Como ser executiva global, mãe e empreendedora, com Maria Garrido 

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Como ser executiva global, mãe e empreendedora, com Maria Garrido 

A CMO Global da Deezer fala sobre carreira internacional, maternidade e equidade de gênero


3 de abril de 2024 - 12h11

Maria Garrido é CMO global da Deezer e fundadora do retiro de bem-estar Terranam Wellness, localizado na Galícia, Espanha (Crédito: Divulgação)

Desde cedo, Maria Garrido sabia que queria trilhar uma trajetória internacional. Nascida em Chicago, nos Estados Unidos, seu primeiro emprego foi logo em Nova York, nos Estados Unidos. Sem muita demora, o destino a levou para alçar outros voos: passou por escritórios no México e na França, reportou para todo o continente da América Latina e Europa. Nessa caminhada, ela entendeu a importância de ter jogo de cintura para se adaptar à cultura local quando se ocupa uma posição global numa empresa. Hoje, Maria reside na França, onde trabalha como CMO Global da Deezer. 

Mãe de três filhos, a executiva sabe do peso e dos impactos que a maternidade pode trazer para a carreira das mulheres. Exatamente por isso, ela fundou um retiro focado em saúde e bem-estar, originalmente voltado apenas para mulheres, chamado Terranam Wellness, localizado na Galícia, Espanha. Já como liderança, é regida pelo lema “Há um lugar especial no inferno para mulheres que não ajudam outras mulheres”, frase de Madeleine Albright, ex-secretária de estado dos Estados Unidos. Não por acaso, Maria atua como mentora no International Women’s Forum (IWF), organização que apoia profissionais femininas de alto potencial por meio de programas de desenvolvimento de liderança. 

Nesta entrevista, ela conta sobre os desafios e oportunidades de ocupar uma cadeira internacional, como a maternidade mudou sua relação com o trabalho e ainda dá um conselho de carreira importante para as mulheres.  

Primeiro, pode fazer um breve resumo da sua trajetória profissional?

Cursei Relações Internacionais na graduação e meu foco estava voltado para uma carreira internacional diplomática, e não empresarial. Contudo, alguém na minha universidade me recomendou para um estágio em uma empresa. No início, fiquei um pouco reticente, mas decidi experimentar. Logo depois, resolvi fazer uma pequena mudança de planos: conquistei meu diploma, mas percebi que para seguir nesse ramo, precisaria de um MBA. Fiz um em negócios internacionais, com foco em marketing internacional. 

Comecei minha carreira em Nova York, em uma empresa de produtos de consumo que oferecia um programa especial de mudança de país a cada três anos. Em vez de ser diplomata para o governo, atuei como diplomata para produtos como pasta de dente e sabonete. Depois de dois anos, fui enviada para a América Latina, onde passei cinco anos no México. Em seguida, fui transferida para a divisão francesa e, depois, para a divisão europeia da empresa. 

Entretanto, percebi que o setor no qual trabalhava não estava acompanhando as tendências digitais, então decidi sair. Nesse ponto, já tinha três filhos e decidi tirar uma licença parental longa, o que foi um tanto desafiador para mim enquanto mulher e, especialmente, devido às pressões da minha geração em relação à carreira. Depois desse período em casa, percebi que não era feita para ser mãe em tempo integral e retornei ao mundo dos produtos de consumo. 

Após alguns anos, decidi fazer uma mudança radical e entrei para o mundo das agências, buscando uma compreensão mais profunda do espaço digital, análises de dados e inteligência artificial. Em seguida, passei oito anos em uma empresa de entretenimento e mídia antes de sentir que estava batendo contra um teto de vidro. Decidi então iniciar um projeto pessoal na Galícia (Espanha), onde abri um hotel boutique dedicado à saúde. Entendi a importância de cuidar de mim mesma como ser humano, não apenas em papéis como mãe, executiva ou amiga.  

Depois desse projeto, retornei ao mundo corporativo como parte da Deezer, onde estou há 16 meses. Minha experiência me trouxe aqui para reestruturar o departamento de marketing, colocando o cliente no centro de nossas ações e buscando criar conexões emocionais duradouras com nossa base de usuários. Estou empolgada em trabalhar novamente na mídia, especialmente no setor da música, e contribuir para a profissionalização e o propósito da organização. 

Você desde muito cedo quis trilhar uma carreira internacional. Como surgiu a primeira oportunidade e como foi o processo de decisão para seguir nesse caminho? 

Crescer entre dois países fez com que eu me sentisse global desde o início. Desde criança, me sentia mais em casa em grupos internacionais, fazendo a ponte entre culturas. Um conselho que recebi há dez anos e que ainda considero valioso é o da “flor com cinco pétalas”. Me disseram: imagine uma flor com cinco pétalas e coloque um adjetivo em cada pétala que descreva o tipo de ambiente de trabalho que realmente te preenche e te traz alegria. Escolhi a palavra “global” como uma das pétalas. Assim, encontrei escolas e oportunidades de carreira que me levariam a experiências internacionais. 

Ao longo dos anos, aprendi que viver no exterior não é para todos, mas para dirigir uma empresa global é essencial entender as dinâmicas e os desafios de diferentes mercados. É uma experiência humilde e enriquecedora, mesmo que desafiadora. Por exemplo, no México, me senti em casa, mas na França, sendo a única com o perfil americano na equipe, enfrentei e convivi com diferentes expectativas e  maneiras de trabalhar. Encontrar o equilíbrio entre minha experiência americana e a cultura local tem sido desafiador, mas também enriquecedor. Isso me permitiu verdadeiramente entender e respeitar diferentes culturas, tornando-me uma profissional global.  

Você também participa de iniciativas voltada para mulheres e tem um empreendimento de bem-estar para elas. Pode nos contar mais?

Quando comecei minha carreira e tive meus três filhos, percebi o impacto da maternidade na minha trajetória profissional. Era expatriada e, com o tempo, a diferença do meu salário para o do meu ex-marido ficou evidente. Isso me levou a uma reflexão sobre equidade. No meu escritório, tenho um pôster com uma frase de Madeleine Albright que diz muito sobre minha visão: “Há um lugar especial no inferno para mulheres que não ajudam outras mulheres”. Isso ressoou comigo porque acredito firmemente que devemos apoiar as escolhas umas das outras, seja a de ficar em casa com os filhos ou de perseguir uma carreira. 

Em reuniões executivas, frequentemente sou uma das poucas mulheres, e sempre defendi que não deveria ser uma competição entre nós, mas sim um apoio mútuo. Discordo da noção de que apenas uma de nós pode estar em posições de liderança. Deveríamos promover a inclusão de múltiplas vozes femininas. 

Acredito também que a narrativa de que podemos fazer tudo perfeitamente é uma ilusão. Precisamos aceitar que haverá sacrifícios e que está tudo bem cometer erros. Aconselho mulheres mais jovens a serem flexíveis com seus planos de carreira, abertas a oportunidades, mesmo que não pareçam imediatamente relevantes. É sobre aprendizado e crescimento. 

Meu negócio focado no bem-estar era inicialmente direcionado a mulheres, mas agora vejo um crescente interesse dos homens, o que me levou a realizar retiros exclusivos para eles. Estou comprometida em fazer a diferença, por isso, parte dos nossos lucros é destinada a retiros gratuitos para sobreviventes de violência doméstica, ajudando-as a reconhecer seu próprio valor e a cuidar de si mesmas. Minha paixão é elevar os outros, ser o “vento por trás das asas” de alguém, porque se não nos apoiarmos, quem o fará? 

Como você descreveria seu estilo de liderança? 

Eu lidero tentando ser empática, não apenas com minha equipe, mas também com parceiros de negócios. Acredito que entender as necessidades de clientes e parceiros, e como podemos solucionar seus problemas, cria relações mais sólidas. Prefiro pensar em termos de “nós”, não “eu”.  

Há alguns anos, em um evento em Londres, observei um contraste marcante entre dois palestrantes bem-sucedidos da geração baby boomer: um homem focava em “eu”, enquanto uma mulher enfatizava o “nós”. Essa experiência reforçou minha crença no poder do trabalho em equipe.  

Para mim, brilhar como líder significa permitir que minha equipe brilhe, capacitando-os a ter sucesso. Minha função é definir a visão, assegurar que o time a compreenda e entenda como sua contribuição é valiosa. Celebramos juntos os sucessos, fortalecendo o coletivo em vez do individual. 

Você falou sobre como a maternidade impactou sua carreira. Como ela mudou sua relação com o trabalho? 

Perspectiva. Posso ter um dia incrível no trabalho, como hoje, com notícias fantásticas, mas ao chegar em casa, meus filhos simplesmente não se importam com isso. Eles não me veem como a chefe, e isso traz uma humildade imensa. Mas também me faz perceber que o que acontece no trabalho é relativo e não define quem sou. Não me apresento dizendo que sou a CMO da Deezer. Claro, valorizo contribuir com meus talentos e ajudar minha equipe a prosperar, mas isso é apenas uma parte de mim. Ter filhos em casa me ensinou que, independentemente do que aconteça no trabalho, é apenas isso: trabalho. Daqui a 30 anos, será que as adversidades ou os sucessos profissionais de hoje terão relevância? 

Meus filhos se preocupam mais se eu posso ajudá-los com suas tarefas escolares ou apoiá-los em seus projetos. Equilibrar tudo isso é extremamente desafiador. Já tive momentos de tentar ser tudo para todos e acabei falhando miseravelmente. Mas aprendi a não ser tão dura comigo mesma. Afinal, somos todos humanos tentando navegar pela vida da melhor maneira possível. 

Como mãe solteira de três meninos, sinto a responsabilidade de ensiná-los que as mulheres, assim como os homens, são multifacetadas. Não somos definidas apenas pelo papel de mães ou pelas tarefas domésticas. É importante para mim que eles cresçam vendo as mulheres como iguais, capazes de desempenhar diversos papéis na sociedade. Essa é, de certa forma, minha obrigação moral. 

Falando um pouco sobre a Deezer. Recentemente, vocês mudaram a identidade de marca e logotipo, certo? Qual foi a estratégia por trás disso? 

Quando entrei na Deezer, uma auditoria revelou que, embora nossa marca tivesse bom reconhecimento, a conexão emocional com os clientes e o valor percebido estavam frágeis. Diante da concorrência, precisávamos nos destacar. Reunimos a equipe e mergulhamos na essência do que fazemos e no que os usuários esperam. Reposicionamos a marca para refletir esse propósito: ser um espaço de pertencimento musical.  

Testamos várias identidades visuais até encontrarmos a que melhor representava nosso novo direcionamento. A estratégia guiou a arte para garantir que realmente ressoasse com nossos usuários. Agora, com uma nova campanha, enfatizo a importância da consistência. Recentemente, recebemos os resultados pós-teste da campanha. Foram os melhores da história da Deezer. Isso mostra que estamos no caminho certo, tocando o que é relevante para nossos usuários. O rebranding não é apenas uma mudança visual; é uma estratégia cuidadosamente planejada e implementada para atender às necessidades de nossos clientes. 

Para finalizar, gostaria que você desse um conselho para a jovem Maria no início de sua carreira. 

Recebi um conselho péssimo quando era jovem. Um vice-presidente de marketing em Nova York me disse para não ser uma “squeaky wheel” (roda que range, em tradução livre) quando eu estava prestes a partir para o México. Ele quis dizer para ser uma boa menina, não fazer barulho, seguir ordens. Fui uma boa menina e segui isso estritamente, mas agora percebo que foi o pior conselho. Muitas vezes duvidamos do nosso instinto quando somos jovens, mas olhando para trás, percebo que meu instinto sempre estava certo. O conselho que eu daria a mim mesma é: seja uma roda que range. Confie no seu instinto e faça barulho quando necessário. 

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