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Opinião

Aprendendo com as diferenças

Para o japonês, grupo é mais importante do que indivíduo e o “meu” tempo não vale mais do que o “seu”


14 de outubro de 2020 - 13h15

(Crédito: Azmanl/ iStock)

Enquanto fui presidente de uma empresa japonesa no Brasil, visitei mais Tóquio do que Vinhedo, por exemplo. A cada viagem, as diferenças entre a sociedade japonesa e a nossa foram se cristalizando. Diferença nas ruas, nos costumes, jeito de consumir, de fazer negócios e trabalhar.

A primeira coisa que se percebe quando você põe o pé em solo japonês é que o automóvel pessoal é usado apenas quando realmente necessário.

Em Tóquio, o Uber não tem o mesmo sucesso que aqui. Simplesmente porque os táxis são ótimos, espaçosos, limpos, a porta abre automaticamente e os motoristas não discutem política, não comentam as leis de trânsito e usam luvas brancas!

Outra coisa que deixa qualquer ocidental espantado: simplesmente não há lixeira nas ruas. Se você produzir algum lixo, guarde no bolso até chegar em casa ou no hotel. Detalhe: mesmo sem lixeiras, as ruas são impecavelmente limpas.

Para o japonês, o grupo é sempre mais importante do que o indivíduo. É uma cultura na qual as pessoas chegam na hora marcada (como deveria ser) e as reuniões terminam na hora marcada (como deveria ser também). Para eles, o “meu” tempo não vale mais do que o “seu”. Por isso, atraso é falta de respeito.

Nos negócios, eles são duros, mas muito respeitosos. Há um respeito pelo cliente ou parceiro de negócios, não há essa coisa do ganhar tudo agora, hoje. Sempre pensam em longas relações comerciais (“Saudades disso, não é, minha filha?”).

Entre profissionais da mesma empresa, há muita hierarquia. Dificilmente discutem decisão de alguém superior. Em reuniões, jamais alguém pode ser interrompido durante a fala, eles consideram falta de educação grande —e, cá entre nós, é mesmo, né? Eles têm horror a dizer não. Isso explica o exagero na carga diária de trabalho que é de oito horas, mas com possibilidade de até muitas horas extras mensais. O governo andou combatendo isso e incentivando as horas livres para aumentar o consumo. Eles poupam demais, muito mais que brasileiros: 25% do PIB japonês vai para a poupança.

A mistura entre tradição e modernidade na sociedade japonesa está presente em tudo.

Por exemplo: apesar do Japão ser um país avançadíssimo em inovação, o consumidor não é um ser 100% tecnológico como a gente pensa. Lá ainda se consome muito CD. É o único país que ainda conta com a famosa rede Tower Records, com dezenas de lojas pelo país, seis delas em Tóquio.

No mundo do marketing e da comunicação, essa mistura é flagrante. A relação de amor com marcas tradicionais locais é a mesma com algumas marcas internacionais. A TV aberta é, sem dúvida, a grande mídia de massa, que lança os grandes fenômenos de audiência. Ao mesmo tempo, o digital está impregnado no dia a dia das pessoas e nele se reverberam os grandes acontecimentos.

A família, para eles, é algo quase sagrado e a reverência aos familiares mais velhos é semelhante à dos latinos. A diferença é que, lá, esse respeito aos mais velhos está não só nos lares, mas também nos escritórios espalhados pelos edifícios de Tóquio. Lá, cabelo branco é sinal de conhecimento e valorizado como em nenhum outro lugar do mundo.

Outra semelhança: as agências de propaganda. Lá, as agências são full-service, como aqui (criam, produzem, compram mídia e veiculam campanhas). Mas são muito mais full-service: as agências japonesas são verdadeiros conglomerados de comunicação. Criam e produzem também programas de TV e séries para as grandes emissoras, games, produtos e mais.

Mesmo enfrentando a pandemia e a preocupação em relação aos riscos com a Olimpíada 2021, Tóquio pulsa, agitada — como São Paulo. Mas de forma silenciosa, quieta e segura, absurdamente segura. Aliás, querer comparar Tóquio com qualquer capital brasileira no quesito segurança é covardia. Infelizmente.

*Crédito da foto no topo: Reprodução

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