Opinião

Do controle à influência

O futuro do trabalho exige uma mudança de perspectiva para que tenhamos cada vez mais líderes e menos chefes

Gabriela Onofre

CEO do Publicis Groupe Brasil 8 de julho de 2025 - 6h00

“Ele nunca cresceu. Mas nunca parou de crescer.” A frase eternizada na lápide de Arthur C. Clarke, autor do conto que inspirou 2001: Uma Odisseia no Espaço, reflete o espírito inquieto que os profissionais precisam manter para seguirem relevantes. Hoje e no futuro. Essa é também uma das reflexões de Rishad Tobaccowala, uma das maiores referências globais em transformação do trabalho e consultor de dezenas de empresas em todo o mundo.

Tobaccowala, que esteve no Brasil recentemente para falar sobre seu livro Rethinking Work (Repensando o Trabalho), nos lembra da importância de reimaginarmos diariamente os nossos negócios, sem os silos nem as amarras que a segurança e o tempo nos impõem. E a preocupação pela busca de relevância em um mundo em constante transformação não aparece apenas entre as pessoas que ainda estão construindo suas carreiras. Pelo contrário, grandes lideranças estão sempre se questionando sobre o potencial de diferenciação que trazem para os seus negócios.

Em conversas com diversos CEOs pelo mundo, o consultor costuma propor uma reflexão sobre o que aprenderiam, ou arriscariam, se pudessem encontrar o seu “eu” mais jovem. É o olhar de “estrangeiro”, que traz todo o frescor de quem vê um problema de fora, a audácia dos desafiantes e a capacidade de se adiantar ao futuro que permite que se mantenham fundamentais para suas empresas.

Diante da ascensão da IA, que acelerou exponencialmente a capacidade de transformação do mercado, essas características se tornam ainda mais cruciais. Precisamos nos perguntar diariamente “e se?” e “por que não?”, nutrindo a curiosidade e a criatividade para que possamos progredir e indicar caminhos em nossas organizações.

“Somos uma indústria criativa. Por que não estamos sendo criativos sobre o futuro do trabalho?”, provoca Tobaccowala. Ele, inclusive, propõe repensar modelos de remuneração, que não deveriam ser sobre horas trabalhadas, mas, sim, sobre o valor real do que se cria. Especialmente no mundo pós-pandemia, em que a distinção entre trabalho e emprego se torna cada vez maior.

Na prática, isso significa que a lógica inverteu: se antes basicamente fazíamos nossas vidas caberem em nossos trabalhos, hoje, as pessoas procuram trabalhos que caibam nas suas vidas. E aqui, de novo, voltamos para uma virada de chave importante no papel das lideranças.

Cada vez mais o papel dos “chefes”, daqueles que atuavam na zona de controle imposta por hierarquias, se dissolve frente ao papel dos líderes, que formam ao seu redor uma zona de influência e inspiração, capaz de potencializar o talento humano dos demais profissionais da organização. Aos olhos desse novo profissional, a criação de contextos e de ambientes propícios à experimentação precisam se sobrepor à sisudez das regras hierárquicas.

Como líderes e organizações, o cerne do nosso sucesso está em atrair e reter os melhores talentos — e isso apenas é possível se enxergarmos profissionais como pessoas completas, que encontram no trabalho parte fundamental de sua identidade social. Mas não a única coisa que os define.