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Opinião

Éramos três

Por mais tentador que seja determinar o fim de uma era para o começo de outra, a evolução do mercado não segue uma lógica de substituição imediata


8 de maio de 2017 - 11h32

Em seu já clássico Sapiens, uma Breve História da Humanidade, Yuval Noah Harari lembra que em certo momento, aproximadamente cem mil anos atrás, até seis diferentes espécies de seres humanos habitavam simultaneamente a Terra. A coexistência, por dezenas de séculos, entre sapiens, neandertais e outras espécies não foi uma descoberta do autor, obviamente. Mas Harari prestou um trabalho importante ao recorrer à própria história do homem para ressaltar que a evolução não segue uma lógica de substituição imediata, do tipo “rei morto, rei posto”.

As transformações no ambiente de negócios no qual está inserida a indústria da comunicação, quando analisadas sob uma amplitude macro, também obedecem dinâmica similar, apesar do ritmo deveras acelerado — e de nossa tendência natural a querer determinar o fim de uma era para o começo de outra. Parece que ficamos à espera do dia em que veremos estampados em letras garrafais numa lápide: “agora, sim, mudou de fato: aqui jaz o antigo mercado”.

Na semana passada, diferentes relatórios divulgados ilustram o cenário atual para o setor de mídia, especialmente quando seus resultados são analisados como um todo. O estudo sobre as 30 maiores empresas de mídia do mundo, feito pela ZenithOptimedia, apontou que dois em cada dez dólares investidos na compra de espaços publicitários acabam nos caixas de Google ou Facebook. As duas empresas lideram o ranking, do qual o Google é o número 1 e cujo faturamento com mídia (US$ 79,4 bilhões) é três vezes maior do que o do Facebook (US$ 26,9 bilhões).

Quando se fala em tendência, os números apresentados pelo estudo Interaction 2017, do GrupoM, são reveladores. Entre 2012 e 2016, Google e Facebook responderam por mais de dois terços de todo o crescimento nos investimentos em publicidade feitos globalmente. Em 2017, 77% de todo o dinheiro novo que for investido em compra de mídia será direcionado para a internet (meio no qual de 80% a 90% das verbas vão para Google e Facebook).

Um terceiro estudo, da Forrester, com o sugestivo nome “O fim da publicidade como conhecemos”, faz o papel de advogado do diabo, ao estimar que as marcas cortarão aproximadamente US$ 2,9 bilhões da publicidade digital em 2018 — uma onda liderada pelo maior anunciante do mundo, a Procter & Gamble, em sua jornada contra as fraudes em audiência e a baixa eficiência já comprovada de formatos pobres em termos de conteúdo e atratividade. A expectativa da consultoria é que esse montante seja redirecionado para áreas tão díspares como a TV e os assistentes pessoais inteligentes (dos quais os maiores expoentes, hoje, são Siri, da Apple, Alexa, da Amazon, e Google Home).

Marcas cortarão aproximadamente US$ 2,9 bilhões da publicidade digital em 2018 — uma onda liderada pelo maior anunciante do mundo, a Procter & Gamble, em sua jornada contra as fraudes em audiência e a baixa eficiência já comprovada de formatos pobres em termos de conteúdo e atratividade

Dos veículos para as agências, a edição mais recente do Advertising Age trouxe reportagem especial sobre o avanço das consultorias sobre os orçamentos historicamente destinados à publicidade. Ao mesmo tempo que reforça o crescimento de companhias como Accenture, PwC, IBM e Deloitte (todas as quatro com seus braços de publicidade já figurando no ranking das dez maiores agências do mundo), uma grande rede como a Leo Burnett e agências versáteis como a Huge e a R/GA têm partido para o enfrentamento com as consultorias.

Uma definição emblemática do momento, cravada pelo vice-presidente de marketing estratégico da Coca- Cola para a América do Norte, Ivan Pollard, deixa a disputa completamente em aberto. “As grandes consultorias estão subestimando o valor da criatividade, enquanto as agências não conseguem explorar todo o potencial e valor do business analytics”, afirmou o executivo. “Alguém conseguirá decifrar esse código em breve, porque a combinação de dados e criatividade é o futuro.”

A reportagem de capa desta edição de Meio & Mensagem analisa os dilemas contemporâneos da terceira ponta dessa tríade que por muito tempo deteve a primazia dos rumos do mercado. O executivo- chefe de marketing também precisa dar respostas a uma série de questionamentos aos quais vem sendo submetido. Como o CMO permitiu que a situação chegasse até aqui e como pode sair dessa encruzilhada, você, caro leitor, confere na matéria assinada pelo editor-assistente Sérgio Damasceno e publicada nas páginas 22 e 23.

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