O presente e seus futuros possíveis

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Opinião

O presente e seus futuros possíveis

Mais do que oferecer serviços e produtos, estamos sendo desafiados a deixar claro o que nos move além do lucro e qual nosso papel como executivos e corporações.


7 de março de 2019 - 12h38

 

CEO da Apple, Tim Cook, se opôs a decisão do presidente Donald Trump de deixar o Acordo de Paris (Crédito: Justin Sullivan/GettyImages)

Colocar o que sabemos e fazemos a serviço de tomadas de decisão e atitudes comprometidas com a construção intencional de um futuro próspero para a humanidade é a nova fronteira na relação entre corporações e sociedade. Mais do que oferecer serviços e produtos, estamos sendo desafiados a deixar claro o que nos move além do lucro e qual nosso papel, como executivos e corporações, na construção do mundo onde acreditamos que merecemos viver tanto como pessoas de negócio quanto como indivíduos.

Em uma perspectiva revisada e ampliada da antiga visão de comportamento sustentável relacionada a políticas e iniciativas de apoio e compensação social e ambiental, estamos sendo desafiados a assumir posições, compromissos e atitudes diárias, em todos os níveis do negócio, que deixem claro nosso comprometimento, em toda a cadeia, com os diferentes momentos presentes e seus futuros possíveis.

Sim, momentos presentes e futuros possíveis, assim mesmo no plural, para contrariar a ideia de um presente e de um futuro únicos, uma visão conceitualmente limitada. Para quem achar que é apenas um jogo semântico, fica a dica: o Futures Studies é um importante campo de pesquisa científica envolvendo acadêmicos e pesquisadores em várias disciplinas. Nas palavras da World Futures Studies — ong global que reúne acadêmicos, professores, pesquisadores, profissionais de previsão, analistas políticos, ativistas e estudantes do mundo todo e atua como parceira consultiva da Unesco e da ONU — a pluralização de futuros é uma ampliação de conceito necessária para que sejam possíveis a visualização e a criação de futuros alternativos e preferenciais.

Em um mundo onde a volatilidade se tornou norma e a mudança se tornou um estado permanente, nosso desejo e esforço na construção de tendências e previsões a respeito do futuro deve ser urgentemente substituído pela ampliação de nossa capacidade de entender a complexidade do presente e promover a evolução intencional, um processo consciente de construção de uma nova realidade.

De certa forma, mesmo que ainda não tão amplamente quanto poderia ser, é o que fazemos quando abraçamos e incentivamos o crescimento da oferta de produtos com atributos sustentáveis e aceleramos o processo de adoção investindo na educação para o uso e o consumo consciente — nos Estados Unidos, a venda de produtos com atributos sustentáveis já atingiu 22% do total das vendas em lojas físicas, a previsão é de que esse percentual atinja 25% em 2021 (Nielsen, 2018). Também é o que fazemos quando nos posicionamos contra decisões governamentais que ignoram dados científicos sobre a sustentabilidade do planeta — em 2017, depois que o presidente americano Donald Trump anunciou a saída dos EUA do Acordo de Paris, CEO’s de grandes corporações se posicionaram afirmando que a crise climática era real e que fariam o que fosse preciso para combatê-la. No mesmo ano, mais de 60 das principais empresas que representam coletivamente praticamente todos os setores que apoiam a economia americana, anunciaram a Coalisão para o Sonho Americano que exige uma legislação que permita a imigrantes a residência permanente nos EUA.

Sobre o acordo de Paris, o CEO da Apple, Tim Cook, usou o Twitter para dizer que a decisão do presidente Trump era “errada para o nosso planeta” e escreveu uma carta aos seus funcionários assegurando que a Apple continuaria com seus esforços para proteger o meio ambiente. Jeff Immelt, CEO da General Electric, disse que as empresas não podem depender do governo quando se trata de mudanças climáticas.

A IBM divulgou uma declaração afirmando que continuaria reduzindo suas próprias emissões de gases do efeito estufa e continuaria a ajudar seus clientes a fazê-lo. HP, Intel, Google, Goldman Sachs, Shell, Amazon também divulgaram declarações enfatizando que continuariam honrando as decisões do acordo de Paris.

Por falar em Tim Cook, o CEO Apple e também um dos mais influentes líderes do mercado, advoga sobre temas como a reforma política da vigilância internacional e doméstica, segurança cibernética, tributação corporativa e preservação ambiental. Em 2014, Cook tornou-se o primeiro executivo-chefe de uma empresa da Fortune 500 a se identificar publicamente como gay. Uma pesquisa publicada na Universidade de Oxford caracterizou seu estilo de liderança como uma disposição ética em relação a seus stakeholders e com um foco intenso na criação de valor exponencial.

O futuro não é casual, o futuro é consequente, começa a existir no momento em que o imaginamos e toma forma tanto por meio das decisões que tomamos e iniciativas que empreendemos quanto por meio das narrativas que criamos e ajudamos a impulsionar. Em entrevista publicada há alguns dias no Singularity Hub, da Singularity University, Tom Lombardo, diretor executivo do Center for Future Consciousness e membro do conselho executivo da World Futures Studies Federation, afirma que “os humanos têm a capacidade única de evoluir de forma proposital porque possuem uma consciência futura. A consciência futura contém todos os aspectos cognitivos, motivacionais e emocionais da mente humana que pertencem ao futuro. É porque podemos imaginar e pensar sobre o futuro que podemos manipular e direcionar nossa evolução futura propositalmente. A consciência futura nos capacita a nos tornarmos autorresponsáveis em nosso próprio futuro evolutivo. Este é um salto no processo de evolução em si”

Colocar o que sabemos e fazemos a serviço de tomadas de decisão e atitudes comprometidas com a construção intencional de um futuro próspero para a humanidade pede um investimento tão grande em desaprender quanto em ganhar novas consciências e capacidades. É complexo, não é rápido, sangra e tem dor. Mas é necessário; e cada dia discutindo o quanto dá trabalho e sentindo saudades de um tempo onde parecia não ser necessário pensar tanto é, literalmente, um dia perdido.

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