é feita por escolhas individuais, mas por uma luta que é coletiva. Ela aponta que não é só sobre ser uma mulher preta, mas sobre tudo que vem depois. “Tem uma frase que diz que diversidade é chamar para a festa; inclusão é chamar para dançar e equidade é perguntar se a pessoa tem roupa para ir para a festa”, diz.
A executiva aborda a necessidade de se ter aliados no caminho que acompanhem os passos dessas mulheres e forneçam ferramentas para que a chegada a novos espaços seja possível mesmo diante aos obstáculos. Durante a reflexão, a diretora foi indagada se não seria aconselhável assumir a postura de ‘o que um homem branco faria nessa situação?’ e enfrentá-la mesmo se não se sentir segura, porém, Deh rebate dizendo que por ser uma mulher preta essa visão é perigosa e não deve ser utilizada por mulheres de uma minoria.
“Outro dia um homem me aconselhou: ‘Quem nada com os tubarões, não sangra’. Eu olhei para ele e respondi ‘Mas eu sou uma mulher preta, eu já entrei sangrando. Não dá para eu tentar vestir a roupa de um homem branco nem se eu quisesse’. Mulheres pretas: não se forcem a caber em roupas desconfortáveis”, conclui.
Compartilhe
Veja também
Quais são as tendências de estratégia para 2025?
Lideranças femininas de agências, anunciantes e consultorias compartilham visões e expectativas para o próximo ano
Como as mulheres praticam esportes no Brasil?
Segundo relatório "Year in Sport", da Strava, corrida é o esporte mais praticado globalmente e atividades físicas em grupo crescem 109% no País