A estreia de Spike Lee em Cannes (o Lions)
Na véspera da entrega do prêmio de Creative Maker of the Year, Spike Lee fala sobre publicidade, craft e de seu novo documentário sobre Colin Kaepernick
Na véspera da entrega do prêmio de Creative Maker of the Year, Spike Lee fala sobre publicidade, craft e de seu novo documentário sobre Colin Kaepernick
Isabella Lessa
23 de junho de 2023 - 4h23
Atualizado às 07:07
Dono das inconfundíveis tomadas “double dolly”, que se tornaram uma das assinaturas de filmes como Do The Right Thing, Son of Sam e Malcom X, Spike Lee é um defensor do craft sem precisar dizê-lo.
Mas ele disse. Diante de uma plateia diminuta de jornalistas de várias partes do mundo na tarde de quinta-feira, 22, ele respondeu a perguntas sobre criatividade, arte, marcas e IA, oscilando um tom de voz quase inaudível para frases repentinamente altas, transições que remetem ao fluxo dos longas dirigidos por ele. O encontro foi organizado pela organização Black At Cannes.
Esta é a primeira vez do norte-americano no Cannes Lions, embora já esteja habituado à Riviera Francesa por ter participado de várias edições do Cannes Film. O motivo da vinda ao festival de criatividade publicitária é a homenagem que receberá na manhã (horário francês) desta sexta-feira, 23: o de Creative Maker of The Year, prêmio inédito na programação do evento.
Para o diretor, pensar no craft e na história de filmes publicitários segue o mesmo raciocínio dos filmes feitos para o cinema. “Comerciais de 30, 60 segundos, filmes curtos, documentários… ainda encaro tudo isso como o ato de contar história e construir narrativa. Não é diferente, para mim ainda é sobre contar uma história”, diz.
Logo depois da estreia de seu filme de estreia, She’s Gotta Have It, Lee adentrou o mundo dos filmes publicitários com a Nike, que na época estava transicionando sua comunicação – sobretudo em relação ao Air Jordan. Se o filme Air, da Amazon Prime Video, tivesse uma continuação, certamente Spike Lee apareceria. Afinal, as campanhas criadas por ele jogaram luz sobre a parceria entre Michael Jordan e Nike.
“Mesmo dois anos após o lançamento do meu filme, me apontavam na rua e diziam: ‘esse é o cara baixinho que fez aqueles comerciais com o Michael Jordan”, conta.
Muito embora a carreira cinematográfica de Lee tenha rapidamente se descolado da imagem do cara dos comerciais, a parceria com a marca de tênis perdurou: no ano passado, ele dirigiu “Seen It All”, filme comemorativo dos 50 anos da Nike e que, ao mesmo tempo, celebra atletas como LeBron, Cristiano Ronaldo, Kobe Bryant e Serena Williams.
https://www.youtube.com/watch?v=66bX6M9vS_s
Ainda que a incursão na publicidade seja marcante, quando questionado sobre o que a indústria pode fazer para tornar o mundo melhor e mais inclusivo, Lee retrucou: “a publicidade pode tornar o mundo melhor? O objetivo da publicidade sempre vai ser o de ganhar dinheiro, o tanto quanto for possível. É uma posição difícil porque, antes de tudo, é preciso vender coisas”.
Sobre o assunto do momento – inteligência artificial – o cineasta observa que Steven Spielberg falava sobre isso há muito tempo, mas que ele mesmo não quer lidar com a IA de hoje. “É como brincar de Deus, fazer máquinas que farão todo tipo de coisa sobre a qual não se tem nenhum controle. É complicado para as artes, porque como podemos determinar o que é original e o que não é? O que vai acontecer quando os estúdios começarem a fazer roteiros com IA?”, questiona.
A aversão à inteligência artificial vai ao encontro com outra visão de Lee sobre as histórias. Ele afirma que, sempre que vai a festivais de cinema, seu propósito é conhecer talentos novos, entrar em contato com filmes novos e absorver novas perspectivas. “Vejo gente de diversas partes do mundo e há esse problema da dominância de Hollywood, porque todo mundo deveria ter a oportunidade de contar sua própria história”.
Por falar em contar histórias, Lee está rodando um documentário sobre Colin Kaepernick, jogador do futebol americano que também foi a estrela de “Dream Crazy”, campanha multipremiada da Nike (mas que não envolveu o diretor). O filme estreará, segundo ele, ainda no segundo semestre deste ano, na ESPN.
Já no Palais des Festivals, centro de convenções em que é realizado o Festival de Cannes, Lee teve seu painel oficial como Creative Maker of the Year. Esse é o primeiro ano do prêmio que pretende homenagear criativos, de qualquer disciplina, que sejam referências para a comunidade.
O cineasta subiu ao palco acompanhado de Barry Alexander Brown, diretor e editor de cinema que foi parceiro de Lee em produções como Do the Right Thing, Malcolm X, He Got Game, 25th Hour, Inside Man e BlacKkKlansman e na publicidade.
Juntos, eles relembraram a história com a Nike. “Eu acho que nenhum de nós podia prever o impacto que esses comerciais teriam”, analisou Spike Lee, que foi endossado por Brown. “Nós fizemos comerciais que nós gostaríamos de ver”, afirmou.
Por fim, Spike Lee descartou qualquer possibilidade de se afastar do exercício criativo: “Eu não me vejo deixando de fazer isso”.
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