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Os novos códigos do trabalho híbrido

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Opinião

Os novos códigos do trabalho híbrido

Passada a pandemia, empresas do nosso mercado estabelecem não só novas regras, mas também, novas etiquetas para o trabalho híbrido, que se tornou uma realidade


14 de novembro de 2022 - 6h00

Credito: Shutterstock

O setor publicitário é um dos que são impactados pelo trabalho híbrido dado o fato de que a atividade, pela sua natureza, prescinde, em tese, da presença física. Uma vez passada a pandemia (embora a Covid-19 com suas inúmeras variantes seja uma constante destes tempos), empresas do nosso mercado estabelecem não só novas regras, mas também, novas etiquetas para o trabalho híbrido, que se tornou uma realidade.

Interessante reportagem do Estadão trouxe uma entrevista com o CEO da We Work no Brasil, Felipe Rizzo, na qual ele coloca que o trabalho presencial não tem mais o mesmo propósito. “Hoje, o principal motivo para funcionários estarem dentro de um mesmo ambiente é o networking, com troca de experiências e conversas, para conexão entre pessoas. O modelo que focava apenas em produtividade já está defasado”.

Segundo ele, os trabalhadores de escritório entendem que o encontro presencial é mais focado, agora, no desenvolvimento de equipe. “Eu posso produzir de qualquer lugar. O remoto não é só estar longe do presencial, mas trabalhar de qualquer lugar, desde que com a infraestrutura necessária”, explica o executivo. Esse pensamento é corroborado por uma pesquisa que a companhia fez, em parceria com a Page Outsourcing, com foco em modelos de trabalho na América Latina, contemplando Brasil, Argentina, Chile, Colômbia, Costa Rica e México. O levantamento contou com 250 entrevistas qualitativas e oito mil quantitativas, feitas online.

De acordo com o levantamento, 82% dos profissionais se dizem mais felizes e saudáveis com o trabalho híbrido e 70% dos entrevistados mudaram de modalidade de trabalho por conta da pandemia, sendo que o híbrido, com presencial e home office, acabou se tornando o “mais popular”.

Ainda na América Latina, a pesquisa mostra que dois terços dos entrevistados têm exatamente a modalidade de trabalho que preferem e 33% pretendem mudar. Desse total, apenas 1% quer ir para um regime presencial, com intuito de separar melhor as vidas pessoal e profissional; 18% gostariam de alcançar um trabalho remoto e 14% afirmam desejar um esquema híbrido com maior flexibilidade.

É essa palavra “flexibilidade” que está no cerne de uma transformação em curso no mundo corporativo. A ideia de as pessoas terem a liberdade – por que não dizer o poder – de escolher os dias que trabalharão presencialmente abriu uma nova chave cognitiva na mentalidade de inúmeros trabalhadores que anteriormente não tinham opções ou repertório para impor suas próprias condições.

Rizzo, da We Work, na mesma reportagem citada, corrobora essa ideia: “O mote está na flexibilidade. Falou em híbrido, falou de flexibilidade. Se o híbrido é engessado, obrigando-o em determinados dias a ir ao escritório (não é tão bom). Agora dar ao funcionário a flexibilidade de decidir quando ir ao escritório é melhor. O benefício mais forte é aquele em que cada indivíduo pode achar o seu melhor equilíbrio entre pessoal e profissional”.

Quando olhamos apenas para o Brasil, no ato de procurar emprego, a modalidade – seja presencial, remoto ou híbrido – está quase em “pé de igualdade” com o salário pago para o trabalhador em termos de importância. Para 73% dos brasileiros ouvidos na pesquisa, esse quesito é o segundo ponto com maior relevância, atrás apenas do salário, 76%. Também no recorte nacional, 81% dos entrevistados consideram que o modelo de trabalho que contemple presencial e remoto é o mais atraente.

É nesse contexto que o trabalho presencial ganhou um novo significado e precisa ser repensado. “O que as pessoas não querem é estar presentes sem um propósito claro e necessário. Perder tempo de deslocamento (com trânsito ou transporte público) e entrar em uma reunião que poderia ser feita em casa não é interessante”, diz Rizzo. Em tempos no qual a saúde mental entrou na pauta dos gestores, o levantamento também apontou o que era latente: para 98% das pessoas da Geração X (entre 41 e 56 anos, no escopo da pesquisa), houve impacto positivo na saúde mental. Para os Millennials (entre 26 e 40 anos), o benefício mental também existiu, mas em uma menor parcela, 67%.

Um amigo, executivo em um alto cargo de direção numa empresa multinacional e que antes da pandemia passava uma semana por mês fora do Brasil, me contou, recentemente, que a coisa mais importante do trabalho híbrido foi a possibilidade te poder buscar a filha na escola duas vezes por semana. Algo do qual ele não quer abrir mão tão cedo.

Esse depoimento corrobora os dados do estudo da We Work. Essa diferença na percepção em relação à saúde mental se dá, provavelmente, por conta dos momentos diferentes que cada geração possui, pessoal e profissionalmente.
Afinal, a chance de alguém da Geração X ter filhos é maior. Para eles, a flexibilidade aparenta ser um grande ganho neste cenário. No final, todos percebem ganho na saúde mental, a questão é em que proporção. Para os Millennials, que podem estar com uma carreira em estruturação, por exemplo, galgando ainda cargos de liderança, pode ser que isso fique mais complexo. Sem contar, que a relação com o trabalho, mais do que uma questão geracional, essa reflexão passa muito também pelo nível hierárquico e o papel que o trabalho representa dentro da vida de cada um.

O que está em jogo é uma mudança cultural e uma profunda transformação do mundo corporativo como o conhecemos. Equipes atuando juntas no presencial não representam a única forma de impulsionar a inovação. Uma pesquisa da Gartner (https://gtnr.it/3A4U6FQ) mostra que o trabalho assíncrono é tão importante quanto o realizado coletivamente. O objetivo do trabalho híbrido é facilitar a flexibilidade, garantindo que todos tenham oportunidade de participar de forma igual. De acordo com a mesma pesquisa, 81% dos profissionais com deficiência revelaram ser mais propensos a se sentirem respeitados em um ambiente híbrido do que quando atuavam em um determinado local de trabalho. Este sim, um ganho importante do trabalho híbrido: a possibilidade de promover a diversidade, em especial a regional, com colaboradores trabalhando a partir de diferentes cidades, estados e até países.

Como toda transformação, essa requer novos combinados, aprendizados e, principalmente, abertura para a busca de soluções que permitam a criação de ambientes de trabalho mais saudáveis.

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