Opinião

Descansar é parte do plano

Uma escolha consciente por bem-estar e longevidade profissional pode começar com um gesto simples: pausar

Cynthya Rodrigues

Head Comercial Latam na GMD 6 de agosto de 2025 - 14h58

(Crédito: Shutterstock)

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Acabei de voltar de férias. Férias de verdade, daquelas em que a gente consegue se desconectar quase 100% do trabalho. Digo quase porque, vez ou outra, fui impactada por alguma mensagem profissional e não resisti em dar uma espiadinha (erro meu!). Mas, no geral, foram dias de pausa real, vividos com quem eu amo, em Maceió, minha terra. Estar presente, respirar o ar do mar e aproveitar esse tempo me fez lembrar o quanto descansar é essencial e o quanto isso também precisa ser parte do nosso plano de carreira.

Os momentos de pausa são fundamentais para o bem-estar físico e mental e têm impactos diretos na produtividade, criatividade e resiliência ao longo da carreira. Lembro bem de algumas vezes que tentei tirar férias “de verdade”. Foi angustiante perceber que eu não conseguia me desconectar. Aquelas tentativas frustradas me ensinaram algo essencial: descanso também precisa ser planejado com o mesmo cuidado que qualquer entrega estratégica.

Nosso medo de desligar ganhou até nome: Fear Of Switching Off (FOSO). Essa inquietação de perder algo importante durante a ausência do trabalho é tão comum entre lideranças no mundo todo que virou sigla em inglês.

Uma pesquisa recente da Priority Pass jogou luz sobre o problema revelando que 61% dos brasileiros se sentem mais estressados e ansiosos quando tentam se desconectar do trabalho, por isso, não conseguem descansar. Metade leva o notebook nas férias, e 41% chegam a participar de reuniões online durante esse período.

Parece natural que seja assim. Afinal, em um mercado que recompensa o ritmo acelerado e valoriza quem “dá conta de tudo”, parar parece um luxo. Ainda mais quando a tecnologia e a conectividade colocam a vida profissional ao alcance das mãos, 24 horas por dia, sete dias por semana. O novo normal do trabalho híbrido não para, certo?

Acontece que não precisa e não deveria ser assim. Férias não são um prêmio por excesso de esforço, mas parte do ciclo saudável de qualquer carreira sustentável. Parar é o que permite seguir com mais clareza, foco e equilíbrio. Contribui para a saúde física e mental, mas também é fundamental para o sucesso profissional no longo prazo.

O ciclo silencioso do cansaço acumulado

Muitos profissionais seguem no modo automático sem perceber o desgaste físico e emocional. Consideram que não podem respirar, sob pena de perder espaço, ou por acreditar que são indispensáveis para a empresa, uma postura que caminha lado a lado com a dificuldade de delegar.

Mas reconhecer sinais de esgotamento e agir antes do colapso é um ato de responsabilidade consigo mesmo, e até mesmo com a própria empresa. Afinal, produtividade sem pausa cobra um preço: decisões apressadas, falta de criatividade e relações profissionais fragilizadas, entre outros.

Estudos recentes confirmam isso. Um deles, feito na Coreia do Sul e publicado na revista científica Occupational and Environmental Medicine e no site National Library of Medicine, mapeou o cérebro de trabalhadores com mais de 52 horas semanais. Resultado? Mudanças importantes em 17 regiões cerebrais ligadas à memória, atenção, planejamento e tomada de decisão.

Os riscos vão além do mental: problemas cardíacos, distúrbios do sono e transtornos como ansiedade e depressão estão entre os efeitos do excesso de trabalho. Em contrapartida, quem respeita seus limites e se permite descansar melhora sua performance e sua qualidade de vida como um todo.

Mais do que desligar, é importante se reconectar

Não abrir o notebook nem olhar e-mails profissionais no celular nas folgas já representa um avanço. Mas não é o suficiente. As férias precisam representar um momento de reinvenção, de reconexão com interesses, afetos e partes da identidade que muitas vezes ficam soterradas pela rotina. Retomar hobbies, ler por prazer, tocar um instrumento, estar presente com quem se ama. Pequenos gestos que alimentam nossa criatividade e nos reaproximam de nós mesmos.

Esse tempo fora do ambiente de trabalho pode ser transformador. Voltamos com mais energia, mais foco, e muitas vezes, com ideias novas para antigos desafios.

As empresas também têm um papel importante nesse processo. E o exemplo precisa vir de cima. Não basta falar sobre saúde mental ou ESG se os líderes não respeitam seus próprios períodos de folga. Líderes que descansam inspiram times mais saudáveis, conscientes e criativos.

Talvez sua próxima grande ideia não esteja na próxima reunião, mas no silêncio de uma praia, numa conversa leve com amigos ou no simples ato de fazer nada por um tempo.

Porque, sim, descansar é parte do plano.