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Desigualdade marca acesso à cultura no Brasil

Pesquisa do Observatório Fundação Itaú comprova que renda, escolaridade e raça ainda determinam o consumo cultural

i 11 de novembro de 2025 - 14h54

Estudo mostra que o consumo cultural cresce no ambiente digital, enquanto barreiras econômicas e insegurança limitam o acesso presencial

Estudo mostra que o consumo cultural cresce no ambiente digital, enquanto barreiras econômicas e insegurança limitam o acesso presencial (Crédito: VectorMine/Shutterstock)

A 6ª edição da pesquisa Hábitos Culturais, realizada pelo Observatório Fundação Itaú com apoio técnico do Datafolha, aponta que a população brasileira realizou mais atividades culturais de forma remota do que presencialmente nos últimos 12 meses.

De acordo com o levantamento, 90% dos entrevistados realizaram atividades culturais virtuais no período, enquanto 84% participaram de atividades presenciais.

As práticas mais citadas foram: ouvir música online (85%), assistir a filmes em plataformas de streaming (74%), assistir a séries (70%), participar de eventos ao ar livre (61%) e ouvir podcasts (54%).

Barreiras financeiras e insegurança afastam o público das atividades presenciais

Apesar da alta adesão às atividades culturais, a pesquisa mostra que barreiras econômicas e de segurança continuam limitando a participação presencial.

Cerca de 30% dos brasileiros afirmam deixar de frequentar eventos culturais por motivos financeiros, enquanto 31% citam insegurança e violência como principais razões para evitar esses espaços.

Entre os que apontaram insegurança, 47% temem assaltos ou furtos, e 21% mencionam violência contra mulheres nos locais de eventos ou em seus arredores, onde a proporção que sobe para 28% entre as mulheres.

A preocupação com a violência aumenta em cidades de maior porte: 49% dos moradores de grandes centros apontam insegurança como fator impeditivo, contra 26% em municípios pequenos.

O impacto financeiro também é expressivo, mostrando que 34% dos entrevistados afirmam que o custo é o principal obstáculo para participar de atividades culturais.

Entre as mulheres, o índice sobe para 36%. O preço dos ingressos é citado como o gasto mais impeditivo (22%), seguido pelo transporte (19%).

As restrições financeiras crescem conforme o tamanho da cidade: 43% nas grandes, contra 29% nas pequenas.

Desigualdades de acesso por classe, escolaridade e raça

O levantamento revela que nível de escolaridade, classe social, porte do município e raça são determinantes para o acesso à cultura no Brasil.

Enquanto 96% dos brasileiros com ensino superior e 93% da classe A/B afirmam participar de atividades culturais presenciais, o índice cai para 70% entre os que têm ensino fundamental e 71% na classe D/E.

As diferenças se repetem no ambiente digital: 98% da classe A/B realizaram atividades culturais online, contra 79% na D/E.

Entre os menos escolarizados, o índice é de 75%, enquanto 99% dos que têm ensino superior consomem cultura virtualmente.

As disparidades também aparecem em modalidades específicas. No cinema, o consumo é de 91% na classe A/B, contra 48% na D/E.

No teatro, de 76% contra 32%; e em museus, 73% ante 34%. Entre pessoas com ensino superior, esses índices sobem para 92%, 80% e 80%, respectivamente, e caem para cerca de 32% entre quem tem apenas o fundamental.

Recortes raciais reforçam o quadro: entre brancos, o acesso a cinema, teatro e museus é de 80%, 64% e 64%, respectivamente; entre negros, cai para 69%, 51% e 48%.

Entre 2022 e 2025, a distância entre o acesso das classes A/B e D/E ao cinema se manteve em torno de 40 pontos percentuais. No teatro, a desigualdade cresceu, passando de 17 p.p. para 28 p.p. no mesmo período.

Espaços públicos e consumo local

As praças, ruas, parques e igrejas seguem como principais locais de acesso à cultura. 65% dos entrevistados citaram praças ou ruas, 60% mencionaram igrejas e 52% parques, um crescimento de 5 pontos percentuais em relação a 2024.

O acesso, porém, também é desigual: 70% dos indivíduos da classe A/B participam de atividades culturais em praças ou ruas, ante 54% na D/E. Em parques, a diferença é ainda maior (67% contra 37%).

A pesquisa indica um leve avanço na descentralização cultural, com aumento de 5 p.p. entre os que participaram de atividades presenciais em seus próprios bairros: 64% em 2025, ante 59% no ano anterior.

Ainda assim, mais da metade dos brasileiros das classes D/E e com ensino fundamental nunca participaram de eventos culturais locais.

Frequência e motivação

A frequência às atividades presenciais se manteve estável: 61% realizam pelo menos uma vez por mês e 28% semanalmente.

As principais motivações são relaxar e diminuir o estresse (44%), conhecer novos lugares (40%), adquirir conhecimento (34%), viver novas experiências (34%) e melhorar a saúde (32%), com o último motivo crescendo 7 p.p. em relação a 2024.

No ambiente online, o aumento da frequência é mais acentuado: o número de pessoas que praticam atividades culturais em casa pelo menos uma vez por semana subiu 25 p.p., chegando a 74% em 2025.

As principais razões para preferir o digital são comodidade (45%), segurança (34%), flexibilidade de horário (33%) e redução de custos (23%).

Plataformas e hábitos digitais

O consumo cultural online é impulsionado pelas plataformas de streaming: 87% dos entrevistados acessaram serviços sob demanda, um aumento de 19 p.p. desde 2023.

As mais utilizadas são Netflix (64%), YouTube Premium (33%), Globoplay (25%), Amazon Prime Video (23%) e Disney+ (16%).

O uso é mais alto entre os jovens (98%) e em regiões metropolitanas (91%), caindo para 84% no interior.

As programações mais assistidas são séries (57%), filmes estrangeiros (53%), documentários (36%), filmes nacionais (34%) e shows musicais (30%). Quase metade (48%) acredita que o streaming reduz as idas ao cinema.

Para vídeos curtos, o YouTube lidera (64%), seguido de Instagram (52%), TikTok (45%), Facebook Watch (22%) e Kwai (21%). O consumo no Kwai é mais frequente entre as classes D/E e os menos escolarizados.

Gastos com cultura

Entre os que realizam atividades presenciais, 60% afirmam ter gastos mensais com cultura, queda de 7 p.p. desde 2023.
A maioria (49%) gasta até R$ 100 por mês, com destaque para a faixa entre R$ 76 e R$ 100 (21%).

No ambiente digital, 78% declaram gastos culturais, proporção que cresce conforme aumentam escolaridade e renda.

Ao serem questionados sobre quanto pagariam por uma atividade hoje gratuita, 31% responderam “mais de R$ 50”. O valor médio subiu de R$ 84 em 2024 para R$ 97 em 2025.

Os eventos pelos quais mais pessoas estariam dispostas a pagar são teatro e stand-up (90%), aniversário da cidade (89%), shows de música (85%), exposições (83%) e festas juninas (82%).

Metodologia

Foram entrevistados 2.432 indivíduos, de 16 a 65 anos, em todo o país, entre 11 e 26 de agosto.

A margem de erro máxima é de 2 pontos percentuais, para mais ou para menos, considerando um nível de confiança de 95%.