Da inteligência artificial à inteligência real
Construir o futuro que está emergindo não está somente nos dados, ou nas quase mil páginas do report de tendências da Amy Webb
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Quando a comunidade brasileira em peso estava invadindo o maior festival de inovação e criatividade do mundo, o SXSW, eu estava indo fazer um retiro imersivo para vivenciar a inovação na prática, tendo como base minha própria transformação. Aos pés da cordilheira dos Andes, no Chile, saí da minha bolha e fui me integrar a diferentes fontes de conhecimento em diferentes áreas temáticas, desde a inovação social de última geração até a sabedoria ancestral das tradições nativas.
Sem as palestras inspiracionais (e maravilhosas) de Brené Brown, Amy Webb, Rohit Bhargava entre outros, minha trilha de aprendizagem contou com vivências experienciais com líderes de diversas partes da América Latina, como Ubiraci, da tribo pataxó no extremo sul da Bahia, a líder indígena de Manaus Vanda Witoto, a Nan Amelia Tum, representante do povo maia, a “abuela” Alexandrina Ayala, representante do povo inca, Abuelo Joel Maripil indígena mapuche, do Chile, entre outros participantes incríveis que nos emocionaram com cerimônias profundas de auto reflexão e conexão, trazendo os ritos característicos de suas regiões em momentos-chaves de uma jornada rumo ao futuro emergente.
Mergulhei no curso de liderança ecossistêmica promovido por Otto Scharmer, professor sênior do Massachusetts Institute of Technology (MIT) e cofundador do Presencing Institute e da u-school for Transformation. Muito mais do que um framework, saí com profundas reflexões do meu papel como agente de transformação, sobre que tipo de transformação quero promover no mundo e angustiada por ver o quanto estamos deixando de lado as conexões reais, aquelas que ficam fora das telinhas. Questionamentos que, a meu ver, todo líder deveria fazer.
Como profissional de transformação digital, nunca senti tão latente nossa necessidade de resgatar nosso lado mais humano em meio a tanta tecnologia. Estamos todos autocentrados, ansiosos e depressivos, nos sentindo obsoletos por não conseguirmos absorver tanta tecnologia ao mesmo tempo, por não sermos os “AI driven experts”, por não sermos tão criativos como os influenciadores que ganham a vida nas redes sociais, por trabalharmos demais e não termos tempo livre… e nem sentimos que o chamado verdadeiro é para olharmos para dentro da gente, das nossas relações, da relação com o planeta e revalidarmos o que realmente faz sentido.
“A qualidade de sua vida está diretamente ligada à qualidade de seus relacionamentos”, foi uma das frases da Esther Perel, psicoterapeuta e uma das personas mais esperadas do SXSW, no painel que fez com Brené Brown no festival deste ano, enfatizando que quanto mais conectadas as pessoas estão, por conta da tecnologia, mais distantes de relações com significado elas parecem estar.
Entramos nas reuniões, mas quem tem nossa atenção são as mensagens do nosso smartphone, fazemos sprints de inovação querendo resultados diferentes usando os mesmos padrões de pensamento de sempre, queremos ter respostas para o futuro mesmo sabendo que até os maiores experts de futurismo do mundo dizem que não sabem o que virá. Sabemos de tudo isso, mas não mudamos nosso comportamento. Porque é tão difícil não ter respostas certas, olhar nos olhos, pausar e pensar antes de agir? Porque optamos em fazer três coisas simultâneas, ter respostas rápidas, sabendo que não estamos fazendo nada com profundidade? (Isso me leva a lembrar que o Brasil está entre os países mais improdutivos do mundo!)
Otto nos trouxe de volta a sanidade para entender que sem o alinhamento entre mente (pensar), coração (sentir) e mãos (agir) não existe inovação que funcione de verdade. Construir o futuro que está emergindo não está somente nos dados, ou nas quase mil páginas do report de tendências da Amy Webb. Está na nossa capacidade de intuir, de sentir, de deixar espaço para o novo emergir. Mas se estamos atolados de “coisas” o tempo todo, e cercados de pessoas que pensam iguais a nós, como podemos criar algo realmente novo?
Na era da IA generativa precisamos desenvolver nossa escuta generativa, ferramenta base para nossa evolução como serem humanos, para grandes inovações e provavelmente a habilidade de liderança mais subestimada. Saber ouvir é saber se conectar com o mundo à nossa volta. Mudar a maneira como ouvimos é dar espaço para ver a situação sobre os olhos dos outros, é sobre suspender nossos julgamentos e manter um espaço aberto, de PRESENÇA, para que algo novo nasça. Fácil de escrever e tão difícil de aplicar.
É fundamental entendermos a inteligência artificial para a sobrevivência de nossos negócios, da gente como profissional, mas tão fundamental quanto isso é entendermos a inteligência real humana para criarmos o futuro que desejamos e para sobrevivência da nossa espécie.
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