Qual o perigo do diversity washing para as marcas?
Empresas enfrentam risco real de backlash quando falta coerência entre discurso na propaganda e prática no dia a dia
Por Dimalice Nunes

(Crédito: Shutterstock)
O avanço das empresas e da publicidade na agenda de diversidade, equidade e inclusão fez com que essa pauta deixasse de ser apenas bandeira de marketing para se tornar exigência concreta de mercado. Os consumidores estão mais atentos, críticos e dispostos a optar por quem sustenta seus discursos na prática.
A incoerência entre o vivido e o comunicado tem alguns nomes: pinkwashing, rainbow washing e diversity washing, que são rótulos que expõem quando empresas usam causas sociais como adorno de marketing, sem, de fato, vivê-las no cotidiano.
“A empresa tem que estar empenhada na diversidade para conseguir falar com propriedade”, afirma Camilla Massari, chief impact officer e vice-presidente de atendimento e negócios na AlmapBBDO. Campanhas só ganham força quando refletem processos internos consistentes. “Quem abraça a diversidade internamente faz campanhas diversas com muito mais naturalidade e tem muitíssimo menos ruído com as ações que chegam às ruas. O papel da comunicação é ser um ‘filtro ético e estratégico’”, diz.

Não se trata de vender ideias ou produtos, e sim ter consistência, diz Debora, do Grupo Dreamers (Crédito: Divulgação)
Os números comprovam o raciocínio. Segundo o Edelman Trust Barometer 2024, 63% dos consumidores globais deixam de comprar de empresas incoerentes em seus posicionamentos sociais. No Brasil, pesquisa do Instituto Locomotiva aponta que 70% dos consumidores já boicotaram uma marca por discordar de seus valores ou práticas. “Não se trata apenas de reputação, mas de impacto direto nos negócios”, acrescenta Camila.
A percepção é compartilhada por Débora Moura, head de atração e D&I no Grupo Dreamers, já que campanhas e operação precisam caminhar juntas. “A diversidade precisa entrar nas campanhas publicitárias e isso somente é possível tendo mais diversidade na operação das empresas. Uma coisa alimenta a outra. É sobre construir uma nova cultura mesmo, para dentro e para fora”, afirma.
Não há fórmula para se chegar à autenticidade, mas, para Débora, o ponto de partida é a comunicação genuína e intencional. “Quando falamos de diversidade, não se trata de vender ideias ou produtos, e sim de ter consistência. Os grupos sub-representados estão atentos a qualquer deslize com a verdade, não dá mais para correr esse risco”, explica.

Camilla, da AlmapBBDO: A empresa tem que estar empenhada na diversidade para falar com propriedade” (Crédito: Divulgação)
O debate é intenso no mercado publicitário e reflete como grandes corporações traduzem compromissos em políticas concretas. Paula Sayão, diretora de marketing e comunicação do Banco do Brasil, destaca que diversidade no banco é um pilar estratégico de negócio.
“Sustentamos essa agenda com ações concretas”, afirma a executiva. Ela cita o Programa de Liderança Feminina, que elevou a presença de mulheres em cargos de liderança de 18,8% em 2018 para 29% em 2025. “Também alcançamos a meta de 30% de pessoas pretas, pardas, indígenas e outras etnias sub-representadas em cargos de liderança”, completa.
A comunicação institucional é consequência de um trabalho estruturado e o papel da comunicação é garantir que a narrativa seja condizente com a realidade da empresa, diz Paula. “A assertividade vem da integração entre áreas: marketing e ESG trabalham juntos para garantir que as campanhas reflitam os avanços internos.”
Exemplos de coerência entre discurso e prática estão em iniciativas recentes do mercado. Camila, da AlmapBBDO, cita a campanha de Pedigree, com o vira-lata Caramelo, que vai além da publicidade ao incentivar a adoção de cães sem raça definida, e a Biblioteca 2,5%, da Amazon, que dá visibilidade a autores negros.
Já O Boticário se consolidou como marca que aborda com naturalidade diferentes corpos, identidades e afetos em suas campanhas, ao mesmo tempo em que implementa políticas inclusivas como a licença parental igualitária.
O consenso é que não basta comunicar se não houver coerência, pois diversidade somente gera impacto real quando incorporada às estruturas da empresa. Como resume Camila, as melhores narrativas surgem quando os protagonistas são as pessoas impactadas pelas ações. “Mais do que falar sobre diversidade, é abrir espaço para que diferentes vozes falem por si”, atesta.