Pai é pai
Ao passo que atuamos para que mulheres avancem na busca por equidade em cargos de liderança, torna-se central, também, o equilíbrio em relação à parentalidade
Ao passo que atuamos para que mulheres avancem na busca por equidade em cargos de liderança, torna-se central, também, o equilíbrio em relação à parentalidade
11 de agosto de 2024 - 6h10
Como executiva, é muito comum que me procurem para falar sobre liderança feminina. Sendo mãe de três meninas, esse interesse cresce ainda mais no Dia da Mulher e no Dia das Mães. Como consigo conciliar? O que aprendi na vida corporativa que levo para casa e vice-versa? São muitas as perguntas que vêm me fazendo refletir sobre esses dois papéis tão essenciais em minha vida.
Vejo avanços relevantes. Na produção de conteúdo dos Estúdios Globo, já somos maioria (55%). Dentre os nove diretores que ocupam posição no segundo nível de liderança, somos quatro executivas. Dos meus 12 reports diretos, sete são mulheres. A liderança feminina está presente em 90% dos programas que fazem – ou farão – parte da grade de conteúdo da Globo. É evidente que nesse ambiente conversamos muito sobre todos os papéis que se acumulam em torno das mulheres. Intencionalidade não falta para ampliar essas vozes e partilharmos conquistas; somos muitas reverberando os desafios. Mas ainda falta.
Nesse sentido, recentemente, comecei a pensar e a notar que estava faltando um agente importante nessas discussões e trocas: os homens. E passei a me questionar e a prestar muita atenção nas rodas de conversa sobre maternidade e liderança feminina. Poucos pais se sentem à vontade para participar desses papos. Pois, na semana do Dia dos Pais, gostaria de provocar essa reflexão. Por quê?
Não quero falar sobre ausências e, muito menos, cobrar igualdade na divisão de papéis. Não hoje. Hoje, gostaria de falar sobre os pais presentes, que se importam, que comemoram cada conquista na paternidade. Hoje, quero falar sobre os pais que são parceiros incríveis e fundamentais para que tantas de nós possamos ser e ter tantas versões. Tenho certeza de que os desafios não são poucos para vocês. E, por isso mesmo, me pergunto: por que vocês não falam sobre isso? Por que muitas vezes vocês abrem mão de exercer e até protagonizar atos de cuidado com seus filhos que vocês tanto amam?
Cercada de tantas mulheres, é corriqueiro que mães me procurem com demandas relacionadas a seus filhos. Doenças, festas de escola, rituais do sono. São vários os pontos que merecem a atenção e a dedicação das mulheres, fazendo com que elas precisem conciliar a vida profissional com esse fluxo visto como orgânico. Isso é esperado delas. Esperado pela sociedade como um todo.
Em contrapartida, posso contar nos dedos de uma mão quantas vezes fui procurada por pais para fazermos ajustes na rotina de trabalho para que pudessem atender a alguma especificidade relacionada aos seus filhos. Seja levar o filho ao médico ou adaptar na creche. Já ouvi algumas pessoas justificarem essa diferença com frases como “alguém tem que trabalhar” ou “para quê duas pessoas cuidando de uma criança?”. E, nesse cenário, recai sobre a mulher o estereótipo da acolhedora, multitarefas, hábil em compreender o tático e equilibrar com as necessidades emocionais de cada um. O homem, não. Ele fica com o papel do bom profissional, daquele que não dá conta de várias coisas ao mesmo tempo. Será?
Ao questionar esse sistema “consagrado”, não o faço pela lente de que os homens são acomodados e as mulheres sobrecarregadas – ou talvez não somente com esse viés. Penso que é algo tão estabelecido no nosso cotidiano que muitas vezes nem entendemos as possibilidades, nem damos a chance ao outro de ser diferente.
Recentemente, uma de minhas filhas passou por uma cirurgia. Prontamente, organizei minha agenda para que conseguisse acompanhá-la em todo o processo pré, durante e pós. Nem passou pela minha cabeça que meu marido quisesse partilhar esse momento conosco ou que fosse importante para minha filha que ele estivesse junto. Era “coisa de mãe”, sabe? No decorrer da cirurgia, ele decidiu ir aguardar no hospital comigo. Quando minha filha chegou ao quarto e o viu, um momento único se criou. Percebi, então, que estava errada sobre ser algo que competia somente a mim. A verdade é que nem eu, nem ele e nem ela sabíamos que aquela presença era tão importante. Sorte a nossa ele ter sido guiado por pura intuição masculina e paterna. Ela também existe.
Ao passo que atuamos para que mulheres avancem na busca por equidade em cargos de liderança, torna-se central, também, o equilíbrio em relação à parentalidade. Tanto do ponto de vista da divisão de tarefas como da valorização do aporte emocional que os homens são capazes de dar – e do qual têm direito de usufruir. Todos saem perdendo quando isso não acontece, especialmente, nossos filhos.
Precisamos olhar para a masculinidade como capaz, desejosa e essencial na construção de laços afetivos. É assim que formaremos pessoas melhores e seremos melhores. Falo por mim. Quando isso acontece, me torno uma mãe e uma mulher mais forte e potente. Ter essa troca entre parceiros nas múltiplas jornadas que ambos desempenhamos na vida é rico, poderoso e transformador.
Hoje, é dia de celebrar tantos pais que são pais. Assim mesmo, sem necessidade de nenhum adjetivo adicional. Pai que é pai. Vocês são incríveis. Nossa vida seria – e para muitos é – muito difícil sem vocês. Tudo é muito melhor com vocês.
Compartilhe
Veja também
Como as mulheres estão moldando o mercado dos games
Lideranças femininas de diferentes players falam sobre suas trajetórias profissionais na indústria
Como Rita Lobo fez do Panelinha um negócio multiplataforma
Prestes a completar 25 anos à frente do projeto e com nova ação no TikTok, a chef, autora e empresária revela os desafios de levar comida de verdade dos livros de receitas para outros espaços