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Maju Coutinho: “Na TV, a diversidade precisa avançar para os cargos de decisão”

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Maju Coutinho: “Na TV, a diversidade precisa avançar para os cargos de decisão”

Do movimento #SomosTodosMaju à consagração como apresentadora do Fantástico, a jornalista coleciona sucessos, desafios e o constante enfrentamento ao racismo


24 de janeiro de 2023 - 8h21

 

 

Maju Coutinho é jornalista e apresentadora do programa Fantástico, da Globo (Crédito: Globo/ João Cotta)

Milhões de brasileiros foram impactados pelo movimento #SomosTodosMaju, que tomou conta das redes sociais em 2015. A hashtag, que chegou ao topo dos assuntos mais comentados no Twitter, se deu em apoio à jornalista Maria Júlia Coutinho Pontes, a Maju, que informava a previsão do tempo no Jornal Nacional. Em resposta a um comentário agressivo de um internauta, ela usou apenas um meme que bombava na época: “Beijinho no ombro”. 

A expressão, que ganhou popularidade devido à música homônima interpretada pela cantora de funk Valeska Popozuda, é associada a alguém que não se deixa abater com problemas, situações de estresse ou pessoas invejosas. Se na época o termo já fazia sentido, agora, ressoa mais ainda: Maju é uma jornalista premiada que, aos 44 anos, está no auge da carreira e não para de distribuir “beijinhos no ombro”. 

Desde 2021, ela é apresentadora do programa Fantástico, da Globo, ao lado de Poliana Abritta. De lá para cá, entrevistou grandes ícones internacionais da luta contra o racismo, como Viola Davis e Angela Davis, conversou com Giovanna Ewbank e Bruno Gagliasso sobre o preconceito sofrido pelos filhos em Portugal e, mais recentemente, fez uma longa e descontraída entrevista com a nova primeira-dama, Janja, esposa do presidente Lula.  

Os feitos são fruto de uma longa trajetória profissional e da educação dos pais, professores da rede pública de ensino que atuavam também no movimento negro em São Paulo. Maju, que cresceu em Vila Matilde, zona leste da capital paulista, sempre teve contato com o noticiário em casa e acompanhava os pais em eventos e reuniões da comunidade.  

Da educação diversa ao jornalismo televisivo 

A jornalista conta que estudou em diferentes escolas, desde uma com método montessoriano ao Colégio Islâmico Brasileiro, onde professavam a fé muçulmana. Na época do vestibular, queria fazer pedagogia na Universidade de São Paulo (USP), mas, no meio do processo, foi convencida pela mãe de que deveria fazer um teste vocacional. O resultado não era certeiro, mas indicou o jornalismo, o que fez sentido para ela.  

“Eu fazia muitas brincadeiras de criança com microfone na mão e escrevia um jornalzinho, coisas bem ligadas à comunicação”, conta. Ela passou em duas faculdades: pedagogia, na USP, que frequentou por um ano, e jornalismo, na Cásper Líbero. Mas foi na última, onde se formou em 2002, que diz ter descoberto sua verdadeira paixão profissional.  

“Passei por todos os laboratórios de TV, peguei o microfone e descobri o que queria para minha carreira. E aí o caminho foi sendo trilhado aos poucos”, diz. Maju estagiou na TV Gazeta, que tem parceria com a Cásper, e na Fundação Padre Anchieta, na TV Cultura. Começou como produtora, pauteira, e logo se tornou repórter de televisão.  

Em seguida, em 2007, a jornalista foi para Globo como repórter. A partir de 2013, passou a apresentar o quadro de meteorologia no Jornal Hoje e no Jornal Nacional, nesse último como a primeira mulher negra a integrar a equipe jornalística fixa do noticiário mais nobre da emissora. Era o início de uma parceria com William Bonner, que já atribuiu a ela uma grande participação na evolução do jornalismo da emissora para algo mais leve, natural e dinâmico.  

Com um estilo único e simples de se comunicar, Maju começou a apresentar o Jornal Hoje e a participar de outros programas e mídias da casa, como Saia Justa, do GNT, Rádio CBN, podcasts, entre vários outros. Depois, foi promovida a apresentadora do Fantástico, onde hoje brilha como jornalista do alto escalão da emissora.

Racismo e diversidade 

Por ter feito a cobertura de muitas pautas relacionadas a racismo na Globo, e, principalmente, por já ter passado pelo preconceito na pele, Maju tem propriedade para falar sobre as mudanças que acompanhou do início da sua carreira para cá. 

“As coisas mudaram muito. Se olharmos para a tela da TV hoje, vemos mais diversidade. É nítida essa diferença, o que é importante, mas tenho pleiteado que isso avance também para cargos de decisão, na tela e atrás dela”, comenta a jornalista, que considera importante o que passou em 2015 para essa evolução. 

Maju: “Tenho pleiteado que a diversidade avance também para cargos de decisão, na tela e atrás dela” (Crédito: Globo/ João Cotta)

“O que espero com o episódio é que o racismo deve ser denunciado e abraçado por todo mundo. É uma luta por todos, e não apenas pela comunidade negra. E, sempre que acontecer com alguém de projeção, que isso se reverbere para quem não tenha, para entender os caminhos a serem seguidos. Racismo mata”, conclui. 

Para Maju, o episódio também impactou seu jeito de se posicionar. “Não sou da hashtag e das postagens, mas tenho conseguido, na medida do possível, me posicionar por meio das pautas sobre os temas que gostaria de falar”. Em 2022, emplacou a reportagem sobre os 10 anos do sistema de cotas no Brasil, assunto que considera importante. “Não é uma luta individual, é coletiva. E, se hoje consigo me posicionar, é porque muita gente veio antes e abriu caminho. Não é simples quando você ainda não é maioria no espaço de decisão. Ainda estamos no processo de ocupar mais espaço.” 

Sucesso e desafios 

Ao refletir sobre sua carreira bem-sucedida, Maju coloca na conta muitos elementos, inclusive a sorte. “Há o mínimo de talento, que devemos ter. Mas há, também, muita resiliência, muito apoio da família e um processo terapêutico de 20 anos. Isso tudo me ajudou muito a enfrentar vários desafios que encontrei no caminho. E, acho que tem ainda a sorte, não dá para descartar o papel dela nessa trajetória. Existem muitas mulheres como eu, articuladas. Então acho que foi talento, esforço, sorte e preparo espiritual e emocional da mente.”  

Com todos esses componentes, a jornalista diz que mesmo assim encara o desafio constante de crer em si mesma. “Sou uma mulher negra numa sociedade muito racista, e o olhar para mim já parte da lente da desconfiança e incapacidade. Sou recebida por esse olhar, e, se acreditasse nele, não estaria nesta entrevista agora. Esse é o maior desafio, porque você precisa se esforçar para não acreditar nesse olhar e não adoecer por isso, pois é um problema do outro, e não seu. E não é sobre se achar o máximo, mas encontrar essa medida”, conta.

Maju por Maju 

A jornalista diz se considerar alguém que gosta de fazer listas e estar com a família, além de curtir controlar, agregar e estar junto. Ela também se acha impaciente e impulsiva, e se identifica como uma mulher negra e tudo o que isso carrega. 

“Tenho pensado muito que as mulheres, especificamente as negras, têm que equilibrar os pratos entre o que a sociedade quer, o que elas desejam, a vida profissional e a saúde. Há uma jornada tripla para a maioria, então acho muito importante esse cuidado físico e mental. Tento fazer isso com a minha vida. Precisamos ficar atentas e não nos acabar.” 

Maju parece fazer um exercício constante de reflexão sobre si mesma, e isso envolve o clichê de toda mulher com mais de 40 anos que não tem filhos: a maternidade. “Não estou fechada, mas essa pergunta sempre vem muito para a mulher, e nunca para o homem. Acredito que seja maravilhoso, mas estou ficando mais velha, e acho importante tornarmos mais leve qualquer decisão que uma mulher queira tomar, porque acaba sendo muito sobre nossos corpos. Se você não é mãe, é criticada, mas se tem 5 filhos, também é. É muita pressão sobre o corpo feminino. Além disso, maternar pode se dar por vários caminhos.” 

De próximos passos, Maju quer continuar nesse ritmo à frente do Fantástico. “Estou muito feliz no programa, que é muito relevante para os brasileiros. Quero continuar na condução de entrevistas interessantes porque é muito legal, enriquecedor, e contribui para o espectador e para mim mesma.” 

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