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Petlove e Instituto Caramelo se unem contra Petz e Cobasi

Campanha questiona aprovação do Cade e indica possíveis efeitos da combinação entre as redes

i 31 de julho de 2025 - 6h01

Petlove e Instituto Caramelo

Instituto Caramelo afeta que pets seriam afetados pela fusão (Crédito: gulfarazgardezi-shutterstock)

No fim da última semana, Petlove anunciou sua aderência à campanha #NãoAoMonopólioPet, liderada pela ONG de cuidado animal Instituto Caramelo. A ação questiona a fusão entre Petz e Cobasi, aprovada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) no mês passado, que forma uma gigante do setor pet.

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Na campanha, criada inteiramente com inteligência artificial, cachorros e gatos são os narradores e alertam para possíveis impactos negativos da movimentação. “Vão falar que não vão aumentar, mas todo monopólio bota o preço que quer”, descreve o vídeo, que também afirma “o monopólio vai ser devastador para a vida de todos os pets”.

Além de Petlove, Andipet, Cão Sem Dono, Perfeitos e Especiais, Anjos dos Bichos, e Abrigo Saltimbancos também fazem parte do movimento. A fusão entre Petz e Cobasi começou a ser preparada em abril do ano passado e foi formalizada em novembro. Relembre.

A fusão e o recurso de Petlove

Somadas as operações, a nova companhia vai somar 494 lojas e uma receita bruta de R$ 6,9 bilhões, com uma participação de 11% do mercado. O grupo também estimava um ganho incremental anual de R$ 220 até R$ 330 milhões em sinergias. O processo seguiu para avaliação do Cade.

A resposta veio no início de junho, quando a Superintendência-Geral do Cade (SG/Cade) emitiu um parecer favorável à operação de fusão entre Cobasi e Petz, sem restrições. A análise considerou que nos mercados de serviços veterinários, estéticos de cuidados animais e no comércio varejista de plantas, flores e animais vivos a fusão não oferece qualquer risco à concorrência.

Já em relação ao comércio varejista de produtos para pets, a operação gera concentração relevante em algumas localidades. Porém, dada a facilidade de entrada, diversidade e grande número de concorrentes, a avaliação entende que a fusão não teria espaço para impor alterações negativas nas condições de mercado, como preço, oferta ou qualidade.

Petlove, por sua vez, recorreu ao Cade contra a aprovação da fusão entre as redes. Segundo o recurso, a união entre as varejistas resultaria em monopólio com impacto à concorrência. O recurso também questiona a definição de mercado relevante adotada pelo Cade, que considerou pet shops de pequeno porte e marketplaces como concorrentes diretos das superlojas.

O que afirmam Petlove e Instituto Caramelo?

“Uma vez eliminada a concorrência entre as duas empresas, elas ficarão livres para aumentar preços e poderão pressionar fornecedores em benefício dos seus próprios interesses e não em benefício dos consumidores, limitando o acesso e precarizando o cuidado com os animais de estimação”, aponta a CEO da Petlove, Talita Lacerda.

Segundo a executiva, a decisão não leva consideração precedentes como a diferenciação entre grandes redes e pequenos estabelecimentos. “A operação, tal como proposta, deve ser reprovada pelo Cade, a fim de evitar danos irreparáveis à concorrência e ao consumidor, prejudicando tutores e seus pets. Eventual aprovação da operação exigiria pacote robusto e extenso de remédios, estruturais e comportamentais, suficientes para criar um rival efetivo à empresa fusionada”, descreve.

O Instituto Caramelo, por sua vez, afirma estar acompanhando o processo desde o início. E, quando a fusão foi aprovada pelo Cade, a ONG teria percebido que os tutores não têm conhecimento sobre o impacto da medida no seu dia a dia e dos pets, o que motivou a campanha.

“O impacto mais preocupante é social: com o encarecimento dos cuidados com os animais, muitos tutores não conseguirão arcar com os custos e haverá um retrocesso alarmante nos avanços conquistados contra o abandono animal. Estaremos diante de uma nova era de abandonos em massa, com menos adoções e milhares de vidas em risco. É uma crise anunciada que precisamos evitar”, aponta Marília Lima, responsável técnica do Instituto Caramelo.

Petlove é uma empresa parceria do Instituto Caramelo e Marcio Waldman, fundador da companhia, integra o conselho consultivo da ONG. “Quando o caso da fusão entre Petz e Cobasi passou a preocupar o mercado e as instituições de proteção animal, dividimos essa pauta com nosso conselho e com parceiros estratégicos. A adesão da Petlove à campanha foi coerente”, aponta Lima.

O próximo marco da ação, para o Instituto, seria a participação em uma audiência pública no Congresso Nacional, marcada para o dia 12 de agosto, em que os envolvidos poderão se manifestar oficialmente. A entidade também afirma estar preparando novas etapas da comunicação.

O que dizem Cobasi e Petz?

Em comunicado, Cobasi e Petz se posicionaram sobre a campanha. No texto, as redes descrevem as informações passadas como incorretas e afirmam que a campanha distorce a análise realizada pelo Cade. O documento também reafirma o apoio das empresas à causa animal. Confira o posicionamento na íntegra:

“A respeito da campanha promovida pelo Instituto Caramelo, Cobasi e Petz entendem que as informações passadas são incorretas e distorcem a análise realizada de forma isenta e técnica pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE), que consultou o mercado amplamente e utilizou as melhores práticas para obter uma visão completa da situação, concluindo que a operação não prejudicará a concorrência no setor. As empresas lembram ainda que o market share combinado das duas companhias é de aproximadamente 10%.

O Instituto Caramelo é patrocinado pela Petlove, concorrente direta das companhias e parte interessada na reprovação da operação.  O fundador da Petlove, Márcio Waldman, é também conselheiro do Instituto Caramelo. Esta tentativa de interferência em um processo técnico desvirtua a intenção original do Instituto, de cuidado com os pets abandonados.

A Cobasi mantém desde 1998 o programa Cobasi Cuida. São mais de 200 mil animais amparados desde o início do projeto, mais de 8 milhões de refeições doadas e 190 ONGs apoiadas em todo o Brasil. Já a Petz desenvolve o Adote Petz, o maior programa privado de adoção de cães e gatos do país, responsável por 85 mil adoções desde sua criação em 2007 sendo 3.500 só neste ano. Só no ano passado, a Petz doou R$ 6,9 milhões em produtos e refeições, serviços veterinários e apoio em ações sociais para as 137 ONGS apoiadas pelo programa. Ambas as iniciativas demonstram que a atuação das empresas vai muito além dos animais tutelados, alcançando também aqueles que ainda esperam por um lar. As empresas reforçam o seu compromisso com o mercado, com os tutores e com os pets abandonados.”

Análise

Para Augusto Sales, doutor em administração pela Rennes School of Business e professor da FGV Ebape, o entendimento do Cade parte do princípio de que ainda que, juntas, Petz e Cobasi formem uma gigante, o mercado pet é fragmentado e tem baixa barreira de entrada o que não configuraria um impacto para o consumidor ou o mercado.

Em contrapartida, ele confirma que a nova operação teria uma vantagem competitiva do ponto de vista de cadeia de fornecimento, porque tem um poder de barganha maior ao negociar com os parceiros. Fator que pode ser ainda mais sensível em pequenos mercados.

“Esse ponto é interessante. Essa pressão sobre os fornecedores de conseguir ter uma grande escala e acabar oferecendo um preço mais barato, porque vai ter negociações melhores do que outros do mercado”, pondera Sales.

Nesse sentido, o analista não enxerga um cenário de aumento de preços. “Eu não consigo ver, por exemplo, um atacado desses vendendo a preços maiores porque, se não, não faz sentido”, aponta. Sales explica que o principal atrativo para o consumidor das grandes lojas é o preço, enquanto players menores oferecem vantagens, como conveniência e proximidade.

“Eu vejo o contrário. O risco, para mim, é que eu consigo imaginar eles tendo um poder de barganha maior com os fornecedores e conseguindo vender os produtos de forma mais barata”, aponta o professor da FGV Ebape.

Em um cenário em que a fusão siga sem restrições por parte do Cade, Sales aponta dois movimentos possíveis no mercado. De um lado, pequenos negócios devem investir cada vez mais em estratégias de diferenciação frente ao serviço oferecido pelas grandes redes. Um segundo efeito possível seria um movimento de consolidação, em que players médios podem também se unir para rivalizar com a gigante formada por Cobasi e Petz.