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Como as empresas estão medindo práticas ESG?

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Como as empresas estão medindo práticas ESG?

Algumas lideranças, especialmente mulheres, não só consideram a sustentabilidade crucial para a perenidade dos negócios, como já a traduzem em dados


21 de maio de 2025 - 7h17

Por Dimalice Nunes

(Crédito: Shutterstock)

Faturamento total subtraído dos custos é igual a lucro? Há tempos a “conta de padaria” já não abarca a complexidade de medir o sucesso de um negócio. E quando linhas intangíveis, como as ações de sustentabilidade, passam a fazer parte de um balanço, o cálculo fica ainda mais complexo. Mas uma série de lideranças, especialmente mulheres, não só têm como fato absoluto a relevância da sustentabilidade, como já a materializa em números.

“O modelo tradicional de crescimento é ainda pautado na lógica imediatista de lucros e perdas. Trazer para a mesa a inclusão da sustentabilidade significa olhar para a perenidade do negócio e conseguir antecipar os riscos e oportunidades que as mudanças climáticas podem gerar para os diversos setores”, explica Ana Buchaim, vice-presidente de pessoas, marketing, comunicação, sustentabilidade e investimento social privado da B3. “Incorporar ações de sustentabilidade exige uma revisão profunda dos modelos tradicionais de crescimento, o que inclui a adoção de métricas que vão além do lucro financeiro”, concorda Walléria Sampaio, gerente executiva de estratégia e governança da sustentabilidade do Banco do Brasil.

Um balanço que contempla a sustentabilidade tem linhas como intensidade de emissões de gases de efeito estufa e a quantidade de hectares conservados ou reflorestados, por exemplo. “Não é mais possível olhar apenas para indicadores financeiros isolados e acreditar que isso representa performance da companhia”, completa Tatiana Ponce, vice-presidente de marketing e líder de pesquisa e desenvolvimento para Natura e Avon. Afinal, o que está em jogo agora é a relevância de longo prazo das marcas, a incorporação da sustentabilidade nos produtos como forma de agregar valor, a coerência com os desafios do nosso tempo e a capacidade de gerar impacto positivo em escala.

Tatiana Ponce, da Natura e Avon: “Não é mais possível olhar apenas para indicadores financeiros isolados e acreditar que isso representa performance da companhia” (Crédito: Divulgação)

Para apoiar essa visão, a Natura adotou o Integrated Profit and Loss (IP&L). Ele permite traduzir em valor o que antes era invisível, avaliando os efeitos da operação em três dimensões: os capitais natural, social e humano. “Ao atribuir valor aos impactos gerados em diferentes capitais, conseguimos visualizar como uma escolha regenerativa pode gerar retorno reputacional, engajamento de consumidores e eficiência operacional”, explica Tatiana. “Mais do que os números, o que faz diferença é a mentalidade que isso provoca: entender que crescimento e impacto positivo não são forças opostas, mas partes de uma mesma equação de sucesso.”

Na Nestlé, mensurar foi o ponto de partida da ação. “Não se gerencia o que não se mede”, sintetiza Taissara Martins, head de sustentabilidade da empresa no Brasil. Segundo ela, é essencial traduzir os compromissos da companhia em metas claras, com marcos intermediários e prazos definidos. Também é necessário considerar que um indicador não é definido sozinho. Deve-se considerar a realidade dos envolvidos, o objetivo esperado dos diferentes stakeholders e o apetite de quem também busca uma solução.

Um exemplo disso foi reconhecer que 70% das emissões de gases de efeito estufa da Nestlé vêm do campo, o que levou a empresa a promover práticas de agricultura regenerativa nas principais cadeias produtivas, como cacau e leite. “Incorporar ações de sustentabilidade de forma genuína significa, antes de tudo, repensar os modelos tradicionais de crescimento. Estamos saindo de uma lógica linear para uma abordagem regenerativa, que mede sucesso por meio do impacto positivo”, afirma a executiva.

Como fazer? Ana, da B3, explica que o primeiro passo para criar indicadores de performance é entender a materialidade do setor em questão, ou seja, quais temáticas ambientais mais impactam a organização e devem ter prioridade estratégica. “Esse exercício exige o envolvimento da liderança e dos demais stakeholders, que definirão o que é material para o negócio”, completa. Após essa identificação, a companhia pode selecionar indicadores de performance a partir dos padrões que já existem no mercado, como a Global Reporting Initiative (GRI) e o International Financial Reporting Standards (IFRS).

As orientações presentes na norma ISO 14001 e as recomendações da Task Force on Climate-Related Financial Disclosures (TCFD) também podem ser uma bússola relevante para criação de indicadores e de relatos ambientais. Além disso, existem alianças globais setoriais que divulgam compromissos norteadores sobre o que cada indústria precisa considerar para criar um plano de transição climática. “Ou seja, essa jornada não precisa ser solitária. Existem inúmeras referências e grupos de trabalho que podem apoiar as companhias no processo de adaptação climática”, define.

Lucrar e regenerar

Indicadores bem elaborados devem não apenas mensurar resultados, mas inspirar mudanças profundas na cultura organizacional, nas práticas de mercado e na presença da empresa junto à nossa sociedade. Esse foi o ponto de partida de Erlana Castro, fundadora e líder do think tank #ESGpraJÁ para a criação do Business Model (RE)Generation Canvas, uma evolução do Business Model Canvas que incorpora o ESG na equação criativa e de valor de um negócio.

“A tese por trás do (RE)Canvas é a de que é um bom negócio ser um negócio bom”, afirma Erlana que, em 2023, convocou um time de 30 colegas especialistas em diversas áreas para repensar o Canvas de modelagem de negócios dentro da nova perspectiva. Foram meses de estudo e discussão de cada um dos nove blocos que compõem e organizam a lógica de criação de um negócio. “Repensamos bloco a bloco, até que saímos do outro lado com uma versão conceitual de como articular essa ideia”, relembra. A ferramenta foi apresentada na programação oficial do festival Cannes Lions de 2024.

Segundo Erlana, é recomendável usar o (RE)Canvas do #ESGpraJá como um ponto de partida para novos produtos, serviços e ideias, ou como um instrumento de revisão e evolução do modelo de negócio. Um terceiro uso é como texto base para sessões de Leadership Peer Learning, técnica desenvolvida no âmbito da educação executiva.

Erlana Castro, fundadora e líder do think tank #ESGpraJÁ: “Agora, é sobre regenerar e lucrar ao mesmo tempo” (Crédito: Henrique Gualtieri/Divulgação)

“De todos os jeitos, vale a pena deixar-se provocar pelas 32 perguntas propostas ao longo dos novos (RE)Building Blocks do seu negócio”, comenta. Para Erlana, a equação criativa mudou. Antes, existiam as organizações lucrativas e as sem fins lucrativos, ou seja, regenerativas. “Agora, é sobre regenerar e lucrar ao mesmo tempo”, afirma. E a oportunidade vale para os dois lados: tanto o setor privado pode aprender a regenerar quanto o contrário. “O que eu observo é que ambas as abordagens são contraintuitivas e o (RE)Canvas oferece uma espécie de guia para essa jornada estratégico-criativa”, explica.

Para que essas métricas dialoguem com metas financeiras, é importante perceber os indicadores como uma linguagem, um modo eficiente e crível de contar a história de um negócio que regenera e lucra ao mesmo tempo. “Uma empresa convicta e engajada em fazer parte da solução, e não do problema, enxergará o ESG como principal território para criação de valor presente e futuro do negócio. Não é sobre filantropia. Preste atenção na sigla ESG: É Sobre Grana”, conclui Erlana.

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